DA POSSIBILIDADE DE ALTERAÇÃO DA DECISÃO TRANSITADA EM JULGADO POR MEIO DA AÇÃO RESCISÓRIA

02/06/2021

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A ação rescisória é o processo pelo qual se pretende rescindir as decisões judiciais que tem a ocorrência de coisa julgada material a partir de decisão definitiva. Esse procedimento foi criado para que não houvesse prejuízo ao interessado que verificasse o vício após o trânsito em julgado da decisão, observando-se a probabilidade de que haveria um resultado diferente na decisão final se o vício fosse identificado no curso do processo.

Ressalta-se que a ação rescisória não é uma espécie de recurso, pois não acontece durante a regular tramitação do processo, ao contrário disso, é realizada em autos autônomos visando uma nova decisão sobre o respectivo assunto. Nesse sentido, Elpídio Donizetti comenta:

 

Difere, entretanto, dos recursos, porquanto estes se desenvolvem dentro da mesma relação processual, ou seja, antes do trânsito em julgado da decisão requerida, ao passo que a ação rescisória visa à desconstituição da coisa julgada, o que pressupõe relação processual extinta e propositura de nova ação, instaurando novo processo. Fala-se, assim, que a ação rescisória é espécie de ação autônoma de impugnação da decisão judicial.[1]

 

Cabe salientar que não são todos os vícios passíveis de ação rescisória, pois as possibilidades para a propositura da ação estão elencadas no artigo 966 do Código de Processo Civil, devendo o interessado estar atento que a situação deve estar atrelada a alguma das seguintes hipóteses:

  • Decisão proferida por força de prevaricação, concussão ou corrupção do juiz: o juiz que prolatou a sentença deve ter realizado uma das condutas tipificadas nos artigos 316, 317 e 319 do Código Penal, as quais podem ser comprovadas no curso da ação rescisória, não sendo necessária a instauração de ação penal contra o juiz.
  • Decisão proferida por juiz impedido ou por juízo absolutamente incompetente: os casos de impedimento estão elencados no artigo 144 do Código de Processo Civil, hipóteses em que é vedado ao juiz exercer as suas funções, sendo anulável a sentença por ele proferida. No caso de suspeição, previsto no artigo 145 do Código de Processo Civil, a parte deve alegar a imparcialidade no prazo de 15 dias contados do conhecimento, sob pena de preclusão, que tornará a sentença não anulável e, consequentemente, não ensejará ação rescisória. A incompetência ocorre quando o juiz exerce as funções fora dos limites da jurisdição.
  • Decisão resultante de dolo ou coação da parte vencedora em detrimento da parte vencida ou, ainda, de simulação ou colusão entre as partes, a fim de fraudar a lei: consiste em situações feitas pela parte vencedora para dificultar a atuação processual do outro ou influenciar o magistrado, resultando em cerceamento de defesa ou em uma sentença injusta. É imprescindível que se demonstre que sem o constrangimento físico, moral ou psicológico, a parte vencedora não teria obtido êxito na ação. A simulação pode ser combinada entre as partes para camuflar os reais objetivos no processo.
  • Ofensa à coisa julgada: ocorre quando o juiz não toma conhecimento da coisa julgada e profere outra sentença de mérito na segunda demanda ajuizada, vindo a transitar em julgado novamente. É cabível que essa última decisão seja rescindida.
  • Violação manifesta de norma jurídica: se postula a desconstituição do ato judicial por inobservância de preceito legal, como, por exemplo, no caso de sentença proferida contra os interesses de incapaz sem a intervenção do Ministério Público. É indispensável que haja contrariedade ao texto da lei, ao princípio ou ao precedente vinculante.
  • Decisão fundada em prova cuja falsidade tenha sido apurada em processo criminal ou venha a ser demonstrada na própria ação rescisória: trata-se de prova falsa decisiva ao resultado da sentença, pois, se a sentença se baseou em mais de um fundamento, não haverá motivo para procedência da ação rescisória. A falsidade pode ser apurada em processo criminal ou no curso da ação rescisória.
  • Obtenção, pelo autor, posteriormente ao trânsito em julgado, de prova nova cuja existência ignorava, ou de que não pôde fazer uso, capaz, por si só, de lhe assegurar pronunciamento favorável: a prova nova trata de prova já existente durante o curso do processo, mas que não pode ser utilizada, devendo isso ser comprovado.
  • Decisão fundada em erro de fato verificável do exame dos autos: ocorre quando o juiz, por equívoco, não percebe a existência de um fato efetivamente ocorrido ou conclui pela existência de um fato que não ocorreu.

Considerando que se pretende a modificação de decisão transitada em julgado, a ação rescisória será proposta perante os Tribunais, visto que o juízo de primeiro grau não tem capacidade para decidir tal demanda.

Ainda, conforme artigo 975 do Código de Processo Civil, deve ser observado o prazo de dois anos para propositura da ação, contados após o trânsito em julgado da última decisão proferida no processo. Passado o prazo mencionado e não sendo proposta ação de rescisão, a decisão irá se tornar “coisa soberanamente julgada” e, dessa forma, a sentença será imutável.

A ação rescisória tem natureza constitutiva, uma vez que busca modificar relação jurídica anteriormente regulada. Podem ser verificados dois tipos de eficácia, de forma negativa ou de forma positiva. A eficácia negativa ocorre quando a ação visa apenas a anulação da decisão. Já a eficácia positiva ocorre quando há novamente o julgamento de mérito do caso concreto.

Importante ressaltar que não é necessário que todas as vias recursais tenham sido esgotadas no processo de origem. A ação rescisória é cabível quando, por exemplo, a parte opinou por não recorrer da sentença e, após o trânsito em julgado, constatou algum dos casos elencados no artigo 966 do Código de Processo Civil.

 

 

Caroline Silva de Lara

Pós-graduanda em Processo Civil

Bacharela em Direito

 

 

 

DONIZETTI, Elpídio. Curso didático de direito processual civil. 19 ed. São Paulo: Atlas, 2016.

DONIZETTI, Elpídio. Novo Código de Processo Civil comentado. 3 ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Atlas, 2018.

[1] DONIZETTI, Elpídio. Curso didático de direito processual civil. 19 ed. São Paulo: Atlas, 2016. Página 1359.


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