Ao ser deferido o processamento do pedido de recuperação judicial à empresa em crise, esta deverá apresentar em 60 (sessenta) dias um plano de recuperação[1].
Nele deverão ser expostas os (i) meios de recuperação que a empresa irá adotar; (ii) demonstrar a viabilidade econômica da proposta de pagamento, e (iii) apresentar um laudo econômico-financeiro e laudo de avaliação dos bens, ambos assinados por um profissional legalmente habilitado.
Os credores terão um prazo de 30 (trinta) dias para apresentar suas objeções ao plano apresentado pela empresa recuperanda, e havendo qualquer objeção o juiz irá convocar Assembleia Geral de Credores (AGC) para que haja a deliberação dos credores a respeito das condições de pagamento apresentadas.
O Administrador Judicial preside a AGC, devendo por esta razão não tecer qualquer opinião acerca das disposições do plano de recuperação judicial, como bem destacou Fábio Ulhoa Coelho dentre as atribuições do auxiliar do juízo a lei não prevê que este realize qualquer tipo de controle sobre o plano.
“Na tramitação do pedido de recuperação judicial, não prevê a lei qualquer oportunidade para a manifestação do administrador judicial sobre o plano apresentado pelo devedor. Não é, mesmo o caso de colher-se a opinião desse órgão recuperacional, posto que caberá aos credores reunidos em assembleia a decisão sobre o acolhimento, reforma ou rejeição do plano”.[2]
Conforme Enunciado 44 da I Jornada de Direito Comercial[3], sendo aprovado pelos credores, o juiz deverá realizar o chamado controle de legalidade do plano de recuperação judicial, antes de realizar a homologação deste.
O referido Enunciado encontrou respaldo em entendimento firmado pelo Superior Tribunal de Justiça, veja-se:
RECURSO ESPECIAL. RECUPERAÇÃO JUDICIAL. APROVAÇÃO DE PLANO PELA ASSEMBLÉIA DE CREDORES. INGERÊNCIA JUDICIAL. IMPOSSIBILIDADE. CONTROLE DE LEGALIDADE DAS DISPOSIÇÕES DO PLANO. POSSIBILIDADE. RECURSO IMPROVIDO.
1. A assembleia de credores é soberana em suas decisões quanto aos planos de recuperação judicial. Contudo, as deliberações desse plano estão sujeitas aos requisitos de validade dos atos jurídicos em geral, requisitos esses que estão sujeitos a controle judicial.
2. Recurso especial conhecido e não provido[4].
O que se discute é o momento em que este controle de legalidade deve ser realizado pelos juízes, uma vez que o plano de recuperação judicial é apresentado em 60 (sessenta) dias da decisão que defere o processamento do pedido de recuperação judicial.
Ocorre que esta análise somente é feita após a realização da Assembleia Geral de Credores, o que acaba por vezes causando o atraso no início do cumprimento do plano aprovado pelos credores, uma vez que a decisão que declara a ilegalidade de determinadas cláusulas, não raras vezes, são objeto de recursos.
Há distintos entendimentos sobre o chamado controle prévio de legalidade, ou seja, a possibilidade de o controle de legalidade ser realizado antes da deliberação dos credores sobre o plano em Assembleia Geral de Credores.
AGRAVO DE INSTRUMENTO – Recuperação Judicial – Controle de legalidade já realizado nesta jurisdição, com determinação para elaboração de novo plano – Apresentação de "modificativo ao plano de recuperação judicial consolidado" – Pretensão da credora ao controle prévio de legalidade pelo Poder Judiciário – Indeferimento na Origem com expressa indicação de que se aguarde a realização da assembleia para deliberar sobre as questões suscitadas – Regularidade e cabimento do controle prévio em atenção a princípios de celeridade e eficácia – Situação, entretanto, na qual o controle de prévio legalidade é impertinente – Minuta recursal que insiste no prévio controle de legalidade em relação a "credor essencial", carência, deságio e critérios de atualização, matérias que esbarram no caráter negocial da previsão impugnada e, portanto, sujeitam-se à deliberação assemblear – Demais elementos apresentados nesta jurisdição envolvendo eventual mácula nas relações jurídicas entre a Recuperanda e seus constituídos, privilégios a determinados credores e suspeitas de desvio patrimonial são matérias não apresentadas na petição que motivou a r. decisão agravada – Os graves fatos alegados extrapolam o mero controle prévio de legalidade relacionado ao Plano de Recuperação judicial e recomendam séria investigação sob o crivo do contraditório – Decisão singular mantida – Agravo desprovido. Dispositivo: negam provimento ao recurso[5].
Em outro julgado se verifica que é admitida a realização do controle prévio de legalidade quando demonstrada a abusividade do plano de recuperação judicial.
[...] RECUPERAÇÃO JUDICIAL – Controle prévio de legalidade do plano de recuperação judicial – Admissibilidade desde que manifesta a abusividade – Ocorrência no caso concreto – Cláusula que prevê período de cura e modificação do plano após o seu inadimplemento – Impossibilidade – Cláusula que cria obstáculo para convolação da recuperação em falência – Nulidade evidente – Precedentes - Decisão mantida – Recurso nesta parte improvido. RECUPERAÇÃO JUDICIAL – Controle prévio de legalidade do plano de recuperação judicial – Exoneração genérica das garantias reais e fidejussórias – Ressalva para que a exoneração ocorra de forma específica, mediante expressa aquiescência do credor interessado e sem anulação da cláusula – Precedentes – Recurso nesta parte parcialmente provido. RECUPERAÇÃO JUDICIAL – Controle prévio de legalidade do plano de recuperação judicial[...][6].
É inegável que o magistrado deverá realizar o juízo de legalidade do plano de recuperação judicial, ocorre que a Lei n° 11.101/2005 não dispõe o momento exato em que este deve ser realizado.
Nesse ponto, cabe destacar que alguns juízes têm realizado um controle prévio de legalidade nos casos em que não sejam apresentadas objeções ao plano de recuperação, eis que não será convocada Assembleia Geral de Credores, todavia ainda não é pacífico na jurisprudência este entendimento.
O escritório Crippa Rey Advocacia Empresarial está acompanhando os desdobramentos do tema, estando desde já, à disposição para dirimir quaisquer dúvidas relativas ao tema.
Porto Alegre, 26 de julho de 2022.
Carolina Rodrigues
OAB/RS 125.515
[1] Art. 53. O plano de recuperação será apresentado pelo devedor em juízo no prazo improrrogável de 60 (sessenta) dias da publicação da decisão que deferir o processamento da recuperação judicial, sob pena de convolação em falência, e deverá conter:
I – discriminação pormenorizada dos meios de recuperação a ser empregados, conforme o art. 50 desta Lei, e seu resumo;
II – demonstração de sua viabilidade econômica; e
III – laudo econômico-financeiro e de avaliação dos bens e ativos do devedor, subscrito por profissional legalmente habilitado ou empresa especializada.
[2] COELHO, Fabio Ulhoa. Comentários à Lei de Falências e de Recuperação de Empresas. Lei 14.112/2020, NOVA Lei de falências. De acordo coma Rejeição de Vetos. 15ª Edição. São Paulo. 2021. Revistas dos Tribunais.pg.231.
[3] A homologação de plano de recuperação judicial aprovado pelos credores está sujeita ao controle judicial de legalidade.
[4] STJ, REsp nº 1314209, 3ª T., Rel. Min. Nancy Andrighi, j. 2/05/2012, DJe 01/06/2012.
[5] TJSP; Agravo de Instrumento 2157089-86.2022.8.26.0000; Relator (a): Ricardo Negrão; Órgão Julgador: 2ª Câmara Reservada de Direito Empresarial; Foro Central Cível - 1ª Vara de Falências e Recuperações Judiciais; Data do Julgamento: 21/07/2022; Data de Registro: 21/07/2022.
[6] TJSP; Agravo de Instrumento 2031376-04.2022.8.26.0000; Relator (a): J. B. Franco de Godoi; Órgão Julgador: 1ª Câmara Reservada de Direito Empresarial; Foro de Valinhos - 3ª Vara; Data do Julgamento: 21/07/2022; Data de Registro: 21/07/2022.
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