REFLEXOS TRIBUTÁRIOS ADVINDOS DA LEI Nº 14.112/2020 (Nova Lei de Recuperação Judicial e Falências)

05/03/2021

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Com a entrada em vigor da Lei nº 14.112/2020[1] que atualiza a legislação referente à recuperação judicial (Lei nº 11.101/2005), à recuperação extrajudicial e à falência do empresário e da sociedade empresária, as dúvidas quanto aos reflexos tributários cresceram ainda mais.

 

Assim, visando dirimir controvérsias e sanar dúvidas, o Escritório Crippa Rey Advogados Associados, sempre atento às atualizações legislativas, traz esclarecimentos relevantes no que tange aos aspectos tributários da Lei nº 14.112/2020.

 

É sabido que a legislação que regula a recuperação judicial afasta a participação da Fazenda Pública do processo, isto é, do concurso de credores, gerando, com isso, preocupação diante da insegurança jurídica e, ainda, prejuízos às empresas e empresários recuperandos que, infelizmente, ficam ameaçados, diariamente, com atos constritivos (bloqueios/penhoras) em seu patrimônio.

 

A Constituição Federal dispõe quanto ao dever fundamental de pagar tributos, razão pela qual, o crédito tributário é compulsório, tendo em vista o interesse público sobre ele, ou seja, tem como finalidade a manutenção do Estado, não podendo o Fisco deixar de cobrá-lo e, por esta razão, possui garantias, privilégios e autonomia frente aos créditos de demais credores.

 

Por não estarem incluídos na recuperação judicial, aos créditos tributários também não se aplica a previsão contida no artigo 6º, inciso II, da Lei nº 14.112/2020, de suspensão das execuções e obrigações (determinações de penhoras, bloqueios, leilões, etc.). Entretanto, o §7º-B do referido dispositivo legal, prevê que a competência do juízo da recuperação judicial para determinar a substituição dos atos de constrição que recaiam sobre bens de capital essenciais à manutenção da atividade empresarial até o encerramento da recuperação judicial.

 

Além disso, a jurisprudência vem sendo formada, através do Tema 987[2] do STJ, no sentido de suspender as execuções fiscais para preservação da empresa e do empresário recuperando.

 

Apesar disso, a Nova Lei, em seu artigo 7º-A, §4º, inciso V, trouxe a possibilidade de suspensão das execuções fiscais até o encerramento da falência, porém, poderá haver o redirecionamento da execução aos corresponsáveis, o que vai totalmente de encontro aos artigos 128 a 135 do CTN c/c art. 50 CC/02 que preveem as hipóteses de redirecionamento do débito. Portanto, certamente haverá muitas discussões sobre o assunto, posto o conflito entre as normas e, havendo previsão específica na legislação tributária, esta sempre prevalecerá.

 

Com efeito, mister destacar os principais impactos tributário trazidos pela Lei nº 14.112/2020:

 

 

  • Exigência de Apresentação de Certidão Negativa de Débitos

 

Inicialmente, destaca-se que a Lei nº 11.101/2005 exigia a apresentação de Certidão Negativa de Débitos – CND para o deferimento do processamento da Recuperação Judicial. Entretanto, a jurisprudência tem flexibilizado tal exigência, em razão da dissonância existente entre o princípio basilar da recuperação judicial – preservação da empresa – e coação apresentada às empresas para realizarem parcelamentos com o Fisco, mesmo inexistindo condições econômicas-financeiras para o cumprimento do acordo.

 

Com a Lei nº 14.112/2020, a exigência se manteve, isto é, a apresentação de CND ou CPEN – Certidão Positiva com Efeitos de Negativa, para o processamento da recuperação judicial está mantida, o que causa preocupação às empresas e empresários, bem como para operadores do direito, visto que há clara insegurança jurídica, na medida em que não há certeza quanto a manutenção da jurisprudência em manter a flexibilização na exigência da apresentação de CND u CPEN.

 

 

  • Parcelamento de Débitos Administrativos

 

Quanto a possibilidade de parcelamento dos débitos tributários federais, o artigo nº 10-A da Nova Lei apresenta a possibilidade de realização de parcelamento em até 120 (cento e vinte) meses.

 

Poderão ser parcelados débitos de natureza tributária e não-tributária, constituídos ou não, inscritos ou não em dívida ativa, existentes até a data do protocolo da petição inicial da recuperação judicial.

 

Parcelamento de 120 meses

1ª à 12ª parcela

Pagamento de 0,5% sobre o valor da dívida consolidada no parcelamento;

13ª à 24ª parcela

Pagamento de 0,6% sobre o valor da dívida consolidada no parcelamento;

25ª até o final

Pagamento do saldo remanescente em até 96 (noventa e seis) prestações mensais e sucessivas

 

Ou

 

Parcelamento com utilização de Prejuízo Fiscal ou Créditos próprios relativos aos tributos administrados pela Secretaria Especial da Receita Federal do Brasil

Liquidação de até 30% da dívida consolidada no parcelamento[3]

com a utilização de créditos decorrentes do prejuízo fiscal e de base de cálculo negative da CSLL ou com outros créditos próprios relativos aos tributos administrados pela Secretaria Especial da Receita Federal do Brasil

Restante (70%) poderá ser parcelado em até 84 (oitenta e quatro) parcelas

1ª à 12ª parcela - pagamento de 0,5% sobre o valor da dívida consolidada no parcelamento

 

13ª à 24ª parcela - pagamento de 0,6% sobre o valor da dívida consolidada no parcelamento

 

 

25ª até o final – pagamento do saldo remanescente em até 60 (sessenta) prestações mensais e sucessivas

 

 

 

Apesar dessas modalidades de parcelamento, a sociedade empresária ou empresário em recuperação judicial, poderá optar por liquidar os referidos débitos com a Fazenda Nacional por meio de outra modalidade de parcelamento instituído por lei federal, como por exemplo, quando houver algum programa mais benéfico.

 

Ainda, vale salientar que o valor do crédito próprio relativos ao tributo administrado pela Secretaria Especial da Receita Federal do Brasil, decorrente de prejuízo fiscal e de base de cálculo negativa da CSLL, será determinado por meio da aplicação das seguintes alíquotas:

 

a) 25% (vinte e cinco por cento) sobre o montante do prejuízo fiscal;

 

b) 20% (vinte por cento) sobre a base de cálculo negativa da CSLL, no caso das pessoas jurídicas de seguros privados, das pessoas jurídicas de capitalização e das pessoas jurídicas referidas nos incisos I, II, III, IV, V, VI, VII e X do § 1º do art. 1º da Lei Complementar nº 105, de 10 de janeiro de 2001;

 

c) 17% (dezessete por cento) sobre a base de cálculo negativa da CSLL, no caso das pessoas jurídicas referidas no inciso IX do § 1º do art. 1º da Lei Complementar nº 105, de 10 de janeiro de 2001;

 

d) 9% (nove por cento) sobre a base de cálculo negativa da CSLL, no caso das demais pessoas jurídicas.

 

 

Os débitos que estiverem sob discussão administrativa ou judicial, poderão ser excluídos do parcelamento e, caso sejam incluídos, deverá ser comprovada a desistência expressamente e de forma irrevogável da impugnação ou do recurso interposto, ou da ação judicial e, cumulativamente, que renunciou às alegações de direito sobre as quais se fundam a ação judicial e o recurso administrativo.

 

Ainda, para a adesão e composição com a Fazenda Pública, deverá ser deve ser mantida a regularidade fiscal, ou seja, o tributo vincendo não poderá ser pago em atraso e, ainda, as obrigações com o FGTS também deverão se manter regulares.

 

Por fim, importante ficar atento na composição com a Fazenda Pública, visto que, havendo o descumprimento do parcelamento, poderá o Fisco requerer a decretação da falência da sociedade empresária ou empresário, nos termos do artigo 10-A, §4º-A, inciso IV, da Nova Lei.

 

 

  • Restituição em Dinheiro

 

A Lei nº 14.112/2020, acrescentou ao artigo 86 da Lei nº 11.101/2005 o inciso IV, prevendo que às Fazendas Públicas procederão à restituição em dinheiro, relativamente a tributos passíveis de retenção na fonte, de descontos de terceiros ou de sub-rogação e a valores recebidos pelos agentes arrecadadores e não recolhidos aos cofres públicos.

 

Diante disso, notório que, se antes do advento da Nova Lei a Fazenda Pública já detinha autonomia sobre às empresas e empresários e com as alterações acima apresentadas, percebe-se que hoje tal soberania está ainda maior, visto que, além de poder decretar a falência do empresário ou sociedade empresária em recuperação judicial, tem, em suas mãos a plena liberdade sobre os recuperandos.

 

Com efeito, repisa-se que, apesar de o Superior Tribunal de Justiça[4] no passado ter entendido que a Fazenda Pública não poderá requerer a decretação da falência, a nova previsão legal poderá alterar o entendimento jurisprudencial até hoje praticado nos Tribunais do País. Inclusive, acreditamos que este será o debate entre empresas/empresários e o Fisco, especialmente em razão de que a fazenda Pública detém inúmeras proteções do crédito tributário.

 

Ademais, imperioso ressaltar que o artigo 151 do Código Tributário Nacional (CTN) prevê que o parcelamento é hipótese de suspensão do crédito tributário e, assim, havendo o parcelamento do débito fiscal, deverão ser suspensas as execuções fiscais em curso contra a empresa ou empresário recuperando.

 

Em síntese, as inovações trazidas pela Lei nº 14.112/2020 no âmbito tributário estão relacionadas a:

 

1. Manutenção da exigência de apresentação de CND/CPEN, para o processamento da recuperação judicial;

 

2. Parcelamento de débitos tributários, nos termos estipulados na Nova Lei e, ainda, de acordo com a Lei nº. 13.988/2020 que dispõe sobre transação tributária com a União;

 

3. Possibilidade de a Fazenda Pública requerer a decretação de falência do empresário ou sociedade empresária em processo de recuperação judicial, em caso de contumácia;

 

 

O Escritório Crippa Rey Advogados está à disposição para orientá-los, bem como para sanar quaisquer dúvidas existentes envolvendo o tema em debate.

 

Por fim, destaca-se que para maiores informações acerca de aspectos importantes sobre as alterações trazidas pela Lei nº 14.112/2020, acesse também nosso informativo “AS PRINCIPAIS ALTERAÇÕES DA LEI 14.112/2020 NO ÂMBITO DA RECUPERAÇÃO JUDICIAL DE EMPRESAS” no endereço:  http://www.crippareyadvocgados.com.br/publicacao/as-principais-alteracoes-da-lei-14122+2020-no-ambito-da-recuperacao-judicial-de-empresas.

 

 

Porto Alegre, 05 de março de 2021.

 

 

Equipes Tributária e de Recuperação Judicial e Falências

 

Adriana Dusik Angelo

OAB/RS 88.210

 

Rubia Gress

OAB/RS 96.146

 

[1] http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2019-2022/2020/lei/L14112.htm#:~:text=LEI%20N%C2%BA%2014.112%2C%20DE%2024%20DE%20DEZEMBRO%20DE%202020&text=Altera%20as%20Leis%20nos,empres%C3%A1rio%20e%20da%20sociedade%20empres%C3%A1ria.

[2] Tema/Repetitivo 987 - Possibilidade da prática de atos constritivos, em face de empresa em recuperação judicial, em sede de execução fiscal de dívida tributária e não tributária.

Há determinação de suspensão nacional de todos os processos pendentes, individuais ou coletivos (Art. 1.037, II, CPC). (acórdão publicado no DJe de 27/02/2018).

[3] Lei nº 8.981/95 –

Art. 42. A partir de 1º de janeiro de 1995, para efeito de determinar o lucro real, o lucro líquido ajustado pelas adições e exclusões previstas ou autorizadas pela legislação do Imposto de Renda, poderá ser reduzido em, no máximo, trinta por cento.

Art. 58. Para efeito de determinação da base de cálculo da contribuição social sobre o lucro, o lucro líquido ajustado poderá ser reduzido por compensação da base de cálculo negativa, apurada em períodos-base anteriores em, no máximo, trinta por cento.

[4] REsp164.389/MG, REsp287.824/MG, REsp363.206/MG, REsp138.868/MG, REsp1.103.405/MG


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