COMENTÁRIOS AO PROJETO DE LEI 3.887/2020

22/07/2020

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PRIMEIRA PARTE DA REFORMA TRIBUTÁRIA A CRIAÇÃO DA CONTRIBUIÇÃO SOCIAL SOBRE OPERAÇÕES COM BENS E SERVIÇOS EM SUBSTITUIÇÃO DAS CONTRIBUIÇÕES DE PIS E DE COFINS

 

No dia 21/07/2020, o Ministro da Economia, Paulo Guedes, entregou em mãos ao Presidente do Senado e da Câmara de Deputados a Proposta de Reforma Tributária, a qual dispõe sobre a primeira parte das mudanças propostas pelo Governo. Como já era de se esperar, o Projeto de Lei traz modificações das mais nocivas contribuições do Sistema Tributário, o PIS e a COFINS.

O Projeto de Lei 3.887/2020 tramitará no Congresso concomitante aos andamentos das Emendas Constitucionais 45/2019 e 110/2019, as quais, abordam a Reforma Tributária.

Inicialmente, é natural, e era a expectativa dos operadores do ramo fiscal, que toda e qualquer mudança se iniciasse pelas referidas contribuições, até por que, em 2017, o Supremo Tribunal Federal decidiu, com repercussão geral, ser inconstitucional a cobrança do ICMS na base de cálculo destas exações. A previsão é de que a referida demanda custe cerca de R$ 27 bilhões a Fazenda Nacional. A discussão mencionada ainda aguarda julgamento de embargos de declaração quanto a possível modulação de efeitos, mas, sabe-se que diversos Tribunais Regionais Federais já vêm inadmitindo os recursos especiais e extraordinários, gerando o trânsito em julgado favorável aos contribuintes, o que possibilita a tomada dos créditos quanto aos valores recolhidos a maior.

Além deste debate, diversas outras discussões tiveram nascedouro deste julgamento, exemplificando: inconstitucionalidade do PIS e da COFINS sobre suas próprias bases, do ICMS na base de cálculo da CPRB, ICMS na base de cálculo do IRPJ/CSLL. Ou seja, como já visto em outro exemplo semelhante (ação do ICMS na base de cálculo do PIS/COFINS – Importação), o Fisco propõe modificação justamente quanto as cobranças de tais exações, o que, naturalmente, reduzirá o número de demandas judiciais futuras.

Fora os debates de bases de cálculo, travou-se por muitos anos a discussão acerca do conceito de insumo para o PIS e a COFINS. [1]Conclui-se, assim, que as contribuições, de fato, são polêmicas, controversas e nocivas, por isso entendemos que foi acertado o posicionamento do Governo em iniciar uma Reforma Tributária por elas.

A tributação sobre as receitas, sem nenhuma dúvida, é a mais severa para as pessoas jurídicas, majorando incrivelmente a carga tributária. De fato, o PIS e a COFINS são, atualmente, além de exações predatórias ao fluxo de caixa, complexas, inseridas em um emaranhado de debates e incertezas. [2]

Passamos a analisar e compreender as modificações propostas pela PEC, no tocante, especialmente, ao PIS e a COFINS.

A PEC traz, inicialmente, a unificação das contribuições, majorando a alíquota de 3,65% (cumulativa) e 9,25 (não cumulativa) para 12% para empresas no geral, e 5,8% para as Instituições Financeiras.

Abaixo, abordaremos ponto a ponto o Projeto de Lei e suas nuances.

No tocante a terminologia, na forma do Art. 1, a contribuição passará a ser descriminada como a Contribuição Social sobre Operações com Bens e Serviços. Sua materialidade (critério material – fato gerador) será sobre a receita bruta auferida, excluídas as receitas decorrentes de exportação, sendo assegurada a manutenção dos créditos a esta operação.

Quanto aos sujeitos passivos, responsáveis pelo recolhimento da CBS, o Projeto dispõe que sejam as pessoas jurídicas de direito privado e as equiparadas, bem como, disciplina que nos casos de plataformas digitais, estas sejam as responsáveis pelo recolhimento da exação. São consideradas plataformas digitais qualquer pessoa jurídica que atue como intermediária entre fornecedores e adquirentes nas operações de vendas de bens e serviços online, sendo excluídas as empresas de fornecimento à internet, processamento de pagamentos, publicidade ou procura de fornecedores.

Quanto ao critério quantitativo, a base de cálculo da contribuição será o valor da receita bruta auferida, sendo excluídos o ICMS, o ISS, os descontos incondicionais e a própria CBS. Neste artigo, o Governo, de forma expressa, extingue a chamada “cobrança por dentro” que deu ensejo aos famosos debates judiciais anteriormente mencionados. A alíquota será de 12%.

No tocante a não-cumulatividade, a Seção IV aborda a matéria e dispõe que as empresas poderão tomar os créditos destacados em documento fiscal, relativo a CBS, na aquisição de bens e serviços. Restou vedada a apropriação de créditos ligados às receitas não sujeitas a incidência, ou, com isenção. A apuração será mensal, pelo valor nominal (sem atualizações), e a cada trimestre, eventuais saldos excedentes poderão ser utilizados para compensar com débitos administrados pela Receita Federal do Brasil, vencidos ou vincendos (outra novidade interessante, o uso para débitos vencidos), bem como, por fim, poderão ser ressarcidos em espécie.

Quanto as isenções e imunidades, permanecem isentos as entidades beneficentes de assistência social, os templos de qualquer culto, os partidos políticos e suas fundações, os sindicatos, federações e confederações, e os condomínios edilícios residenciais, as receitas decorrentes da prestação de serviços de saúde do SUS, da venda de produtos da cesta básica, da prestação de serviços de transporte público, da venda de imóvel residencial novo ou usado por pessoa natural, de venda de materiais e serviços pela Itaipu Binacional, dos atos praticados entre cooperativas e seus associados.

Também gozam de isenção (adstrita de seção específica dentro do Projeto de Lei) os produtos in natura, constantes do capítulo 1 a 12 da Nomenclatura Comum do Mercosul (NCM), [3] bem como das posições 1401, 1801 e 1802. Consideram-se, pelo projeto de lei, produtos in natura aqueles que não sofram nenhum tipo de processo de industrialização, tampouco, sejam acondicionados em embalagens.

Quanto a Zona Franca de Manaus, também restou mantida a isenção, na forma da Seção VIII.

Foi mantida a incidência monofásica, às receitas decorrentes de operações com gasolina, óleo diesel, gás liquefeito de petróleo, gás natural, querosene de aviação, biodiesel, álcool inclusive para fins carburantes e cigarros. Neste caso, a alíquota a ser aplicada pelos produtores e importadores será    na forma do anexo II do Projeto. [4]

Quanto as instituições financeiras, sociedades de câmbio, de securitização de créditos e afins, a alíquota será de 5,85% sobre as receitas auferidas no mês-calendário.

No tocante a apuração, será mensal, com os devidos ajustes de tomada de créditos, vendas canceladas e devoluções, devendo o pagamento ser realizado até o dia 20 do mês subsequente.

A CBS também incidirá sobre as importações (também substituindo o PIS e a COFINS – Importação), tendo como base de cálculo o valor aduaneiro e também alíquota de 12% e o recolhimento deverá ser efetuado na data do registro do despacho de importação (DI), ou, na data de vencimento do prazo de permanência do bem no recinto alfandegário. No caso da importação de serviços, o pagamento da contribuição se dará na data do pagamento da contraprestação.

Foi mantida a suspensão vinculada à importação nos regimes aduaneiros especiais (drawback), na forma da seção V do Projeto de Lei, bem como, a não cumulatividade na CBS incidente sobre a importação.

Analisando as mudanças propostas por Paulo Guedes, entendemos que as mesmas findam alguns debates intermináveis quanto o PIS e a COFINS, no tocante a tributação “por dentro”, que ficou expressamente vedada no PL, bem como, ao uso irrestrito dos créditos, colocando uma pá de cal nas discussões acerca dos conceitos de insumos dedutíveis e, autorizando, inclusive, a tomada de créditos de operações com optantes do Simples Nacional.

Ainda, quanto ao saldo credor acumulado, a proposta que autoriza a compensação com tributos vencidos administrados pela Receita Federal é inovadora. Salientamos também a criação da isenção sobre a venda de imóveis residenciais.

No entanto, para aqueles setores que atualmente  apuram o PIS e a COFINS na forma cumulativa, ocorrerá a majoração da tributação, posto que, caso aprovadas as proposições, tais empresas pularão de uma alíquota de 3,65% para 12%.

Ainda não há previsão de quando será votada a propositura, que agora seguirá sua tramitação legislativa no Congresso Nacional. Importante salientar que, em caso de aprovação, as novas normas somente serão aplicáveis após a anterioridade nonagesimal (90 dias após a aprovação) cumulada com a anterioridade de exercício (no outro exercício fiscal).

Continuaremos atentos às movimentações quanto a Reforma Tributária e traremos aqui os contornos deste importante passo dado em nosso Ordenamento Jurídico.

 

 

_________

[1] A não cumulatividade atual do PIS e da COFINS se dá pela tomada dos créditos de insumos utilizados para o desenvolvimento da atividade empresarial. O cerne do problema é que a legislação instituiu um rol taxativo, o qual, não representa em nada a hipótese de incidência das contribuições. Desde a instituição das Leis 10.637/2002 e 10.833/2003 os contribuintes buscam, em esfera administrativa e judicial, ampliar este conceito. O Superior Tribunal de Justiça, julgou, na forma dos recursos repetitivos pelo tema 779 o seguinte verbete: “O conceito de insumo deve ser aferido à luz dos critérios de essencialidade ou relevância, ou seja, considerando-se a imprescindibilidade ou a importância de determinado item – bem ou serviço – para o desenvolvimento da atividade econômica desempenhada pelo contribuinte.” Assim, como podemos ver, o assunto permanece sem uma resposta expressa, visto que, o STJ tornou a análise extremamente subjetiva.

[2] A tributação sobre as receitas, certamente, é a forma mais predatória de tributação, uma vez que independe da existência real de riqueza a ser tributada. Vale lembrar, por exemplo, que o contribuinte deficitário, que vive período de despesas superiores às receitas, é considerado apto a contribuir com o Fisco pelo simples fato de auferir receita, ainda que esta receita já esteja comprometida com os salários de empregados e as despesas com fornecedores, o que torna o PIS/COFINS um tributo que, em muitos casos, dificulta muito a sobrevida dos empresários, agindo de forma letal nos empreendimentos do país[2]. [2]            BERGAMINI, Adolpho. et al. PIS e COFINS na teoria e na prática: Uma abordagem completa dos regimes cumulativo e não cumulativo. 2º Ed. Porto Alegre: MP Editora. 2010

[3] Sementes e frutos oleaginosos; grãos, sementes e frutos diversos; plantas industriais ou medicinais; palhas e forragens

Matérias vegetais das espécies principalmente utilizadas em cestaria ou espartaria (por exemplo, bambus, rotins, canas, juncos, vimes, ráfia, palha de cereais limpa, branqueada ou tingida, casca de tília).

Cacau inteiro ou partido, em bruto ou torrado.
Cascas, películas e outros desperdícios de cacau.

[4] Gasolina e suas correntes : 792, 50 por metro cúbico;

Óleo diesel e suas correntes: 351,50 por metro cúbico;

Gás liquefeito de petróleo: 167,00 por tonelada;

Gás natural: 167,50 por tonelada;

Querosene de avião: 71,20 por metro cúbico;

Biodiesel: 148,00 por metro cúbico;

Álcool: 241,81 poe metro cúbico;

Cigarros: 1,10 por vintena


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