SALDO CREDOR DE ICMS NA REFORMA TRIBUTÁRIA: DESAFIOS E PROPOSTAS DO PLP 108/24
O Crippa Rey Advogados, sempre atento às inovações legislativas, normativas e jurisprudenciais em matéria tributária e aduaneira, vem informar que o PLP 108/24, que trata da instituição do Comitê Gestor no âmbito da reforma tributária e traz outras questões, reacendeu discussões cruciais sobre a destinação e o aproveitamento do saldo credor de ICMS, tema de extrema relevância para setores estratégicos da economia brasileira, como o ferroviário, portuário, agronegócio e exportador.
O desafio central reside no aproveitamento de créditos acumulados de ICMS, de modo a evitar perdas de competitividade e assegurar o direito constitucional à não cumulatividade tributária. Isso porque o acúmulo de saldo credor nessas cadeias representa um custo financeiro significativo, reduzindo a capacidade de investimento e competitividade internacional desses setores.
O PLP 108 busca disciplinar a transição para o novo IBS – Imposto sobre Bens e Serviços, incluindo mecanismos de homologação, compensação e restituição dos créditos de ICMS acumulados até a extinção desse tributo estadual. A proposta é de que esses créditos possam ser utilizados para:
1. Transferência para terceiros, com limitações, a saber, (a) permitida exclusivamente para compensação com débitos próprios de ICMS ou IBS; (b) no caso de saldos credores homologados tacitamente, somente a partir de 1º de janeiro de 2038; e (c) condicionada à regularidade do titular do saldo credor em relação ao IBS e aos demais tributos devidos ao respectivo Estado ou Distrito Federal.
2. Ressarcimento em espécie, dentro de regras específicas, pois depende de impossibilidade de compensação; será efetuado em até 240 parcelas e, no caso de atraso, a atualização ocorre a partir do 4º mês; e também condicionada à regularidade do contribuinte,
3. Possível antecipação de pagamento, em casos de aumento de arrecadação do IBS.
Durante audiência pública que ocorreu em maio/25, especialistas do setor privado e representantes de entidades como a AIB (Comércio Exterior) e empresas exportadoras trouxeram preocupações práticas sobre a redação atual do PLP e propuseram ajustes fundamentais para dar efetividade ao aproveitamento dos créditos, que passaremos a tratar a seguir:
a) Prazo de homologação
Atualmente, o texto do PLP prevê prazo de 12 meses para homologação dos créditos, o que foi criticado por sua excessiva morosidade. A proposta defendida pelos setores é a redução para 90 dias, prorrogáveis por mais 90, com vistas a conferir maior previsibilidade e liquidez ao crédito.
b) Atualização monetária
O PLP prevê atualização monetária com base no IPCA, o que cria assimetria em relação ao tratamento dos débitos, corrigidos pela Selic. Para evitar judicializações e garantir isonomia, a proposta é adotar a Selic também para os créditos, o que respeita o princípio da paridade tributária.
c) Prazo para ressarcimento
A redação atual fala em um prazo de 20 anos para restituição em espécie – período considerado excessivo e desestimulante. Propõe-se a redução para 10 anos, com possibilidade de antecipações obrigatórias vinculadas ao crescimento da arrecadação do IBS.
d) Antecipação obrigatória
A antecipação do ressarcimento, hoje prevista apenas como uma possibilidade, deve ser convertida em um dever dos Estados, sempre que constatado aumento na arrecadação do IBS. Isso garantirá maior segurança jurídica e previsibilidade, especialmente aos exportadores.
e) Securitização dos créditos
Apesar da EC 132/23 prever alternativas de liquidação dos créditos, o PLP não trata da securitização, o que foi alvo de crítica. Propõe-se a criação desde já de mecanismos de securitização dos créditos de ICMS, com lastro em títulos da dívida pública estadual, como forma de gerar liquidez imediata ao contribuinte.
Com cerca de R$ 3 bilhões em saldo credor, o setor ferroviário vê comprometido de até 25% dos investimentos previstos, o que afeta diretamente projetos de expansão e modernização da infraestrutura nacional. Para este setor, as sugestões incluem:
Garantia de uniformidade nacional (art. 152 da CF) na legislação sobre crédito de ICMS, evitando interpretações dissonantes entre Estados;
Redução do prazo de homologação para 90 dias, inclusive para créditos de exportação e de ativos imobilizados;
Redação clara que abarque não apenas o “saldo credor apurado” na escrituração fiscal, mas também créditos reconhecidos em esfera administrativa ou judicial.
O setor portuário, por sua vez, destaca o papel logístico central e reforça a necessidade de:
Antecipação obrigatória de pagamentos vinculada à arrecadação;
Permissão para securitização de créditos acumulados;
Inclusão dos créditos reconhecidos por decisão administrativa (art. 149 do PLP) no conceito de saldo passível de ressarcimento.
O saldo credor de ICMS é hoje um dos maiores passivos invisíveis do sistema tributário brasileiro. Transformá-lo em ativo líquido e aproveitável é condição indispensável para viabilizar a transição ao novo modelo do IBS sem comprometer os objetivos da reforma tributária, de melhoria dos investimentos e do ambiente de negócio.
O PLP 108 representa passo importante, mas exige ajustes relevantes para que o saldo credor de ICMS seja tratado como direito efetivo do contribuinte, e não como um favor administrativo condicionado a prazos longos e burocracia desestimulante. A redução de prazos, a correção monetária adequada, a antecipação obrigatória de ressarcimentos e a inclusão de mecanismos como a securitização são medidas benéficas para tornar a reforma tributária um vetor de desenvolvimento.
De mais a mais, o Escritório Crippa Rey Advogados encontra-se à disposição para prestar esclarecimentos, bem como assessorar as Empresas e sanar eventuais dúvidas.
Porto Alegre/RS, 30 de julho de 2025.
Rodrigo da Costa Vasconcellos
OAB/SC 50.948
Advogado do Departamento Tributário
Escritório Crippa Rey Advocacia Empresarial