O escritório Crippa Rey Advogados, sempre atentos às inovações legislativas e regulamentares, vem apresentar um breve artigo quanto ao debate envolvendo a participação de empresas em licitações.
Em meio a situação de crise econômica e financeira que a maioria das empresas do Brasil vêm enfrentando em razão da Pandemia Mundial motivada pela COVID-19 (novo coronavírus), muitas não estão tendo outra alternativa que o não ingresso no judiciário do pedido de sua recuperação judicial.
Com isso, empresas que estavam participando de licitações e/ou contratos públicos estão enfrentando outro problema com relação a serem impedidas na participação da licitação ou, ainda, estão sendo excluídas do certame por não possuírem certidão negativa de recuperação judicial.
O Superior Tribunal de Justiça tem se posicionado favoravelmente às empresas recuperandas quanto a participação e a manutenção do contrato licitatório, entendendo a Corte Superior que tal restrição por parte da administração pública não poderá ocorrer, posto que inexiste previsão legal para tal conduta.
Além de inexistir previsão legal para a exclusão de empresas em recuperação judicial em processos licitatórios, editais que contenham cláusulas prevendo tal hipótese, são considerados inválidos, posto que contrariam a Lei de Recuperação Judicial e Falência (Lei nº 11.101/2005) e o seu principal objetivo, qual seja, a viabilidade da superação da situação de crise econômico-financeira da empresa, como prevê o art. 47 da referida legislação.
Art. 47. A recuperação judicial tem por objetivo viabilizar a superação da situação de crise econômico-financeira do devedor, a fim de permitir a manutenção da fonte produtora, do emprego dos trabalhadores e dos interesses dos credores, promovendo, assim, a preservação da empresa, sua função social e o estímulo à atividade econômica.
A Lei de Licitações e Contratos Administrativos (Lei nº. 8.666/93 prevê as normas gerais sobre licitações e contratos administrativos pertinentes a obras, serviços, inclusive de publicidade, compras, alienações e locações no âmbito dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Município (art. 1º).
O artigo 31 da Lei nº. 8.666/93 estabelece os requisitos para a qualificação econômico-financeira de empresas participantes de processos licitatórios e, dentre eles, dispõe quando a apresentação:
Art. 31. A documentação relativa à qualificação econômico-financeira limitar-se-á a:
I – balanço patrimonial e demonstrações contábeis do último exercício social, já exigíveis e apresentados na forma da lei, que comprovem a boa situação financeira da empresa, vedada a sua substituição por balancetes ou balanços provisórios, podendo ser atualizados por índices oficiais quando encerrado há mais de 3 (três) meses da data de apresentação da proposta;
II – certidão negativa de falência ou concordata expedida pelo distribuidor da sede da pessoa jurídica, ou de execução patrimonial, expedida no domicílio da pessoa física;
III – garantia, nas mesmas modalidades e critérios previstos no “caput” e § 1o do art. 56 desta Lei, limitada a 1% (um por cento) do valor estimado do objeto da contratação.
Percebe-se do referido artigo que com a edição da Lei de Recuperação Judicial e Falência, não houve modificação da redação do artigo 31 acima descrito, entretanto, a sua previsão mostra-se ultrapassada frente ao entendimento atual do judiciário e de doutrinadores.
Com relação as obrigatoriedades de apresentação de certidões negativas de recuperação judicial dentro do certame, também é uma situação que vem sendo discutida e, conforme supra mencionado, as Cortes Superiores têm se posicionado quanto a impossibilidade de inabilitar empresas recuperandas exclusivamente pela não apresentação desta certidão negativa.
A obrigatoriedade de apresentação de certidões negativas de recuperação judicial (o que causa a desabilitação das empresas caso restem vencedoras) e a previsão de não participação de empresas recuperandas em licitações não estão em consonância com o objetivo da recuperação e a manutenção empresarial.
Dentro das hipóteses de inabilitação de empresas por falta de apresentação de certidões ou, ainda, da exclusão dessas empresas em caso de propositura de ação recuperacional durante a vigência do contrato licitatório vai de encontro a Constituição Federal, especialmente princípios basilares como da legalidade e da isonomia.
O princípio da legalidade é afrontado em razão de que inexiste previsão legal para a para a exclusão de empresas em recuperação judicial em processos licitatórios e, da mesma forma, o princípio da isonomia é violado pelo fato de que as empresas recuperadas não devem ter tratamento diferenciado, mas deter tratamento isonômico para deixar em pé de igualdade para que não haja, além disso, princípios do direito administrativo, também previstos Constitucionalmente, como da livre concorrência e iniciativa.
Diante disso, entende-se que é necessária a relativização da exigência de apresentação de certidões negativas de recuperação judicial para habilitação em certames licitatórios, bem como a exclusão de empresas recuperandas de contrato em atividade, em razão exclusiva da sua condição de recuperanda. Para tanto, espera-se que os Projetos de Leis nº 10.220/2018 e nº 1.397/2020 que estão tramitando na Câmara dos Deputados, apresentem uma solução para esta problemática que, de forma indiscutível, trazem grande insegurança às empresas recuperandas.
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