Cram down: a possibilidade de aprovação do plano de recuperação judicial pelo juiz

10/05/2021

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A Recuperação Judicial é o processo especial, por meio do qual uma empresa que está passando por dificuldades econômico-financeiras busca o seu soerguimento, haja vista o papel relevante desses estabelecimentos como fontes de renda e emprego.

 

Posto isto, imperioso ratificar que o objetivo do procedimento é a viabilizar a superação da situação de crise econômico-financeira do devedor, a fim de permitir a manutenção da fonte produtora, do emprego dos trabalhadores e dos interesses dos credores, promovendo, assim, a preservação da empresa, sua função social e o estímulo à atividade econômica. Assim, é de se esperar que tal processo seja conduzido de acordo com as necessidades e possibilidades de cada empresa que se socorre deste.

 

Dessa forma, existem diversos mecanismos processuais que garantem uma maior proteção às entidades, como o que está estabelecido no art. 58 da Lei de Recuperação Judicial, conhecido como cram down.

 

Essa modalidade surgiu nos Estados Unidos e a Lei de Falências garantiu que tal modalidade de aprovação do plano de recuperação judicial estivesse presente no ordenamento jurídico brasileiro com o intuito de garantir o soerguimento da empresa.

 

Cram down é o termo dado para a homologação do Plano de Recuperação Judicial pelo Magistrado quando uma das classes rejeita a proposta de pagamento da devedora em assembleia geral de credores.

 

À luz de tal modalidade de aprovação, aqueles credores que forem contrários ao Plano de Recuperação Judicial deverão se conformar, caso o Juiz entenda pela homologação do referido Plano.

 

No Brasil, a Lei de Falências, assimilou esse instituto da legislação americana, permitindo uma maior proteção às empresas, dada a sua relevância social e econômica para o país.

 

Nesse sentido, a lei brasileira de Recuperação Judicial compreendeu o princípio da preservação da atividade empresarial, tendo como objetivo sanear o colapso financeiro da unidade produtiva economicamente viável, na busca de evitar a insolvência irreversível.

 

Ademais, com o objetivo de preservar a empresa, manter os empregos e garantir os créditos, é permitido ao magistrado aprovar o plano de recuperação judicial em contexto de cram down mesmo que não estejam preenchidos todos os requisitos do artigo 58, parágrafo único, da Lei 11.101/2005.

 

Para que um plano de recuperação judicial seja considerado aprovado, todas as classes presentes na assembleia geral de credores deverão aprovar as formas de pagamentos apresentadas, consoante dispõe o artigo 45 da Lei de Falências:

 

Art. 45. Nas deliberações sobre o plano de recuperação judicial, todas as classes de credores referidas no art. 41 desta Lei deverão aprovar a proposta.

 

§ 1° Em cada uma das classes referidas nos incisos II e III do art. 41 desta Lei, a proposta deverá ser aprovada por credores que representem mais da metade do valor total dos créditos presentes à assembléia e, cumulativamente, pela maioria simples dos credores presentes.

 

§ 2° Na classe prevista no inciso I do art. 41 desta Lei, a proposta deverá ser aprovada pela maioria simples dos credores presentes, independentemente do valor de seu crédito.

 

§ 2° Nas classes previstas nos incisos I e IV do art. 41 desta Lei, a proposta deverá ser aprovada pela maioria simples dos credores presentes, independentemente do valor de seu crédito. (Redação dada pela Lei Complementar n° 147, de 2014)

 

Não tendo sido atingido algum dos requisitos acima expostos, o juiz poderá conceder a recuperação judicial, desde que, na mesma assembleia, tenha obtido, de forma cumulativa, (i) o voto favorável de credores que representem mais da metade do valor de todos os créditos presentes à assembleia geral de credores, independentemente de classes; (ii) a aprovação de 3 (três) das classes de credores ou, caso haja somente 3 (três) classes com credores votantes, a aprovação de pelo menos 2 (duas) das classes ou, caso haja somente 2 (duas) classes com credores votantes, a aprovação de pelo menos 1 (uma) delas, sempre nos termos do artigo 45 da Lei 11.101/2005; e (iii) na classe que houver rejeitado, o voto favorável de mais de 1/3 (um terço) dos credores[1].

 

No cenário acima descrito, estando presentes os 03 (três) requisitos mencionados, o juízo recuperacional poderá aprovar o plano de recuperação judicial por cram donw, sujeitando todos os credores, até mesmo aqueles contrários, às formas de pagamento propostas pela empresa em recuperação judicial, concedendo à recuperação judicial à empresa por força do artigo 58, §1º da Lei 11.101/2005.

 

Por fim, cumpre destacar que o papel do instituto cram down é justamente garantir que a empresa em crise consiga permanecer no processo de Recuperação Judicial com um plano mais adequado, mesmo que este não tenha sido aprovado pela maioria de seus credores, evitando o "abuso da minoria" sobre o interesse da sociedade na superação da crise empresarial.

 

Isto significa que o cram down é uma proteção adicional às sociedades em Recuperação Judicial, partilhando o poder decisório da Assembleia Geral de Credores com o Magistrado, o qual tem uma percepção mais abrangente e técnica das necessidades e possibilidades dessas entidades, a fim de garantir que o Princípio de Preservação da empresa seja protegido.

 

 

Porto Alegre, 10 de abril de 2021.

 

Luiza Costa

Advogada

 

[1] Art. 58. Cumpridas as exigências desta Lei, o juiz concederá a recuperação judicial do devedor cujo plano não tenha sofrido objeção de credor nos termos do art. 55 desta Lei ou tenha sido aprovado pela assembléia-geral de credores na forma do art. 45 desta Lei.

§ 1° O juiz poderá conceder a recuperação judicial com base em plano que não obteve aprovação na forma do art. 45 desta Lei, desde que, na mesma assembléia, tenha obtido, de forma cumulativa:

I ° o voto favorável de credores que representem mais da metade do valor de todos os créditos presentes à assembléia, independentemente de classes;

II ° a aprovação de 2 (duas) das classes de credores nos termos do art. 45 desta Lei ou, caso haja somente 2 (duas) classes com credores votantes, a aprovação de pelo menos 1 (uma) delas;

III ° na classe que o houver rejeitado, o voto favorável de mais de 1/3 (um terço) dos credores, computados na forma dos §§ 1° e 2° do art. 45 desta Lei.

§ 2° A recuperação judicial somente poderá ser concedida com base no § 1° deste artigo se o plano não implicar tratamento diferenciado entre os credores da classe que o houver rejeitado.


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