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03/08/2020

JULGAMENTOS PELO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL PARA O SEGUNDO SEMESTRE DE 2020

O escritório Crippa Rey Advogados, sempre atentos às inovações legislativas e regulamentares, vem apresentar um breve artigo quanto ao debate dos temas tributários pautados para julgamento pelo Supremo Tribunal Federal no segundo semestre do corrente.

Em meio a situação de crise econômica e financeira que o Brasil vem enfrentando em razão da Pandemia Mundial motivada pela COVID-19 (novo coronavírus), as negociações quanto à reforma tributária[1] estão ganhando força entre o Governo Federal e o Congresso Nacional.

Diante das negociações envolvendo a reforma tributária, há diversos temas que serão julgados no segundo semestre pelo Supremo Tribunal Federal que terão repercussão direta na referida reforma.

Como é de conhecimento os Tribunais de todo o País estão realizando audiências e sessões de julgamento por meio de vídeo conferência e, da mesma forma ocorre com as Cortes Superiores que estão julgando processos com repercussão geral por meio de plenário virtual.

No primeiro semestre do ano, o Supremo Tribunal Federal julgou mais de 50 leading cases tributários, dentre eles a não incidência do IPI na revenda de produtos importados (RE 946648), a inconstitucionalidade do DIFAL – Diferencial de Alíquota – das empresas optantes pelo regime do Simples Nacional (RE 970821), a incidência de ISS – Imposto sobre Serviços de qualquer Natureza – sobre os contratos de franquia (RE 603136) entre outros casos de grande valor. E, um dos casos mais aguardados, que estava pautado para ser julgado em 1º de abril de 2020, qual seja, a exclusão do ICMS da base de cálculo do PIS e da COFINS, foi retido de pauta e, até o momento não há nova data designada para o plenário e julgamento.

Para o segundo semestre do ano, dentre os temas de repercussão geral que serão julgados, estão:

  • Tema nº 906 – Violação ao princípio da isonomia (art. 150, II, da Constituição Federal) ante a incidência de IPI no momento do desembaraço aduaneiro de produto industrializado, assim como na sua saída do estabelecimento importador para comercialização no mercado interno (Leading Case RE 946648);
  • Tema nº 72 – Inclusão do salário-maternidade na base de cálculo da Contribuição Previdenciária incidente sobre a remuneração (Leading Case RE 576967);
  • Tema nº 325 – Subsistência da contribuição destinada ao SEBRAE, após o advento da Emenda Constitucional nº 33/2001 (Leading Case RE 603624);
  • Tema nº 495 – Referibilidade e natureza jurídica da contribuição para o INCRA, em face da Emenda Constitucional nº 33/2001 (Leading Case RE 630898).

A proposta de revisão de tese do tema 108, o qual não tinha repercussão geral;

  • Tema nº 846 – Constitucionalidade da manutenção de contribuição social após atingida a finalidade que motivou a sua instituição – multa de 10% sobre o FGTS em casos de despedidas sem justa causa (Leading Case RE 878313);
  • Tema nº 874 – Constitucionalidade do parágrafo único do art. 73 da Lei 9.430/1996, com a redação dada pela Lei 12.844/2013, que prevê a possibilidade de o Fisco, aproveitando o ensejo da restituição ou do ressarcimento de tributos administrados pela Secretaria da Receita Federal do Brasil, proceder à compensação, de ofício, com débitos não parcelados ou parcelados sem garantia (Leading Case RE 917285);

Os julgamentos dos casos acima possuem repercussão direta nas negociações da reforma tributária e, além disso, impactarão valores imensuráveis aos cofres públicos, caso a União reste vencida pelas contribuintes.

Sendo o que tínhamos para esclarecer e informar no momento, permanecemos atentos às movimentações legislativas quanto a reforma tributária pelo Congresso Nacional, e traremos as informações que pertinentes que envolvem mudança de suma importância em nosso ordenamento jurídico.

Por fim, colocamo-nos, como de costume, à inteira disposição para maiores consultas acerca do tema, complementando informações, debatendo o assunto ou prestando outros esclarecimentos.

 

 

[1] Projeto de Lei 3.887/2020 tramitará no Congresso concomitante aos andamentos das Emendas Constitucionais 45/2019 e 110/2019


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31/07/2020

ASPECTOS GERAIS DO DIREITO FALIMENTAR BRASILEIRO E A CRIAÇÃO DE SUBCLASSES NO PLANO DE RECUPERAÇÃO JUDICIAL

A análise da evolução normativa no Brasil em matéria falimentar, mesmo que de forma sucinta, é necessária para entendermos os mecanismos e os objetivos centrais da atual legislação.

Assim sendo, a doutrina buscou estabelecer marcos na história do direito concursal, para melhor elucidar o pensamento do legislador frente às exigências do sistema falimentar.

Ricardo Negrão aduz que o direito falimentar brasileiro pode ser dividido em cinco fases: a primeira delas representa o período português[1], a segunda é a fase imperial, inaugurada pelo advento do Código Comercial em 1850[2], a terceiro fase é o período republicano, estabelecido pelo Decreto n. 917 em 1890[3], a quarta fase é intitulada por ele como pré-empresarial, que introduziu o Decreto-Lei n. 7.661/45[4], e a quinta fase iniciou-se com a tramitação do projeto de Lei nº 4.376/93, que perdurou por 12 (doze) anos, até ser aprovada nossa atual legislação sobre falência, recuperação judicial e extrajudicial (LREF)[5].

Edilson E. das Chagas[6] destaca que, em um primeiro momento, as normas se limitavam a punir o devedor, e, após esse período a liquidação da empresa passou a ser o enfoque do legislador, visando o pagamento dos credores, até chegarmos no entendimento atual, onde a empresa é vista como fonte produtora de renda e precisa ser preservada para poder cumprir sua função social, mantendo assim, a circulação de bens e serviços, a arrecadação de tributos para o Estado e estimulando a livre-concorrência.

O instituto da Recuperação Judicial está regulado nos Capítulos III e IV da LRF[7], e, com o respaldo do Poder Judiciário, este instrumento busca proporcionar os meios para o soerguimento de empresas que estejam enfrentando um momento de crise econômico-financeira.

No tocante às inovações trazidas pelo advento da Lei 11.101/2005, o princípio da preservação da empresa (artigo.47) foi a mais significativa.

Inegavelmente, a legislação atual trouxe inúmeros avanços, mas vale ressaltar que a lei acabou enfatizando a burocracia, diante da exigência exorbitante de documentação, como requisito mínimo para ajuizamento do pedido, o que, por vezes, acaba desencorajando o empresário a seguir adiante com a recuperação.

Em 2014, o legislador instituiu a LC n° 147 que modificou alguns pontos da lei, visando melhor atender as demandas dos micros e pequenos empresários. Por esta razão, foram instituídos, por exemplo, o Plano Especial, e inserida a Classe IV, a qual estão arrolados os créditos de titularidade de empresas que estejam enquadradas como ME e EPP.

Em que pese o excesso de formalidades, a LREF, ao criar diversos instrumentos como a divergência, a habilitação e a impugnação de crédito, e a objeção ao Plano de Recuperação, a LRF possibilitou um maior protagonismo ao credor no processo de Recuperação Judicial.

A divisão dos créditos em classes, (art. 41, I, II, III e IV, LREF) é aplicada tanto na Recuperação Judicial quanto na Falência, no entanto, com objetivos distintos.

No tocante à Recuperação Judicial observa-se que esta classificação é posta como forma de organização, servindo para reunir credores que tenham as mesmas predileções. Já em se tratando de processo falimentar, quanto à liquidação da empresa, a classificação dos créditos é empregada para seguir uma ordem de preferência no momento do pagamento.

Acerca das votações, Ricardo Negrão[8] destaca que as deliberações devem respeitar os princípios basilares da Recuperação Judicial, sendo elas a (i) universalidade, as quatro classes sujeitas ao plano deverão ser ouvidas, entretanto, a classe que não for atingida, não terá direito a voto; (ii) votação por cabeça, o que abrange as classes I e IV, nas quais será considerada a maioria simples dos credores, independentemente do valor de seus créditos; e (iii) a votação por dupla maioria, que alcança as classes II e III, onde considerar-se-á aprovado o plano se de acordo mais da metade do valor total dos créditos presentes e, cumulativamente, a maioria simples dos credores presentes.

Marlon Tomazette[9] destaca que a lei exige que a votação seja feita nesses critérios, para garantir que a aprovação do plano seja feita por maior parte dos credores e não apenas pelos credores que possuem créditos de maior monta.

Além destas hipóteses, se preenchidas as disposições elencadas nos §§ 1º e 2º do art. 58 da LRF, o juiz poderá conceder a recuperação judicial, ainda que o plano não tenha sido aprovado por todas as classes presentes em assembleia.

Neste aspecto, tivemos uma forte influência do regime norte americano em nosso atual sistema falimentar, mais precisamente na figura do cram down, o qual permite que o juiz homologue o plano de recuperação, mesmo sendo este rejeitado em assembleia geral de credores, desde que respeitados os critérios legais (art.58,§1º, LREF). Para ser possível a aplicação do cram down, um dos critérios do artigo 58, é que não haja tratamento diferenciado entre os credores que rejeitaram o plano de pagamento.

Destaca Scalzilli[10], que no sistema brasileiro, o cram down é utilizado para diminuir o quórum de aprovação pelo juiz, tendo em vista o princípio da preservação da empresa e sua função social, mas de maneira alguma, significa ignorar o arbítrio dos credores.

Haroldo M. Duclerc Verçosa[11], aduz que esta forma de aprovação não chega a ser o cram down existente no direito norte americano, pois, no Brasil, criou-se apenas um quórum alternativo para a aprovação do plano.

Não há de forma expressa na LREF, a autorização para a criação de novas classes ou subclasses no Plano de Recuperação Judicial, ocorre que na prática as empresas em recuperação adotam essas medidas, gerando algumas controvérsias.

A LREF compreende o princípio da paridade entre os credores na Falência (art.126), no entanto, os efeitos deste princípio ecoam na Recuperação Judicial, possibilitando o controle de legalidade do plano de recuperação.

Neste sentido, muitos credores sentindo-se prejudicados, buscam respaldo no judiciário, a fim de modificar o plano de recuperação, alegando que a criação de subclasse infringiria o Princípio da Igualdade entre Credores ou Par Conditio Creditorum (art. 58, § 2º LREF).

Ainda, diante da ampla discussão sobre a criação de subclasses no Plano de Recuperação Judicial e a omissão legislativa, a Jornada de Direito Comercial buscou sanar esta lacuna em seu Enunciado nº 57:

“O plano de recuperação judicial deve prever tratamento igualitário para os membros da mesma classe de credores que possuam interesses homogêneos, sejam estes delineados em função da natureza do crédito, da importância do crédito ou de outro critério de similitude justificado pelo proponente do plano e homologado pelo magistrado”

Cumpre destacar que tal problemática não se confunde com a figura do credor colaborativo ou credor estratégico, sendo um aliado no processo de soerguimento da empresa, art. 67, parágrafo único c/c art. 84, V, ambos da LREF.

Segundo Daniel Báril e Guilherme Queirolo Feijó[12], o tratamento distinto entre credores, tendo em vista suas preferências legais, não configura ilegalidade, mas sim a discriminação injustificada de credores que possuam a mesma prioridade de pagamento.

Luis Felipe Salomão e Paulo Penalva Santos[13] salientam que não há nenhuma ressalva quanto ao tratamento diferenciado aos credores de uma mesma classe, sendo o plano aprovado pelas três classes de credores.

A questão discutida é se a criação de subclasses no plano ocasiona tratamento diferenciado entre credores de uma mesma classe. Diante disso, a jurisprudência passou a permitir a criação de subclasses, pois entendeu ser possível haver tratamento diferenciado entre credores de uma mesma classe, desde que sejam demonstrados no plano de recuperação, critérios objetivos, e que não afete direito de credores isolados ou minoritários.

Em consequência disto, nota-se que se sedimentou o entendimento nos Tribunais, que a criação de subclasses na elaboração do Plano de Recuperação Judicial, não afeta o princípio da igualdade entre credores.

Nesta senda, o Superior Tribunal de Justiça consolidou ser possível a criação de subclasses:

“A criação de subclasses entre os credores da recuperação judicial é possível desde que seja estabelecido um critério objetivo, justificado no plano de recuperação judicial, abrangendo credores com interesses homogêneos, ficando vedada a estipulação de descontos que impliquem em verdadeira anulação de direitos de eventuais credores isolados ou minoritários”.

Desta maneira, é viável a criação de subclasses desde que observado o princípio da igualdade real, proporcionando tratamento igual para aqueles que se encontram em pé de igualdade, e de forma desigual aqueles que se encontram em condições desiguais.

Levando-se em conta o que fora exposto, quanto à evolução social e legislativa, em relação ao Direito Comercial, e considerando que estamos em constante transformação, é difícil a legislação acompanhar e responder a todas as demandas que surgem. Assim, é a jurisprudência que vem cumprindo este papel, preenchendo as lacunas da Lei 11.101/2005.

Ademais, o posicionamento jurisprudencial de flexibilização da norma, ao possibilitar a criação de subclasses, sem deixar de verificar com máximo rigor os limites legais, fornece aos envolvidos, os mecanismos necessários para concretizar os preceitos estabelecidos no plano.

Percebe-se que essa flexibilização se faz necessária, pois ao criar a norma o legislador não poderia prever os diversos percalços vividos no dia a dia pelas empresas e pelos próprios julgadores. É de suma importância que os magistrados mantenham esse olhar sensível às situações vivenciadas pelos empresários que se encontram em uma situação de crise econômico-financeira e que precisam se socorrer no judiciário para manter a empresa a fim de que esta possa exercer a sua função social.

 

[1] NEGRÃO, Ricardo. Curso de Direito Comercial e de Empresa – Recuperação de Empresas, Falência e Procedimentos. 13ª ed. São Paulo: Saraiva, 2019. p.38.

[2] NEGRÃO, Ricardo. Curso de Direito Comercial e de Empresa – Recuperação de Empresas, Falência e Procedimentos. 13ª ed. São Paulo: Saraiva, 2019. p. 41.

[3] NEGRÃO, Ricardo. Curso de Direito Comercial e de Empresa – Recuperação de Empresas, Falência e Procedimentos. 13ª ed. São Paulo: Saraiva, 2019. p. 43.

[4] NEGRÃO, Ricardo. Curso de Direito Comercial e de Empresa – Recuperação de Empresas, Falência e Procedimentos. 13ª ed. São Paulo: Saraiva, 2019. p.45.

[5] NEGRÃO, Ricardo. Curso de Direito Comercial e de Empresa – Recuperação de Empresas, Falência e Procedimentos. 13ª ed. São Paulo: Saraiva, 2019. p. 45.

[6] CHAGAS, Edilson Enedino das. Direito empresarial esquematizado®. São Paulo: Saraivajur, 2019, p. 755.

[7] LREF: Lei de Recuperação de Empresas e Falência.

[8] NEGRÃO, Ricardo. Manual de Direito Empresarial.10º ed. São Paulo: Saraivajur, 2020. p. 282.

[9] TOMAZETTE, Marlon. Curso de Direito Empresarial – 3. Falência e Recuperação de Empresas. 7ª ed. São Paulo: Saraiva Educação, 2019. p. 237.

[10] SCALZILLI, João Pedro; SPINELLI, Luis Felipe; TELLECHEA, Rodrigo. Recuperação de empresas e falência: teoria e prática na Lei 11.101/2005. São Paulo: Almedina, 2018, p. 134.

[11] VERÇOSA, Haroldo Malheiros Duclerc. Recuperar ou não recuperar, eis a questão: o poder/dever do juiz objetivando a preservação da empresa – configurações e limites. In: CEREZETTI, Sheila C. Neder; MAFIIOLETTI, Emanuelle Urbano (Org.). Dez Anos da Lei no 11.101/2005: estudos sobre a lei de recuperação e falência. 1a ed. São Paulo: Almedina, 2015, p. 359.

[12] BÁRIL, Daniel; FEIJÓ, Queirolo Guilherme. Cram Down: Considerações Críticas à Importação do Regime do Chapter 11 para o Regime Legal da Lei 11.101. Recuperação Judicial de Empresas: temas atuais. Porto Alegre. OAB/RS. 2018. p. 53.

[13] SALOMÃO, Luis Felipe; SANTOS, Paulo Penalva. Recuperação Judicial, Extrajudicial e Falência – Teoria e Prática. 4ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 2019. p. 173.


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29/07/2020

A PARTICIPAÇÃO DE EMPRESAS RECUPERANDAS EM LICITAÇÕES

O escritório Crippa Rey Advogados, sempre atentos às inovações legislativas e regulamentares, vem apresentar um breve artigo quanto ao debate envolvendo a participação de empresas em licitações.

Em meio a situação de crise econômica e financeira que a maioria das empresas do Brasil vêm enfrentando em razão da Pandemia Mundial motivada pela COVID-19 (novo coronavírus), muitas não estão tendo outra alternativa que o não ingresso no judiciário do pedido de sua recuperação judicial.

Com isso, empresas que estavam participando de licitações e/ou contratos públicos estão enfrentando outro problema com relação a serem impedidas na participação da licitação ou, ainda, estão sendo excluídas do certame por não possuírem certidão negativa de recuperação judicial.

O Superior Tribunal de Justiça tem se posicionado favoravelmente às empresas recuperandas quanto a participação e a manutenção do contrato licitatório, entendendo a Corte Superior que tal restrição por parte da administração pública não poderá ocorrer, posto que inexiste previsão legal para tal conduta.

Além de inexistir previsão legal para a exclusão de empresas em recuperação judicial em processos licitatórios, editais que contenham cláusulas prevendo tal hipótese, são considerados inválidos, posto que contrariam a Lei de Recuperação Judicial e Falência (Lei nº 11.101/2005) e o seu principal objetivo, qual seja, a viabilidade da superação da situação de crise econômico-financeira da empresa, como prevê o art. 47 da referida legislação.

Art. 47. A recuperação judicial tem por objetivo viabilizar a superação da situação de crise econômico-financeira do devedor, a fim de permitir a manutenção da fonte produtora, do emprego dos trabalhadores e dos interesses dos credores, promovendo, assim, a preservação da empresa, sua função social e o estímulo à atividade econômica.

A Lei de Licitações e Contratos Administrativos (Lei nº. 8.666/93 prevê as normas gerais sobre licitações e contratos administrativos pertinentes a obras, serviços, inclusive de publicidade, compras, alienações e locações no âmbito dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Município (art. 1º).

O artigo 31 da Lei nº. 8.666/93 estabelece os requisitos para a qualificação econômico-financeira de empresas participantes de processos licitatórios e, dentre eles, dispõe quando a apresentação:

Art. 31.  A documentação relativa à qualificação econômico-financeira limitar-se-á a:

I – balanço patrimonial e demonstrações contábeis do último exercício social, já exigíveis e apresentados na forma da lei, que comprovem a boa situação financeira da empresa, vedada a sua substituição por balancetes ou balanços provisórios, podendo ser atualizados por índices oficiais quando encerrado há mais de 3 (três) meses da data de apresentação da proposta;

II – certidão negativa de falência ou concordata expedida pelo distribuidor da sede da pessoa jurídica, ou de execução patrimonial, expedida no domicílio da pessoa física;

III – garantia, nas mesmas modalidades e critérios previstos no “caput” e § 1o do art. 56 desta Lei, limitada a 1% (um por cento) do valor estimado do objeto da contratação.

Percebe-se do referido artigo que com a edição da Lei de Recuperação Judicial e Falência, não houve modificação da redação do artigo 31 acima descrito, entretanto, a sua previsão mostra-se ultrapassada frente ao entendimento atual do judiciário e de doutrinadores.

Com relação as obrigatoriedades de apresentação de certidões negativas de recuperação judicial dentro do certame, também é uma situação que vem sendo discutida e, conforme supra mencionado, as Cortes Superiores têm se posicionado quanto a impossibilidade de inabilitar empresas recuperandas exclusivamente pela não apresentação desta certidão negativa.

A obrigatoriedade de apresentação de certidões negativas de recuperação judicial (o que causa a desabilitação das empresas caso restem vencedoras) e a previsão de não participação de empresas recuperandas em licitações não estão em consonância com o objetivo da recuperação e a manutenção empresarial.

Dentro das hipóteses de inabilitação de empresas por falta de apresentação de certidões ou, ainda, da exclusão dessas empresas em caso de propositura de ação recuperacional durante a vigência do contrato licitatório vai de encontro a Constituição Federal, especialmente princípios basilares como da legalidade e da isonomia.

O princípio da legalidade é afrontado em razão de que inexiste previsão legal para a para a exclusão de empresas em recuperação judicial em processos licitatórios e, da mesma forma, o princípio da isonomia é violado pelo fato de que as empresas recuperadas não devem ter tratamento diferenciado, mas deter tratamento isonômico para deixar em pé de igualdade para que não haja, além disso, princípios do direito administrativo, também previstos Constitucionalmente, como da livre concorrência e iniciativa.

Diante disso, entende-se que é necessária a relativização da exigência de apresentação de certidões negativas de recuperação judicial para habilitação em certames licitatórios, bem como a exclusão de empresas recuperandas de contrato em atividade, em razão exclusiva da sua condição de recuperanda. Para tanto, espera-se que os Projetos de Leis nº 10.220/2018 e nº 1.397/2020 que estão tramitando na Câmara dos Deputados, apresentem uma solução para esta problemática que, de forma indiscutível, trazem grande insegurança às empresas recuperandas.


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27/07/2020

A MEDIDA PROVISÓRIA Nº 992/2020 E A ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA DE BEM IMÓVEL COMPARTILHADA

Engajados em dirimir o maior número de dúvidas possíveis, bem como no sentido de auxiliar nossos clientes a atravessar o período conturbado causado pelo rápido alastramento do COVID-19 no Brasil, o escritório Crippa Rey Advogados vem prestar alguns esclarecimentos e informações acerca da Medida Provisória nº 992, de 16 de julho de 2020, que regulamentou a possibilidade da alienação fiduciária compartilhada.

A alienação fiduciária é uma forma de garantia que envolve os institutos jurídicos da posse e da propriedade. Pode-se dizer que ela é uma modalidade de financiamento, por meio da qual o bem a ser adquirido passa a ser propriedade do credor, que tem a sua propriedade resolúvel; já o devedor ficará com a posse da coisa, sendo o depositário e podendo usufrui-la.[1]

Nessa relação negocial, temos o fiduciante e o fiduciário. O fiduciante (devedor) é aquele que opta pela utilização desta modalidade de financiamento, transferindo ao fiduciário (credor) a propriedade de um bem, móvel ou imóvel, até o adimplemento total da dívida.

A constituição do negócio jurídico depende do objeto da alienação, ou seja, sendo este bem móvel, a formação se dá a partir da tradição; sendo este bem imóvel, conforme dito anteriormente, a posse ficará com o devedor e a tradição será ficta, por meio do constituto possessório.[2]

Após a quitação da dívida, o credor dará ao devedor um termo de quitação, que deverá ser levado ao Cartório de Registro de Imóveis e, consequentemente, ocorre a extinção dessa alienação e a retomada do imóvel ao, até então possuidor. Frisa-se que a alienação fiduciária produz efeitos apenas em relação as partes que compõe o negócio jurídico.

Relativamente a esse instituto jurídico, o Presidente Jair Bolsonaro editou a Medida Provisória nº 992, em 16/07/2020, dispondo, entre outros assuntos, sobre a possibilidade de compartilhamento da alienação fiduciária.

Conforme determina o artigo 14 da MP 992/2020, fica permitido ao fiduciante, com a anuência do credor fiduciário, utilizar o bem imóvel alienado, como garantia de novas operações de crédito. Quer-se dizer com isso que, um mesmo bem imóvel poderá ser compartilhado, garantindo novas operações de créditos, desde que tenha a anuência do credor fiduciário, bem como desde que contratadas com o credor fiduciário da operação original.

A alienação fiduciária compartilhada poderá ser utilizada por pessoa natural ou jurídica, no âmbito do Sistema Financeiro Nacional.  Quando se trata de fiduciante (devedor) pessoa natural, este somente poderá contratar operações de crédito com a alienação fiduciária compartilhada, em benefício próprio ou de sua entidade familiar, mediante a apresentação de declaração contratual destinada para esse fim.

Nesse sentido, é o teor do artigo 9º-A da Lei nº 13.476/2017 incluído pela Medida Provisória:

Art. 9º-A Fica permitido ao fiduciante, com a anuência do credor fiduciário, utilizar o bem imóvel alienado fiduciariamente como garantia de novas e autônomas operações de crédito de qualquer natureza, desde que contratadas com o credor fiduciário da operação de crédito original.

§ 1º O compartilhamento da alienação fiduciária de que trata o caput somente poderá ser contratado, por pessoa natural ou jurídica, no âmbito do Sistema Financeiro Nacional.

§ 2º O fiduciante pessoa natural somente poderá contratar as operações de crédito de que trata o caput em benefício próprio ou de sua entidade familiar, mediante a apresentação de declaração contratual destinada a esse fim.

A MP 992 determinou que o compartilhamento da alienação fiduciária deverá ser averbado no Cartório de Registro de Imóveis competente, devendo conter as seguintes informações: (i) valor principal da nova operação de crédito; (ii) taxa de juros e encargos incidentes; (iii) prazo e condições do empréstimo ou do crédito; (iv) declaração do fiduciante, quando se trata de pessoa natural; (v) prazo de carência; (vi) cláusula com previsão, dispondo sobre a livre utilização do bem enquanto o fiduciante estiver adimplente; (vii) cláusula sobre o vencimento antecipado das parcelas e; (viii) cláusula sobre o cumprimento dos requisitos e disposições do artigo 27, da Lei nº 9.514/97.

O parágrafo 2º deste artigo assevera que as operações de crédito poderão ser celebradas, quando há o compartilhamento da alienação fiduciária, mediante instrumento público ou particular, sendo necessária a manifestação de vontade de ambas as partes, podendo esta ser por meio eletrônico.

Vejamos abaixo o dispositivo:

Art. 9º-B O compartilhamento da alienação fiduciária de coisa imóvel deverá ser averbado no cartório de registro de imóveis competente.

§ 1º O instrumento de que trata o caput, que serve de título ao compartilhamento da alienação fiduciária, deverá conter:

I – valor principal da nova operação de crédito;

II – taxa de juros e encargos incidentes;

III – prazo e condições de reposição do empréstimo ou do crédito do credor fiduciário;

IV – declaração do fiduciante, de que trata o § 2º do art. 9-A, quando pessoa natural;

V – prazo de carência, após o qual será expedida a intimação para constituição em mora do fiduciante;

VI – cláusula com a previsão de que, enquanto o fiduciante estiver adimplente, este poderá utilizar livremente, por sua conta e risco, o imóvel objeto da alienação fiduciária;

VII – cláusula com a previsão de que o inadimplemento e a ausência de purgação da mora, de que trata o art. 26 da Lei nº 9.514, de 1997, em relação a quaisquer das operações de crédito, faculta ao credor fiduciário considerar vencidas antecipadamente as demais operações de crédito contratadas no âmbito do compartilhamento da alienação fiduciária, situação em que será exigível a totalidade da dívida para todos os efeitos legais; e

VIII – cláusula com a previsão de que as disposições e os requisitos de que trata o art. 27 da Lei nº 9.514, de 1997, deverão ser cumpridos.

§2º As operações de crédito, no âmbito do compartilhamento da alienação fiduciária, poderão ser celebradas por instrumento público ou particular, mediante a manifestação de vontade do fiduciante e do credor fiduciário, pelas formas admitidas na legislação em vigor, inclusive por meio eletrônico.

§ 3º As disposições do inciso II do caput do art. 221 da Lei nº 6.015, de 31 de dezembro de 1973, aplicam-se à dispensa do reconhecimento de firmas e às operações garantidas pelo compartilhamento da alienação fiduciária.

Salienta-se que, uma vez constituída alienação fiduciária compartilhada, a liquidação antecipada de quaisquer operações de créditos, não obriga o fiduciante a liquidar da mesma forma as demais operações de crédito ligadas a mesma garantia. Os prazos e as condições estabelecidas permanecem vigentes, conforme a nova redação do artigo 9-C da Lei nº 13.476/2017:

Art. 9º-C Constituído o compartilhamento da alienação fiduciária, a liquidação antecipada de quaisquer das operações de crédito, original ou derivada, não obriga o fiduciante a liquidar antecipadamente as demais operações de crédito vinculadas à mesma garantia, hipótese em que permanecerão vigentes as condições e os prazos nelas convencionados.

Parágrafo único. Na hipótese de liquidação de quaisquer das operações de crédito garantidas por meio de alienação fiduciária de imóvel, caberá:

I – ao credor expedir o termo de quitação relacionado exclusivamente à operação de crédito liquidada; e

II – ao oficial do registro de imóveis competente fazer a averbação na matrícula do imóvel.

Por fim, restou determinado pela MP 992 que, havendo inadimplemento e ausência de purgação da mora, relativamente a quaisquer operações de crédito, independentemente de seu valor, o credor poderá considerar vencidas antecipadamente todas as demais operações de crédito contratadas no âmbito da alienação fiduciária compartilhada.

O parágrafo primeiro deste artigo, afirma que após o vencimento antecipado de todas as operações de crédito, poderá o credor promover os procedimentos necessários para reaver o bem alienado.

Art. 9º-D Na hipótese de inadimplemento e ausência de purgação da mora, de que trata o art. 26 da Lei nº 9.514, de 1997, em relação a quaisquer das operações de crédito, independentemente de seu valor, o credor fiduciário poderá considerar vencidas antecipadamente todas as demais operações de crédito contratadas no âmbito do compartilhamento da alienação fiduciária, situação em que será exigível a totalidade da dívida para todos os efeitos legais.

§ 1º Na hipótese prevista no caput, após o vencimento antecipado de todas as operações de crédito, o credor fiduciário promoverá os demais procedimentos de consolidação da propriedade e de leilão de que tratam os art. 26 e art. 27 da Lei nº 9.514, de 1997.

O parágrafo 2º desse artigo, determina que a informação sobre o vencimento de todas as operações contratadas deverá constar na intimação requerida pelo credor fiduciário ao devedor fiduciante, a ser encaminhada pelo oficial de justiça do Registro de Imóveis.

[…]

§ 2º A informação sobre o exercício, pelo credor fiduciário, da faculdade de considerar vencidas todas as operações contratadas no âmbito do compartilhamento da alienação fiduciária, nos termos do disposto no caput, deverá constar da intimação de que trata o § 1º do art. 26 da Lei nº 9.514, de 1997.

[…]

  • Lei nº 9.514/97:

[…]

Art. 26. Vencida e não paga, no todo ou em parte, a dívida e constituído em mora o fiduciante, consolidar-se-á, nos termos deste artigo, a propriedade do imóvel em nome do fiduciário.

§ 1º Para os fins do disposto neste artigo, o fiduciante, ou seu representante legal ou procurador regularmente constituído, será intimado, a requerimento do fiduciário, pelo oficial do competente Registro de Imóveis, a satisfazer, no prazo de quinze dias, a prestação vencida e as que se vencerem até a data do pagamento, os juros convencionais, as penalidades e os demais encargos contratuais, os encargos legais, inclusive tributos, as contribuições condominiais imputáveis ao imóvel, além das despesas de cobrança e de intimação.

[…]

Já o parágrafo 3º, inclui no conceito de dívida, os saldos devedores de todas as operações de crédito garantidas pelo compartilhamento da alienação fiduciária.

§3º Serão incluídos no conceito de dívida de que trata o inciso I do § 3º do art. 27 da Lei nº 9.514, de 1997, os saldos devedores de todas as operações de crédito garantidas pelo compartilhamento da alienação fiduciária.

Quanto ao parágrafo §4º, este afirma que não se aplica a obrigação do credor de entregar ao devedor o saldo remanescente pela venda do imóvel no leilão, às operações garantidas pelo compartilhamento de alienação fiduciária. Nessa hipótese, o credor fiduciário poderá exigir o saldo remanescente, exceto quando uma ou mais operações tenham natureza de financiamento imobiliário habitacional contratado por pessoa natural. Vejamos:

§ 4º O disposto no §5º do art. 27 da Lei nº 9.514, de 1997, não se aplica às operações garantidas pelo compartilhamento da alienação fiduciária, hipótese em que o credor fiduciário poderá exigir o saldo remanescente, exceto quando uma ou mais operações tenham natureza de financiamento imobiliário habitacional contratado por pessoa natural.

Por fim, relativamente ao parágrafo §5º, menciona-se que o artigo 54 da Lei nº 13.097/2015, aplica-se as contratações do compartilhamento de alienação fiduciária, isto é, os negócios jurídicos que tenham como finalidade constituir, transferir ou modificar direitos reais sobre os imóveis são eficazes em relação a atos jurídicos precedentes nas hipóteses em que não há o registro de algumas informações, conforme abaixo:

[…]

§ 5º O disposto no art. 54 da Lei nº 13.097, de 2015, aplica-se às contratações decorrentes do compartilhamento de alienação fiduciária.

[…]

  • Lei nº 13.097/2015:

[…]

Art. 54. Os negócios jurídicos que tenham por fim constituir, transferir ou modificar direitos reais sobre imóveis são eficazes em relação a atos jurídicos precedentes, nas hipóteses em que não tenham sido registradas ou averbadas na matrícula do imóvel as seguintes informações: (Vigência)

I – registro de citação de ações reais ou pessoais reipersecutórias;

II – averbação, por solicitação do interessado, de constrição judicial, do ajuizamento de ação de execução ou de fase de cumprimento de sentença, procedendo-se nos termos previstos do art. 615-A da Lei nº 5.869, de 11 de janeiro de 1973 – Código de Processo Civil ;

III – averbação de restrição administrativa ou convencional ao gozo de direitos registrados, de indisponibilidade ou de outros ônus quando previstos em lei; e

IV – averbação, mediante decisão judicial, da existência de outro tipo de ação cujos resultados ou responsabilidade patrimonial possam reduzir seu proprietário à insolvência, nos termos do inciso II do art. 593 da Lei nº 5.869, de 11 de janeiro de 1973 – Código de Processo Civil .

Parágrafo único. Não poderão ser opostas situações jurídicas não constantes da matrícula no Registro de Imóveis, inclusive para fins de evicção, ao terceiro de boa-fé que adquirir ou receber em garantia direitos reais sobre o imóvel, ressalvados o disposto nos arts. 129 e 130 da Lei nº 11.101, de 9 de fevereiro de 2005, e as hipóteses de aquisição e extinção da propriedade que independam de registro de título de imóvel.

[…]

Significa dizer que, inexistindo qualquer averbação e registro na matrícula do imóvel objeto de garantia fiduciária, acerca das hipóteses acima indicadas, como averbações de execuções contra o devedor, constrição judicial, decisão judicial, entre outras, será considerada válida a contratação decorrente do compartilhamento de alienação fiduciária de imóvel.

Importante frisar que tais disposições têm o objetivo de reduzir os juros para o tomador do empréstimo, bem como facilitar o acesso das pessoas naturais ou jurídicas às linhas de créditos disponibilizadas pelas instituições financeiras, com o intuito de reduzir os impactos causados na economia do país ante a pandemia do novo Coronavírus.[3]

A Medida Provisória por ter força de lei já está valendo, todavia o texto desta ainda será analisado e deliberado pelo Congresso Nacional, ou seja, ainda podemos ter algumas modificações.

O Escritório Crippa Rey Advogados se coloca a inteira disposição para maiores consultas sobre o tema e informa que está atento as eventuais modificações que possam ser feitas no texto da Medida Provisória, com o objetivo de melhor orientar nossos clientes e parceiros acerca da matéria sobre a alienação compartilhada de bens imóveis.

 

__________

[1] TARTUCE. Flávio. Direito Civil: direito das coisas. v.4. 11.ed. Rio de janeiro: Forense, 2019. p.953.

[2] TARTUCE. Flávio. Direito Civil: direito das coisas. v.4. 11.ed. Rio de janeiro: Forense, 2019. p.960.

[3] Disponível em:https://www12.senado.leg.br/noticias/materias/2020/07/17/editada-mp-que-cria-linha-de-credito-para-empresas-com-receita-de-ate-r-300-mi


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25/07/2020

PIX: O Novo Sistema de Pagamentos Instantâneos do Banco Central do Brasil

O Escritório Crippa Rey Advogados SS vem, muito respeitosamente à presença de Vossas Senhorias, sempre atento às inovações legislativas e regulamentares, apresentar INFORMATIVO referente às especificações técnicas do novo ecossistema de pagamentos instantâneos brasileiro, que está sendo construído pelo Banco Central do Brasil (BC). Com base em estudos internos desenvolvidos a partir da interação com diversos agentes do mercado, no âmbito do Fórum de Pagamentos Instantâneos, o BC vem atuando no sentido de regulamentar diversas mudanças no mercado financeiro de pagamentos.

Primeiramente, cumpre ressaltar que o ecossistema de pagamentos instantâneos do Brasil é o ambiente formado pelo arranjo aberto, denominado PIX, que será instituído pelo Banco Central juntamente com prestadores de serviços de pagamento participantes do arranjo, e pelo sistema utilizado na liquidação de transações realizadas entre diferentes instituições participantes do arranjo. Esse sistema, denominado Sistema de Pagamentos Instantâneos (SPI), será construído, gerido e operado pelo Banco Central do Brasil (BC)[1].

Anunciado em 19 de fevereiro de 2020, o chamado PIX pode ser definido, em termos práticos, como uma nova ferramenta de pagamentos instantâneos que permitirá a realização de transferências monetárias eletrônicas, pagamentos e até mesmo recolhimento de impostos e taxas de serviços, na qual a transmissão da ordem de pagamento e a disponibilidade de fundos para o usuário recebedor ocorre de forma rápida, mais precisamente em segundos, sem que haja a necessidade de aguardar dias para que ocorra sua liquidação. A principal diferença, portanto, reside na velocidade e disponibilidade deste novo meio de pagamento.

Para melhor ilustrar a novidade, cabe discorrer brevemente acerca de como ocorrem os pagamentos no Brasil nos dias de hoje. Atualmente, transferências entre contas bancárias de diferentes instituições são realizadas através de TEDs e DOCs, enquanto pagamentos de contas são realizados através de boletos, transações físicas, por cartões ou dinheiro vivo. Todas as operações eletrônicas supramencionadas podem levar até mesmo dias para serem liquidadas, além de apresentarem taxas elevadas para a utilização do serviço. Já o dinheiro vivo apresenta um risco para ambas as partes envolvidas – pagador e recebedor.

Nesse contexto, o objetivo principal do Sistema de Pagamentos Instantâneos (SPI) do Banco Central, o PIX, é apresentar uma alternativa às antigas modalidades de pagamentos, permitindo que sejam realizados de forma instantânea (em tempo real), a qualquer dia e horário (não somente em dias úteis), sem intermediação de terceiros, a fim de possibilitar a redução de custos nas operações[2]. O meio de pagamento funcionará, portanto, em uma escala 24/7/365, isto é, 24 horas por dia, 7 dias da semana, em todos os dias do ano.

Segundo o Banco Central, essas transações poderão ser feitas i) entre pessoas (transações PSP, person to person); ii) entre pessoas e estabelecimentos comerciais, incluindo comércio eletrônico (transações P2B, person to business); iii) entre estabelecimentos, como pagamentos de fornecedores, por exemplo (transações B2B, business to business); iv) para transferências envolvendo entes governamentais, como pagamentos de taxas e impostos (transações P2G e B2G, person to government e business to government); e v) pagamentos de salários e benefícios sociais (transações G2P, government to person) e de convênios e serviços (transações G2B, government to business).

Além de aumentar a velocidade em que pagamentos ou transferências são feitos e recebidos, o PIX tem o potencial de alavancar a competitividade e a eficiência do mercado, baixar os custos, aumentar a segurança, aprimorar a experiência dos clientes, promover a inclusão financeira, bem como preencher uma série de lacunas existentes na cesta de instrumentos de pagamentos disponíveis atualmente à população no Brasil. Assim, alinhado à revolução tecnológica em curso, o Sistema de Pagamentos Instantâneos (SPI) possibilita a inovação e o surgimento de novos modelos de negócio, bem como a redução do custo social relacionada ao uso de instrumentos baseados em papel[3].

Em suma, o PIX será pautado nas seguintes características principais:

  1. Disponibilidade: as operações poderão ser realizadas a qualquer tempo, inclusive aos sábados, domingos e feriados;
  2. Velocidade: os recursos chegarão ao recebedor praticamente em tempo real (a operação deve levar cerca de 10 segundos para ser concluída);
  3. Conveniência: a experiência de uso deve ser intuitiva para o usuário, com a iniciação, conciliação e confirmação dos pagamentos centrados nas suas necessidades;
  4. Segurança: as transações serão cursadas na Rede do Sistema Financeiro Nacional, com a utilização de meios inovadores e seguros para autenticação digital, com base nas tecnologias de proteção atuais;
  5. Ambiente aberto: a estrutura será flexível e aberta à participação, a fim de garantir o acesso e o surgimento de atores que ofertem serviços inovadores e diferenciados, como bancos, fintechs e demais instituições afins, com foco em atender às necessidades dos usuários finais; o sistema admitirá duas formas de participação: a) provedor de conta transacional, onde a instituição financeira ou instituição de pagamento oferta conta transacional para o usuário final (conta de depósitos à vista, conta de depósitos de poupança ou conta de pagamento pré-paga); e b) provedor de serviço de iniciação de pagamento, onde é a instituição que exercerá a iniciação do pagamento a pedido de um cliente titular de conta transacional, não participando da liquidação financeira[4];
  6. Multiplicidade de casos de uso: o PIX permitirá transferências de qualquer tipo e valor entre pessoas e/ou empresas, pagamentos de bens e serviços em estabelecimentos comerciais, físicos ou virtuais, bem como recolhimentos envolvendo o governo.
  7. Fluxo de dados com informações agregadas: informações importantes para a conciliação poderão cursar junto com a ordem de pagamento, facilitando a automatização e o surgimento de novos modelos de negócios.

O Banco Central, de forma similar à atuação de bancos centrais de outras jurisdições, assumiu o papel de líder e de catalisador do processo de implantação do ecossistema de pagamentos instantâneos no Brasil. Embora a economia brasileira esteja sofrendo com os choques da crise do Covid-19 (Coronavírus), segundo declaração do Presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, o cronograma para a institucionalização do PIX não foi alterado, tendo inclusive sido adiantado para outubro de 2020. Segundo o cronograma, está prevista para 5 de outubro a primeira etapa de lançamento do PIX, data em que os clientes de bancos já poderão fazer registros de chaves que permitirão o recebimento de pagamentos pelo novo sistema, substituindo-se dados como número de banco, agência e conta. Essas informações serão armazenadas na plataforma tecnológica desenvolvida e operada pelo BC, denominada Diretório Identificador de Contas Transacionais (DICT)[5], que compõe o SPI.

Atualmente, cerca de 1.000 (mil) instituições solicitaram adesão junto ao BC para participação nas fases de teste do PIX, conforme consta na lista atualizada de 29 de junho de 2020[6]As regras específicas estarão detalhadas no Regulamento do PIX e do DICT, que serão publicados em agosto, conforme previsão do BC. De acordo com o cronograma divulgado, o sistema será lançado para toda a população em 16 de novembro.

Nos termos da Carta Circular n. 4.022, publicada pelo Banco Central em 9 de abril de 2020, a data máxima para que as instituições prestadoras de serviços de pagamentos com participação facultativa no PIX[7] solicitassem cadastramento no PIX e no SPI, para fins de participação na etapa formal de homologação no âmbito do processo de implantação, ficou estabelecida para 1º de junho de 2020. Segundo o art. 2º da Carta, encerrado o prazo mencionado, novas solicitações de cadastramento serão recebidas a qualquer momento, a partir de 1º de dezembro de 2020.

Para fins de consulta, informamos que, por ora, restou aprovada e regulamentada a Circular n. 4.027, de 12 de junho de 2020, que trata da instituição do Sistema de Pagamentos Instantâneos (SPI) e da Conta Pagamentos Instantâneos (Conta PI), pelo Banco Central do Brasil, a qual  está disponível para leitura no portal do Diário Oficial da União, e pode ser acessada clicando no link que segue: http://www.in.gov.br/en/web/dou/-/circular-n-4.027-de-12-de-junho-de-2020-261759318?fbclid=IwAR0mtKpt_c6XEfTnIi6i4uErVhVhoegnv32mhPZF3N3zYFOxHdweiolY3Aw.

Sendo o que tínhamos para esclarecer no momento, informamos que permanecemos no aguardo da Regulamentação específica do PIX e do DICT, e colocamo-nos, como de costume, à inteira disposição para maiores consultas acerca do tema, complementando informações, debatendo o assunto ou prestando outras explicações.

 

_____________

[1] Especificações técnicas e de negócio do ecossistema de pagamentos instantâneos brasileiro (Banco Central, 2020).

[2] Em outras palavras, o dinheiro sai da conta do usuário pagador para a conta do usuário recebedor de maneira direta, sem a necessidade de intermediários, o que propicia custos de transação menores. É como acontecem hoje transferências entre contas de um mesmo banco.

[3] Banco Central do Brasil: https://www.bcb.gov.br/estabilidadefinanceira/pagamentosinstantaneos

[4] Essa forma de participação está condicionada a regulamentação específica.

[5] Segundo o BC, o Diretório de Identificadores de Contas Transacionais (DICT) é o serviço do arranjo PIX que permite buscar detalhes de contas transacionais com chaves de endereçamento mais convenientes para quem faz um pagamento. Entre os tipos de chave atualmente disponíveis estão o CPF, CNPJ, telefone, e-mail e EVP.

[6] A Lista de Participantes em Processo de Adesão ao PIX pode ser conferida no seguinte link: https://www.bcb.gov.br/content/estabilidadefinanceira/pix/ListadeparticipantesemprocessodeadesaoaoPIX29.06.pdf

[7] Segundo as regras divulgadas, as instituições financeiras com mais de 500 mil contas transacionais ativas estão obrigadas a atuar como participantes diretos do PIX.


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22/07/2020

COMENTÁRIOS AO PROJETO DE LEI 3.887/2020

PRIMEIRA PARTE DA REFORMA TRIBUTÁRIA A CRIAÇÃO DA CONTRIBUIÇÃO SOCIAL SOBRE OPERAÇÕES COM BENS E SERVIÇOS EM SUBSTITUIÇÃO DAS CONTRIBUIÇÕES DE PIS E DE COFINS

 

No dia 21/07/2020, o Ministro da Economia, Paulo Guedes, entregou em mãos ao Presidente do Senado e da Câmara de Deputados a Proposta de Reforma Tributária, a qual dispõe sobre a primeira parte das mudanças propostas pelo Governo. Como já era de se esperar, o Projeto de Lei traz modificações das mais nocivas contribuições do Sistema Tributário, o PIS e a COFINS.

O Projeto de Lei 3.887/2020 tramitará no Congresso concomitante aos andamentos das Emendas Constitucionais 45/2019 e 110/2019, as quais, abordam a Reforma Tributária.

Inicialmente, é natural, e era a expectativa dos operadores do ramo fiscal, que toda e qualquer mudança se iniciasse pelas referidas contribuições, até por que, em 2017, o Supremo Tribunal Federal decidiu, com repercussão geral, ser inconstitucional a cobrança do ICMS na base de cálculo destas exações. A previsão é de que a referida demanda custe cerca de R$ 27 bilhões a Fazenda Nacional. A discussão mencionada ainda aguarda julgamento de embargos de declaração quanto a possível modulação de efeitos, mas, sabe-se que diversos Tribunais Regionais Federais já vêm inadmitindo os recursos especiais e extraordinários, gerando o trânsito em julgado favorável aos contribuintes, o que possibilita a tomada dos créditos quanto aos valores recolhidos a maior.

Além deste debate, diversas outras discussões tiveram nascedouro deste julgamento, exemplificando: inconstitucionalidade do PIS e da COFINS sobre suas próprias bases, do ICMS na base de cálculo da CPRB, ICMS na base de cálculo do IRPJ/CSLL. Ou seja, como já visto em outro exemplo semelhante (ação do ICMS na base de cálculo do PIS/COFINS – Importação), o Fisco propõe modificação justamente quanto as cobranças de tais exações, o que, naturalmente, reduzirá o número de demandas judiciais futuras.

Fora os debates de bases de cálculo, travou-se por muitos anos a discussão acerca do conceito de insumo para o PIS e a COFINS. [1]Conclui-se, assim, que as contribuições, de fato, são polêmicas, controversas e nocivas, por isso entendemos que foi acertado o posicionamento do Governo em iniciar uma Reforma Tributária por elas.

A tributação sobre as receitas, sem nenhuma dúvida, é a mais severa para as pessoas jurídicas, majorando incrivelmente a carga tributária. De fato, o PIS e a COFINS são, atualmente, além de exações predatórias ao fluxo de caixa, complexas, inseridas em um emaranhado de debates e incertezas. [2]

Passamos a analisar e compreender as modificações propostas pela PEC, no tocante, especialmente, ao PIS e a COFINS.

A PEC traz, inicialmente, a unificação das contribuições, majorando a alíquota de 3,65% (cumulativa) e 9,25 (não cumulativa) para 12% para empresas no geral, e 5,8% para as Instituições Financeiras.

Abaixo, abordaremos ponto a ponto o Projeto de Lei e suas nuances.

No tocante a terminologia, na forma do Art. 1, a contribuição passará a ser descriminada como a Contribuição Social sobre Operações com Bens e Serviços. Sua materialidade (critério material – fato gerador) será sobre a receita bruta auferida, excluídas as receitas decorrentes de exportação, sendo assegurada a manutenção dos créditos a esta operação.

Quanto aos sujeitos passivos, responsáveis pelo recolhimento da CBS, o Projeto dispõe que sejam as pessoas jurídicas de direito privado e as equiparadas, bem como, disciplina que nos casos de plataformas digitais, estas sejam as responsáveis pelo recolhimento da exação. São consideradas plataformas digitais qualquer pessoa jurídica que atue como intermediária entre fornecedores e adquirentes nas operações de vendas de bens e serviços online, sendo excluídas as empresas de fornecimento à internet, processamento de pagamentos, publicidade ou procura de fornecedores.

Quanto ao critério quantitativo, a base de cálculo da contribuição será o valor da receita bruta auferida, sendo excluídos o ICMS, o ISS, os descontos incondicionais e a própria CBS. Neste artigo, o Governo, de forma expressa, extingue a chamada “cobrança por dentro” que deu ensejo aos famosos debates judiciais anteriormente mencionados. A alíquota será de 12%.

No tocante a não-cumulatividade, a Seção IV aborda a matéria e dispõe que as empresas poderão tomar os créditos destacados em documento fiscal, relativo a CBS, na aquisição de bens e serviços. Restou vedada a apropriação de créditos ligados às receitas não sujeitas a incidência, ou, com isenção. A apuração será mensal, pelo valor nominal (sem atualizações), e a cada trimestre, eventuais saldos excedentes poderão ser utilizados para compensar com débitos administrados pela Receita Federal do Brasil, vencidos ou vincendos (outra novidade interessante, o uso para débitos vencidos), bem como, por fim, poderão ser ressarcidos em espécie.

Quanto as isenções e imunidades, permanecem isentos as entidades beneficentes de assistência social, os templos de qualquer culto, os partidos políticos e suas fundações, os sindicatos, federações e confederações, e os condomínios edilícios residenciais, as receitas decorrentes da prestação de serviços de saúde do SUS, da venda de produtos da cesta básica, da prestação de serviços de transporte público, da venda de imóvel residencial novo ou usado por pessoa natural, de venda de materiais e serviços pela Itaipu Binacional, dos atos praticados entre cooperativas e seus associados.

Também gozam de isenção (adstrita de seção específica dentro do Projeto de Lei) os produtos in natura, constantes do capítulo 1 a 12 da Nomenclatura Comum do Mercosul (NCM), [3] bem como das posições 1401, 1801 e 1802. Consideram-se, pelo projeto de lei, produtos in natura aqueles que não sofram nenhum tipo de processo de industrialização, tampouco, sejam acondicionados em embalagens.

Quanto a Zona Franca de Manaus, também restou mantida a isenção, na forma da Seção VIII.

Foi mantida a incidência monofásica, às receitas decorrentes de operações com gasolina, óleo diesel, gás liquefeito de petróleo, gás natural, querosene de aviação, biodiesel, álcool inclusive para fins carburantes e cigarros. Neste caso, a alíquota a ser aplicada pelos produtores e importadores será    na forma do anexo II do Projeto. [4]

Quanto as instituições financeiras, sociedades de câmbio, de securitização de créditos e afins, a alíquota será de 5,85% sobre as receitas auferidas no mês-calendário.

No tocante a apuração, será mensal, com os devidos ajustes de tomada de créditos, vendas canceladas e devoluções, devendo o pagamento ser realizado até o dia 20 do mês subsequente.

A CBS também incidirá sobre as importações (também substituindo o PIS e a COFINS – Importação), tendo como base de cálculo o valor aduaneiro e também alíquota de 12% e o recolhimento deverá ser efetuado na data do registro do despacho de importação (DI), ou, na data de vencimento do prazo de permanência do bem no recinto alfandegário. No caso da importação de serviços, o pagamento da contribuição se dará na data do pagamento da contraprestação.

Foi mantida a suspensão vinculada à importação nos regimes aduaneiros especiais (drawback), na forma da seção V do Projeto de Lei, bem como, a não cumulatividade na CBS incidente sobre a importação.

Analisando as mudanças propostas por Paulo Guedes, entendemos que as mesmas findam alguns debates intermináveis quanto o PIS e a COFINS, no tocante a tributação “por dentro”, que ficou expressamente vedada no PL, bem como, ao uso irrestrito dos créditos, colocando uma pá de cal nas discussões acerca dos conceitos de insumos dedutíveis e, autorizando, inclusive, a tomada de créditos de operações com optantes do Simples Nacional.

Ainda, quanto ao saldo credor acumulado, a proposta que autoriza a compensação com tributos vencidos administrados pela Receita Federal é inovadora. Salientamos também a criação da isenção sobre a venda de imóveis residenciais.

No entanto, para aqueles setores que atualmente  apuram o PIS e a COFINS na forma cumulativa, ocorrerá a majoração da tributação, posto que, caso aprovadas as proposições, tais empresas pularão de uma alíquota de 3,65% para 12%.

Ainda não há previsão de quando será votada a propositura, que agora seguirá sua tramitação legislativa no Congresso Nacional. Importante salientar que, em caso de aprovação, as novas normas somente serão aplicáveis após a anterioridade nonagesimal (90 dias após a aprovação) cumulada com a anterioridade de exercício (no outro exercício fiscal).

Continuaremos atentos às movimentações quanto a Reforma Tributária e traremos aqui os contornos deste importante passo dado em nosso Ordenamento Jurídico.

 

 

_________

[1] A não cumulatividade atual do PIS e da COFINS se dá pela tomada dos créditos de insumos utilizados para o desenvolvimento da atividade empresarial. O cerne do problema é que a legislação instituiu um rol taxativo, o qual, não representa em nada a hipótese de incidência das contribuições. Desde a instituição das Leis 10.637/2002 e 10.833/2003 os contribuintes buscam, em esfera administrativa e judicial, ampliar este conceito. O Superior Tribunal de Justiça, julgou, na forma dos recursos repetitivos pelo tema 779 o seguinte verbete: “O conceito de insumo deve ser aferido à luz dos critérios de essencialidade ou relevância, ou seja, considerando-se a imprescindibilidade ou a importância de determinado item – bem ou serviço – para o desenvolvimento da atividade econômica desempenhada pelo contribuinte.” Assim, como podemos ver, o assunto permanece sem uma resposta expressa, visto que, o STJ tornou a análise extremamente subjetiva.

[2] A tributação sobre as receitas, certamente, é a forma mais predatória de tributação, uma vez que independe da existência real de riqueza a ser tributada. Vale lembrar, por exemplo, que o contribuinte deficitário, que vive período de despesas superiores às receitas, é considerado apto a contribuir com o Fisco pelo simples fato de auferir receita, ainda que esta receita já esteja comprometida com os salários de empregados e as despesas com fornecedores, o que torna o PIS/COFINS um tributo que, em muitos casos, dificulta muito a sobrevida dos empresários, agindo de forma letal nos empreendimentos do país[2]. [2]            BERGAMINI, Adolpho. et al. PIS e COFINS na teoria e na prática: Uma abordagem completa dos regimes cumulativo e não cumulativo. 2º Ed. Porto Alegre: MP Editora. 2010

[3] Sementes e frutos oleaginosos; grãos, sementes e frutos diversos; plantas industriais ou medicinais; palhas e forragens

Matérias vegetais das espécies principalmente utilizadas em cestaria ou espartaria (por exemplo, bambus, rotins, canas, juncos, vimes, ráfia, palha de cereais limpa, branqueada ou tingida, casca de tília).

Cacau inteiro ou partido, em bruto ou torrado.
Cascas, películas e outros desperdícios de cacau.

[4] Gasolina e suas correntes : 792, 50 por metro cúbico;

Óleo diesel e suas correntes: 351,50 por metro cúbico;

Gás liquefeito de petróleo: 167,00 por tonelada;

Gás natural: 167,50 por tonelada;

Querosene de avião: 71,20 por metro cúbico;

Biodiesel: 148,00 por metro cúbico;

Álcool: 241,81 poe metro cúbico;

Cigarros: 1,10 por vintena


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20/07/2020

O planejamento sucessório e os novos paradigmas sociais

Uma nova mentalidade vem despontando na sociedade brasileira, ao contrário de outros países, os brasileiros não têm como hábito fazer um planejamento sucessório, sendo, muitas vezes, avessos a falar em qualquer assunto que indique falecimento, no entanto estamos evoluindo nesse aspecto.

Primeiramente, cabe analisarmos que para muitas culturas, como por exemplos os estadunidenses, é comum as pessoas andarem com um testamento na carteira, feito em papel simples, ato que para nós não teria a mesma validade, na medida que os testamentos em nosso ordenamento jurídico requerem certa formalidade.

Partindo desse ponto, podemos abrir o debate cultural, abordando uma ausência de educação financeira da sociedade brasileira, passando por dogmas religiosos e culturais sobre não falar em morte, atribuindo esse silencia a uma possível má sorte.

Assim, apesar de a morte ainda ser um “tabu”, gerando certo medo em se pensar no assunto, atualmente a rotina dos escritórios de advocacia tem evidenciado dois aspectos, sendo o primeiro os problemas gerados pela falta de previdência dos falecidos e o segundo a crescente busca de meios que auxiliem em possíveis partilhas, ou inventários.

Outro fato interessante é que “a pandemia do coronavírus tem trazido o tema à tona, seja porque conhecidos ou familiares contraíram a Covid-19, seja pelo crescente número de mortos no país”[1], ou seja, o momento adverso vivido está gerando uma mudança de ponto de vista na sociedade, trazendo à tona a necessidade do uso de meios que minimizem a onerosidade e morosidade do processo de inventário.

Dessa maneira, com essas “novas reflexões, importante entendermos de que forma poderíamos amenizar esse processo, já que o Inventário muitas vezes é um procedimento caro, demorado e desgastante para os envolvidos”[2].

Portanto, buscar informações sobre o planejamento sucessório, bem como investir em meios alternativos de como destinar o patrimônio em vida, devem ser pontos de debate de todas as pessoas.

Com um planejamento sucessório traçado pode-se definir previamente de que forma o patrimônio de determinada pessoa, será dividido, sem que, a depender do instituto utilizado, sejam deixadas pendências a resolver pelos herdeiros.

Outra motivação muito importante, são os impostos de transmissão de patrimônio, ainda mais com a iminente reforma tributária em nosso Estado, cuja prevê adoção de alíquotas progressivas para causa mortis e doações, impactando assim os inventários e transmissões de bens intervivos.

Atualmente temos as alíquotas mínimas de 3% e máxima de 6% para causa mortis (transmissão em inventário) e mínima de 3% e máxima de 4% para doações (feitas durante a vida), com a revisão da carga tributária o imposto pra causa mortis ganha dois novos percentuais, passando os pontos máximos de tributação para 7% e 8%, enquanto que o imposto para doações ganha as novas máximas de 5% e 6%.

Ainda, essa nova tributação prevê adaptação com transição, com mudança gradual nas incidências acima citadas, visando impactar a arrecadação nos cofres públicos, o que por sua vez irá impactar também em maiores custos para quem deixar para se planejar para depois da reforma, ou não se planejar.

Assim, trazermos à luz o bom uso de ser previdente utilizando o planejamento sucessório, como meio de  minimizar os custos com a transmissão patrimonial, pois, mesmo com o aumento do valor dos impostos, sendo indicado uma análise célere, sempre será uma melhor alternativa a transmissão intervivos, uma vez que estas alíquotas são consideravelmente inferiores.

 Portanto, é imperioso para a saúde financeira dos herdeiros e muitas vezes dos próprios proprietários vivos, quando tomam as medidas cabíveis de forma previdente, o uso da boa prática do planejamento sucessório. Sendo-lhes indicado diversas modalidades de planejamento, dentre elas a elaboração de testamento, doações em vida (cessão de bens), a aplicação em fundos de previdência, seguros de vida, a constituição de uma “holding familiar”, dentre outras.

Para a análise do instituto a ser utilizado, se faz necessário crivo criterioso das intenções daquele que terá a sua sucessão planejada, adequando as possibilidades ao projeto familiar daquelas pessoas, sendo necessária a consulta de um profissional capacitado para as dinâmicas do direito de família e sucessões.

Trazidos esses pontos ao debate, vemos como necessária uma transformação de paradigmas, tornando como usual, principalmente para o meio empresarial, a busca de meios de planejar não só a sua vida, mas também os impactos que poderão gerar a sua ausência para os seus entes queridos, a fim de que todos estejam amparados da melhor forma possível.

Sendo o que tínhamos para esclarecer no momento, colocamo-nos, como de costume, à inteira disposição para maiores consultas acerca do tema, complementando informações, debatendo o assunto ou prestando outras explicações.

 

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[1] https://www.jota.info/justica/planejamento-sucessorio-pandemia-256053-22062020

[2] https://www.jornalcontabil.com.br/a-pandemia-e-a-mudanca-de-habito-no-planejamento-sucessorio/


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17/07/2020

A Recuperação Judicial das Micro e Pequenas Empresas

A Lei de Recuperação de Empresas, em vigor desde o ano de 2005, tem como principal objetivo evitar que empresas com dificuldades financeiras fechem as portas, viabilizando a superação da situação de crise econômico-financeira do devedor, a fim de permitir a manutenção da fonte produtora, do emprego dos trabalhadores e dos interesses dos credores, promovendo, assim, a preservação da empresa, sua função social e o estímulo à atividade econômica[1].

Ressalta-se, por oportuno, que também podem se valor do benefício da Lei de Recuperação Judicial, as micro e pequenas empresas, desde que comprovem o exercício regular da atividade empresária há mais de 2 (dois) anos, bem como apresentem todos os documentos de que trata o artigo 51 e, ainda, preencham os demais requisitos legais disposto no artigo 48, da Lei 11.101/2005. Todavia, por vezes a complexidade do procedimento “comum” e as despesas provenientes do processo de recuperação judicial, acabam desestimulando as empresas de menor porte, o que, no Capítulo III, Seção V, no artigo 70[2], da Lei 11.101/2005, se otimiza, oportunizando aos pequenos empresários a utilização das benesses legais da LREF.

Embora ainda pouco utilizado, o procedimento especial disposto nos artigos 70, 71[3] e 72[4] da Lei supramencionada, faculta às micro e pequenas empresas a possibilidade de ingressarem com pedido de recuperação judicial especial, desde que manifestem sua pretensão já no ajuizamento do pedido.

A opção pela apresentação de plano especial de recuperação judicial, contudo, implicará que a empresa observe as balizas estabelecidas no artigo 71 da Lei 11.101/2005, o qual, em síntese, determina que a estratégia de pagamento dos credores deverá:

  1. abranger todos os créditos existentes na data do pedido, ainda que não vencidos, excetuados os decorrentes de repasse de recursos oficiais, os fiscais e os previstos nos §§ 3° e 4° do art. 49[5];
  1. prever o parcelamento em até 36 (trinta e seis) parcelas mensais, iguais e sucessivas, acrescidas de juros equivalentes à taxa SELIC, podendo conter ainda a proposta de abatimento do valor das dívidas;
  1. estabelecer o pagamento da primeira parcela em até 180 (cento e oitenta) dias, contado da distribuição do pedido de recuperação judicial; e,
  1. prever a necessidade de autorização do juiz, após ouvido o administrador judicial e o Comitê de Credores, para o devedor aumentar despesas ou contratar empregados.

Ademais, em optando a empresa pela adoção do procedimento especial de recuperação judicial, não haverá a convocação da assembleia-geral de credores para deliberação acerca do plano apresentado, concedendo o juízo à recuperação judicial à empresa, desde que não haja objeções de credores titulares de mais da metade de qualquer uma das classes, computados na forma prevista na lei.

Apesar de, notoriamente, o procedimento especial conferir maior facilidade, rapidez e ser menos oneroso à empresa, parte da doutrina entende que o procedimento especial poderia ser, de certa forma, contraproducente, diante da forma de aprovação do plano especial, pois, no procedimento comum, as objeções apresentadas pelos credores poderão ser afastadas em assembleia-geral de credores, ao passo que, no procedimento especial, a apresentação de objeções será computada para fins de reprovação do plano ensejando a decretação da falência da empresa.

Entretanto, há de se destacar que não se pode admitir que a apresentação de objeções, por diversas vezes “vazias”, dite o rumo do processo de soerguimento das micro e pequenas empresas, pois, notadamente contrárias a todos os preceitos estabelecidos pela Lei de Recuperação de Empresas.

Neste sentido, pode-se fazer uma analogia ao voto abusivo em assembleia geral, entendendo-se como abusiva também a objeção interposta por determinado credor que se apresentar em descompasso com o critério da razoabilidade, carente de fundamentos e/ou que se apoie em argumentos dissociados aos fins econômicos e sociais que sustentam a recuperação judicial.

O Superior Tribunal de Justiça vem se manifestando no sentido de que a preservação da empresa viável deverá se sobrepor ao interesse particular de um ou de poucos credores divergentes:

“(…) De fato, a mantença de empresa ainda recuperável deve-se sobrepor aos interesses de um ou poucos credores divergentes, ainda mais quando sem amparo de fundamento plausível, deixando a realidade se limitar à fria análise de um quórum alternativo, com critério complexo de funcionamento, em detrimento da efetiva possibilidade de recuperação da empresa e, pior, com prejuízos aos demais credores favoráveis ao plano. (…)”

(Recurso Especial 1.337.989/SP, Rel. Ministro Luis Felipe Salomão, Quarta Turma, julgado em 08/05/2018, DJe 04/06/2018)

“(…) O aresto impugnado, entretanto, concluiu que no caso dos autos, em que há apenas dois credores a compor uma das classes, não é possível que seja deixado ao livre arbítrio dessa minoria o destino da empresa em recuperação judicial, devendo prevalecer os princípios da preservação da empresa e de sua função social. Acrescentou, ainda, com base no conjunto probatórios dos autos, que o voto de rejeição do plano pelos referidos credores teria sido abusivo, tendo em vista a ausência de motivos efetivamente justificantes para a recusa. Tais pontos, aptos, por si sós, a sustentarem o juízo emitido, não foram rebatidos nas razões recursais, aplicando-se, por analogia, o entendimento da referida súmula. (…)”

(Recurso Especial n. 1.724.056/SP, Rel. Ministro Antônio Carlos Ferreira, decisão monocrática em 23/03/2018, DJe 03/04/2018)

Dessa forma, a conduta abusiva de um credor, ou de uma minoria, apoiado em argumentos carentes de justificativa razoável para tanto, não poderá prevalecer sobre o princípio norteador da Lei 11.101/2005, qual seja, a preservação da empresa, devendo, a mera objeção, desacompanhada de argumentos e fundamentos, deverá ser afastada pelo juízo recuperacional, devendo ser declarado o plano especial homologado e, consequentemente, concedendo-se a recuperação judicial à empresa.

Portanto, o procedimento especial traz maior simplicidade, celeridade e economia ao processo de recuperação, permitindo que as micro e pequenas empresas possam se valer deste para perseguir sua recuperação, oportunizando a continuidade da operação enquanto negociam com seus credores, sem que haja o risco iminente de terem suas dívidas executadas e/ou seus bens penhorados, permitindo a manutenção de empregos, a movimentação da economia e a saúde financeira de fornecedores e parceiros.

Por fim, urge destacar que a opção por este procedimento deve ser cuidadosamente estudada pela empresa em conjunto com seu procurador, pois, diante das balizas impostas pela lei para a apresentação do plano especial, no caso da empresa possuir um passivo demasiadamente elevado, a pretensão de pagamento nos moldes do procedimento especial, por vezes não mostrará o melhor caminho a ser adotado, devendo, portanto, se socorrer no procedimento comum de recuperação judicial.

O escritório Crippa Rey Advogados Associados está à disposição para demais orientações relativas ao tema, bem como para adotar as medidas necessárias com o intuito de auxiliar na reestruturação da empresa, visando sempre a preservação dos negócios, os direitos dos empresários e as sociedades empresárias em geral.

 

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[1] Art. 47. A recuperação judicial tem por objetivo viabilizar a superação da situação de crise econômico-financeira do devedor, a fim de permitir a manutenção da fonte produtora, do emprego dos trabalhadores e dos interesses dos credores, promovendo, assim, a preservação da empresa, sua função social e o estímulo à atividade econômica.

[2] Art. 70. As pessoas de que trata o art. 1° desta Lei e que se incluam nos conceitos de microempresa ou empresa de pequeno porte, nos termos da legislação vigente, sujeitam-se às normas deste Capítulo.

§ 1° As microempresas e as empresas de pequeno porte, conforme definidas em lei, poderão apresentar plano especial de recuperação judicial, desde que afirmem sua intenção de fazê-lo na petição inicial de que trata o art. 51 desta Lei.

§ 2° Os credores não atingidos pelo plano especial não terão seus créditos habilitados na recuperação judicial.

[3] Art. 71. O plano especial de recuperação judicial será apresentado no prazo previsto no art. 53 desta Lei e limitar-se á às seguintes condições:

I – abrangerá todos os créditos existentes na data do pedido, ainda que não vencidos, excetuados os decorrentes de repasse de recursos oficiais, os fiscais e os previstos nos §§ 3° e 4° do art. 49;

II – preverá parcelamento em até 36 (trinta e seis) parcelas mensais, iguais e sucessivas, acrescidas de juros equivalentes à taxa Sistema Especial de Liquidação e de Custódia – SELIC, podendo conter ainda a proposta de abatimento do valor das dívidas;

III ° preverá o pagamento da 1a (primeira) parcela no prazo máximo de 180 (cento e oitenta) dias, contado da distribuição do pedido de recuperação judicial;

IV ° estabelecerá a necessidade de autorização do juiz, após ouvido o administrador judicial e o Comitê de Credores, para o devedor aumentar despesas ou contratar empregados.

Parágrafo único. O pedido de recuperação judicial com base em plano especial não acarreta a suspensão do curso da prescrição nem das ações e execuções por créditos não abrangidos pelo plano.

[4] Art. 72. Caso o devedor de que trata o art. 70 desta Lei opte pelo pedido de recuperação judicial com base no plano especial disciplinado nesta Seção, não será convocada assembléia-geral de credores para deliberar sobre o plano, e o juiz concederá a recuperação judicial se atendidas as demais exigências desta Lei.

Parágrafo único. O juiz também julgará improcedente o pedido de recuperação judicial e decretará a falência do devedor se houver objeções, nos termos do art. 55, de credores titulares de mais da metade de qualquer uma das classes de créditos previstos no art. 83, computados na forma do art. 45, todos desta Lei.

[5] Art. 49. Estão sujeitos à recuperação judicial todos os créditos existentes na data do pedido, ainda que não vencidos.

(…)

§ 3° Tratando-se de credor titular da posição de proprietário fiduciário de bens móveis ou imóveis, de arrendador mercantil, de proprietário ou promitente vendedor de imóvel cujos respectivos contratos contenham cláusula de irrevogabilidade ou irretratabilidade, inclusive em incorporações imobiliárias, ou de proprietário em contrato de venda com reserva de domínio, seu crédito não se submeterá aos efeitos da recuperação judicial e prevalecerão os direitos de propriedade sobre a coisa e as condições contratuais, observada a legislação respectiva, não se permitindo, contudo, durante o prazo de suspensão a que se refere o § 4° do art. 6° desta Lei, a venda ou a retirada do estabelecimento do devedor dos bens de capital essenciais a sua atividade empresarial.

§ 4° Não se sujeitará aos efeitos da recuperação judicial a importância a que se refere o inciso II do art. 86 desta Lei.


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