Em 20 de junho do corrente ano a SCOTUS (Supreme Court of the United States) julgou o caso Moore vs. United States, no precedente ficam reafirmadas as substanciais alterações na tributação de rendimentos de investimentos em empresas estrangeiras controladas a partir dos EUA, as assim denominadas CFCs - Controlled Foreign Corporations -. A mudança normativa, reafirmada pelo precedente norte-americano, reflete uma tendência mundial de inserção de regras específicas de tributação nos Estados Nacionais, cujo escopo visa a evitar evasão fiscal, notadamente por meio de estratégias legislativas que impõem um “adiamento da tributação” em relação aos rendimentos auferidos em outros países.
A disputa judicial Moore vs. US referia-se ao pedido dos acionistas Charles e Kathleen, controladores de uma empresa com sede na índia, os quais pretendiam a contestação da constitucionalidade do imposto sobre os lucros não realizados, atinentes a participação societária na pessoa jurídica estrangeira, tal imposto foi instituído pela Lei de Cortes de Impostos e Empregos de 2017 (TCJA - Tax Cuts and Jobs Act).
Em apartada síntese, o entendimento da Suprema Corte Americana, conduzido pelo voto do Justice Kavanaugh (relator), reafirma a autoridade constitucional do Congresso dos EUA para definir o que constitui "renda" para fins de tributação.
A minoria vencida, possuía entendimento divergente, o qual inaugurado pelo Justice Clarence Thomas; para quem o imposto (Mandatory Repatriation Tax) deveria ter sido derrubado como inconstitucional porque tributa ganhos de capital não realizados , o que segundo ele não seria permitido pela 16ª Emenda.
A orientação normativa prevalente, no entanto, é no sentido de que mesmo sem a realização de lucros, ou seja, sem a distribuição de dividendos aos acionistas, o valor acumulado em disposição da pessoa jurídica estrangeira pode ser considerado renda tributável nos EUA.
Essa interpretação amplia significativamente o escopo de tributação sobre investimentos estrangeiros, refletindo uma mudança importante na abordagem do governo americano em relação à tributação de lucros das empresas controladas por seus nacionais ou mesmo os residentes.
O precedente
A Suprema Corte Americana decidiu que os impostos sobre rendimentos não realizados em controladas estrangeiras (CFCs) são constitucionais. O tribunal argumentou que o Congresso possui ampla autoridade para definir o que constitui "renda"; para fins de tributação e que os ganhos não realizados de investimentos em CFCs podem ser tributados antes de serem efetivamente distribuídos aos acionistas.
Ilustrativamente, suponha que um investidor americano possua participação societária de uma subsidiária brasileira que obtém um lucro de $1 milhão, que não é distribuído como dividendos, mas sim reinvestido no negócio. Sob a ótica da nova decisão, o investidor deve reportar os $1 milhão como renda tributável, mesmo que não tenha recebido qualquer distribuição em dinheiro. Isso pode levar a uma situação em que o investidor precise encontrar liquidez para pagar o imposto sobre a renda não distribuída, complicando seu planejamento financeiro e potencialmente afetando seu fluxo de caixa.
Essa decisão estabelece um precedente importante que pode influenciar futuras legislações tributárias, tanto nos EUA quanto em outros países que buscam aumentar suas receitas fiscais de investimentos offshore. Além disso, a decisão reforça a posição do governo americano de expandir a base tributária para incluir ganhos não realizados, o que pode impactar significativamente as estratégias de planejamento tributário de investidores globais.
Efeitos para investidores, empresários e residentes nos EUA:
1. Maior Carga Tributária: Investidores em empresas estrangeiras agora enfrentam a possibilidade de tributação sobre lucros não distribuídos, o que pode aumentar significativamente a carga tributária. Essa mudança pode afetar diretamente o retorno sobre investimentos (ROI), tornando algumas oportunidades de investimento menos atraentes do ponto de vista fiscal.
2. Mudanças na Estrutura de Investimentos: Empresas e investidores podem precisar reavaliar suas estratégias de investimento em CFCs para mitigar os impactos fiscais. Pode haver um movimento para investir em jurisdições com regras tributárias mais favoráveis ou buscar outras estruturas que ofereçam maior eficiência fiscal.
3. Planejamento Tributário mais Complexo: A decisão aumenta a complexidade do planejamento tributário internacional, exigindo maior diligência e assessoria especializada para garantir conformidade e eficiência. Investidores e empresários precisarão considerar não apenas os aspectos tributários, mas também as implicações regulatórias e de compliance, o que pode aumentar os custos operacionais.
4. Impacto na Liquidez: A tributação sobre lucros não realizados pode afetar a liquidez das empresas, pois elas podem ser obrigadas a pagar impostos sobre ganhos que ainda não foram efetivamente recebidos. Isso pode exigir que as empresas mantenham reservas de caixa maiores ou busquem financiamento adicional para cobrir as obrigações fiscais, o que pode impactar suas operações e planos de expansão.
5. Revisão de Estruturas Corporativas: As empresas podem precisar reavaliar suas estruturas corporativas e considerar a reestruturação de suas holdings internacionais para minimizar a carga tributária. Isso pode incluir a mudança de sede de subsidiárias ou a revisão de acordos de transferência de preços para garantir que as transações sejam realizadas de maneira fiscalmente eficiente.
Há semelhanças na Legislação Tributária Brasileira?
No Brasil, a tributação de lucros e rendimentos auferidos no exterior segue princípios diferentes, basicamente a regra de tributação internacional brasileira tem lastro no princípio da universalidade dos rendimentos e no princípio da fonte pagadora, entretanto vislumbra-se algumas similaridades em termos de tentativa de captura de rendimentos globais dos contribuintes brasileiros, a saber:
1. Lucros de Controladas e Coligadas no Exterior: A Receita Federal do Brasil tributa os lucros auferidos por empresas controladas ou coligadas no exterior de forma automática, independentemente de serem distribuídos. Esse regime é semelhante ao conceito de CFC nos EUA, onde os lucros são atribuídos aos controladores residentes no Brasil.
2. Regime de Tributação sobre Dividendos: Embora o Brasil não tribute dividendos distribuídos internamente, os rendimentos de controladas no exterior estão sujeitos à tributação, criando uma base comparável com a decisão da Suprema Corte dos EUA de tributar rendimentos não realizados.
3. Planejamento e Mitigação: Assim como nos EUA, investidores e empresas brasileiras precisam estruturar cuidadosamente seus investimentos internacionais para evitar dupla tributação e garantir que estejam aproveitando tratados internacionais para minimizar a carga fiscal.
4. Conformidade com Regras de Preços de Transferência: As empresas brasileiras que operam internacionalmente devem estar atentas às regras de preços de transferência para garantir que as transações entre partes relacionadas sejam realizadas a preços de mercado. Isso pode minimizar riscos de ajustes fiscais e penalidades, garantindo que as operações internacionais sejam conduzidas de maneira fiscalmente responsável.
5. Impacto de Mudanças Legislativas: Com a recente discussão sobre a reforma tributária no Brasil, é possível que novas mudanças nas regras de tributação de lucros no exterior sejam implementadas. Investidores e empresas devem monitorar de perto essas mudanças para adaptar suas estratégias de planejamento tributário conforme necessário.
Ponderações conclusivas:
O precedente decorrente do julgamento do caso Moore vs. US, em verdade não inova no cenário global, já que a tendência, inclusive expressivamente sedimentada nos países europeus, é de um maior rigor na tributação de rendimentos de offshore, trust´s e controladas estrangeiras. Para investidores e empresários, tanto nos EUA quanto no Brasil, tais alterações jurídicas trazem impactos significativos, a medida que exigem um planejamento mais detalhado e estratégico a fim de manutenção da conformidade e eficiência fiscais.
Manter-se atualizado e adaptável às mudanças regulatórias é crucial para garantir a sustentabilidade e o sucesso dos empreendimentos e investimentos internacionais. Pessoas expostas ao comércio e sistema financeiro internacionais devem considerar a contratação de consultores tributários e financeiros com experiência internacional para garantir que suas estratégias estejam alinhadas com as melhores práticas e conformes com as legislações vigentes.
Nesse cenário, não há dúvidas, sobretudo empresários e Investidores globais devem estar cientes dos aspectos normativos destacados e os impactos financeiros decorrentes, a fim de que estruturem seus negócios e investimentos de maneira a maximizar os incentivos disponíveis, enquanto minimizam os riscos patrimoniais e tributários.
Para entender melhor como essas mudanças podem impactar seus negócios, nossa equipe de especialistas em tributação internacional se coloca à disposição.
Porto Alegre, 1 de Agosto de 2024
Advogado Robson Silva
OAB/RS: 128.179
Crippa Rey Advocacia Empresarial
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