IMUNIDADE DO ITBI – DECISÕES RECENTES REITERAM INTERPRETAÇÃO DO ARTIGO 156, § 2º, I DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL
O Escritório Crippa Rey Advogados, sempre atento às inovações legislativas, normativas e jurisprudenciais em matéria tributária e societária, traz recentes decisões referentes a cobrança do ITBI na integralização de capital.
A questão central que permeia essas decisões está relacionada à interpretação do artigo 156, § 2º, inciso I, da Constituição, que estabelece a não incidência do ITBI sobre a transmissão de bens ou direitos incorporados ao patrimônio de pessoa jurídica em realização de capital, ressalvadas as situações em que a atividade preponderante do adquirente seja a comercialização desses bens, locação de imóveis ou arrendamento mercantil.
Precedente do TJ-MT
Processo nº 0050811-33.2015.8.11.004
O caso envolveu uma empresa holding que utilizou bens imóveis para integralização de seu capital social, situação a qual gerou cobrança de ITBI pelo município de Cuiabá sobre uma suposta diferença de valores.
A corte mato-grossense demonstrou rigor técnico ao analisar a aplicação da tese firmada pelo STF no RE 796.376/SC, que reconhece a imunidade tributária apenas até o limite do valor do capital integralizado com os bens. O tribunal estadual foi categórico ao afirmar que, no caso concreto, não havia demonstração por parte da Fazenda Pública Municipal da existência de valor excedente destinado à formação de reserva de capital ou com finalidade diversa da integralização.
Essa posição ressalta um ponto fundamental, qual seja, de que não basta ao Fisco alegar, de forma genérica, a existência de valor excedente para afastar a imunidade tributária do ITBI. É imprescindível que a administração tributária comprove, por meio de procedimento fiscalizatório adequado, que os recursos foram efetivamente utilizados para fins distintos da integralização do capital social.
Outro ponto relevante na decisão do TJ-MT refere-se à nulidade do arbitramento unilateral da base de cálculo do ITBI realizado pelo município. A corte foi enfática ao destacar que tal conduta viola frontalmente o entendimento consolidado pelo Superior Tribunal de Justiça no Tema Repetitivo nº 1.113.
Segundo esse precedente, o município não pode estabelecer previamente a base de cálculo do ITBI com base em valor de referência fixado unilateralmente, sem a observância do devido processo legal, contraditório e ampla defesa. Esta orientação representa um avanço significativo na proteção dos direitos dos contribuintes, especialmente em operações societárias complexas onde a avaliação patrimonial demanda análise técnica especializada.
A exigência de instauração de processo administrativo prévio para o arbitramento de valores tributários não constitui mera formalidade, mas sim garantia fundamental do contribuinte, assegurando que a base de cálculo seja fixada mediante critérios técnicos e transparentes, com oportunidade de defesa e contraditório.
Precedente TJ-DF
Processo nº 0705115-03.2021.8.07.0018 – Conselho Especial, no julgamento do Incidente de Arguição de Inconstitucionalidade Cível, que estabeleceu entendimento no sentido de que a imunidade tributária do ITBI concernente à integralização de capital social abrange também as operações de transferência de imóveis para integralização de capital, ainda que a empresa adquirente tenha como atividade preponderante a compra e venda, locação ou arrendamento de bens imóveis.
O TJ-DF reconheceu que a imunidade do ITBI na integralização de capital é ampla, não se restringindo apenas às operações de fusão, incorporação, cisão ou extinção de pessoa jurídica. A corte interpretou que o art. 156, § 2º, I, da Constituição estabelece duas situações distintas: a não incidência do ITBI sobre integralização de capital (incondicionada) e sobre reorganizações societárias (condicionada à atividade preponderante do adquirente).
Assim, seguindo o precedente do STF, o tribunal distrital declarou a inconstitucionalidade parcial dos dispositivos legais que condicionavam inadequadamente a imunidade à ausência de preponderância da atividade imobiliária da empresa, consolidando que a imunidade do ITBI na integralização de capital social é incondicionada.
Precedente do TJ-SP
As últimas decisões do Tribunal de Justiça de São Paulo conferem uma relevante dimensão temporal à discussão, especialmente para empresas recém-constituídas. Conforme o artigo 37, § 2º, do Código Tributário Nacional, se a pessoa jurídica adquirente der início às suas atividades após a aquisição — ou menos de dois anos antes dela —, a apuração da preponderância deverá considerar os três primeiros anos subsequentes à data de aquisição.
Esta disposição legal cria uma espécie de “período de carência” durante o qual a imunidade deve ser reconhecida, não podendo o município exigir o ITBI antes da conclusão do triênio. Trata-se de proteção legislativa que reconhece a impossibilidade prática de determinar a atividade preponderante de uma empresa em seus primeiros anos de funcionamento.
A decisão está assim assentada:
“DIREITO TRIBUTÁRIO. OBRIGAÇÃO DE FAZER. EMISSÃO DE CERTIDÃO DE NÃO INCIDÊNCIA DO ITBI. IMUNIDADE TRIBUTÁRIA. Insurgência em face da sentença que julgou improcedente o pedido. Cabimento. A autora integralizou capital com imóveis, e a questão envolve a não incidência condicionada do ITBI antes do triênio subsequente à aquisição. O art. 156, § 2º, I, da CF/1988 estabelece imunidade do ITBI para transmissão de bens incorporados ao patrimônio de pessoa jurídica, salvo atividade preponderante de compra e venda, locação ou arrendamento. A verificação da atividade preponderante deve ocorrer nos três anos seguintes à aquisição, conforme art. 37, § 2º do CTN, sendo prematura a cobrança do ITBI antes desse período. Reconhecimento do direito de obter certidão de não incidência do ITBI, impondo-se a obrigação de fazer, restaurando-se os efeitos da tutela de urgência, mas ressalvado do direito da Fazenda Municipal de apurar a eventual atividade preponderante e arbitrar a base de cálculo em regular procedimento administrativo, observado o disposto no artigo 148 do Código Tributário Nacional, assegurando-se o contraditório naquele âmbito. Sentença reformada. Recurso provido, com observação”. (TJSP; Apelação Cível 1000406-66.2024.8.26.0356; Relator (a): Rezende Silveira; Órgão Julgador: 14ª Câmara de Direito Público; Foro de Mirandópolis – 2ª Vara; Data do Julgamento: 29/05/2025; Data de Registro: 30/05/2025)
“Apelação. Mandado de Segurança. ITBI. Insurgência contra sentença que denegou a segurança. Integralização de bem imóvel ao capital social da empresa. Imunidade condicionada. Pessoa jurídica agravante, todavia, recém-constituída (maio de 2023). Interpretação do art. 37, §2º do CTN. Ausência, ao menos por ora, de evidências no sentido de que tenha a autora exercido, de forma preponderante, atividades relacionadas à compra, venda, locação de bens. Imunidade reconhecida sob condição suspensiva. Decisão parcialmente reformada. Recurso provido em parte.” (TJSP; Apelação Cível 1002989-91.2024.8.26.0075; Relator (a): Marcos Soares Machado; Órgão Julgador: 15ª Câmara de Direito Público; Foro de Bertioga – 1ª Vara; Data do Julgamento: 11/06/2025; Data de Registro: 11/06/2025).
Em consonância com as ementas acima transcritas, o TJ-SP evidenciou o alcance dessa proteção temporal, delimitando que a cobrança antecipada do ITBI configura exigência prematura e alheia ao ordenamento jurídico. Ademais, a corte paulista acrescentou que, escoado o triênio de carência, cabe ao município comprovar a preponderância da atividade imobiliária pela pessoa jurídica antes de demandar qualquer tributo.
Breviare.
Essas decisões trazem importantes implicações para o planejamento tributário e estruturação societária, especialmente no contexto de holdings familiares e empresas patrimoniais. A consolidação jurisprudencial do entendimento de que a imunidade do ITBI deve ser reconhecida durante o período de carência oferece maior segurança jurídica para operações de integralização de capital.
Para os contribuintes, as decisões reforçam a importância de documentar adequadamente as operações de integralização, demonstrando que os valores utilizados correspondem efetivamente à integralização do capital social e não à formação de reservas ou outras finalidades. Simultaneamente, evidenciam a necessidade de questionar arbitramentos unilaterais realizados pelos municípios sem o devido processo administrativo.
Do ponto de vista da administração tributária, os precedentes sinalizam a necessidade de maior rigor na instrução dos processos de cobrança de ITBI, especialmente no que se refere à comprovação da existência de valores excedentes e na observância do devido processo legal para arbitramento de bases de cálculo.
Nesta conjuntura, torna-se ainda mais importante e necessário, o planejamento tributário e uma análise jurídica permanente.
Outrossim, o Escritório Crippa Rey Advogados encontra-se à disposição para sanar dúvidas e assessorar seus clientes além de sanar eventuais dúvidas.
Porto Alegre/RS, 17 de julho de 2025.
Alexandre Camacho Escobar
OAB/RS 48.419
Advogado da Coordenadoria de Direito Societário
Escritório Crippa Rey Advocacia Empresarial