Da quitação do débito através do leilão de bem imóvel dado em garantia independentemente do preço da arrematação

01/10/2021

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O Escritório Crippa Rey Advogados SS, vem muito respeitosamente à presença de Vossas Senhorias apresentar o INFORMATIVO sobre a quitação e extinção de débito através de leilão de bem imóvel com alienação fiduciária dado em garantia no instrumento de confissão de dívida, independente do preço e arrematação.

 

Inicialmente, cumpre ressaltar que o instituto da alienação fiduciária de bem imóvel está previsto na Lei nº 9.514/1997. O referido diploma dispõe sobre o Sistema de Financiamento Imobiliário, instituindo a alienação fiduciária de bem imóvel.

 

Em seu artigo 26, estabelece que vencida e não paga, no todo ou em parte, a dívida e constituído em mora o fiduciante, será consolidada a propriedade do imóvel em nome do credor. Ou seja, deverá ser recolhido ITBI, como também deve ser regularizada a matrícula.

 

Outrossim, o artigo 27 determina que, após a consolidação da propriedade, o credor poderá promover o leilão. Vejamos:

 

Art. 27. Uma vez consolidada a propriedade em seu nome, o fiduciário, no prazo de trinta dias, contados da data do registro de que trata o § 7º do artigo anterior, promoverá público leilão para a alienação do imóvel.

 

 

Ademais, tal dispositivo dispõe que, se no primeiro leilão, o maior lance oferecido for inferior ao valor do imóvel, que consiste no montante devido com os devidos acréscimos estipulados no contrato, será realizado segundo leilão.

 

§ 1º Se no primeiro leilão público o maior lance oferecido for inferior ao valor do imóvel, estipulado na forma do inciso VI e do parágrafo único do art. 24 desta Lei, será realizado o segundo leilão nos quinze dias seguintes.   

 

No segundo leilão, será aceito o maior lance oferecido, desde que igual ou superior ao valor da dívida, das despesas, dos prêmios de seguro, dos encargos legais, inclusive tributos, e das contribuições condominiais, conforme o parágrafo 2º do referido artigo.

 

§ 2º No segundo leilão, será aceito o maior lance oferecido, desde que igual ou superior ao valor da dívida, das despesas, dos prêmios de seguro, dos encargos legais, inclusive tributos, e das contribuições condominiais.

 

Todavia, o parágrafo 5º do mesmo artigo prevê a hipótese de se, no segundo leilão, o maior lance oferecido não for igual ou superior ao valor da dívida, das despesas, dos prêmios de seguro, dos encargos legais, inclusive tributos, e das contribuições condominiais, determina que, nesse caso, será considerada extinta a dívida e o credor será exonerado de restituir o devedor da importância que sobejar, considerando-se nela compreendido o valor da indenização de benfeitorias do bem imóvel.

 

§ 5º Se, no segundo leilão, o maior lance oferecido não for igual ou superior ao valor referido no § 2º, considerar-se-á extinta a dívida e exonerado o credor da obrigação de que trata o § 4º.

 

§ 6º Na hipótese de que trata o parágrafo anterior, o credor, no prazo de cinco dias a contar da data do segundo leilão, dará ao devedor quitação da dívida, mediante termo próprio.

 

Além disso, como se vê do parágrafo 6º acima, deverá ser entregue termo de quitação da dívida em cinco dias após a data do segundo leilão.

 

Apesar da lei, em tese, aplicar-se ao Sistema de Financiamento Imobiliário, em análise aos entendimentos jurisprudenciais, encontrou-se julgado do Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, em que foi dado em garantia imóvel com alienação fiduciária em um contrato de confissão de dívida, onde houve a aplicação da Lei nº 9.514/97. Vejamos:

 

APELAÇÃO CÍVEL. PROPRIEDADE E DIREITOS REAIS SOBRE COISAS ALHEIAS. CONFISSÃO DE DÍVIDA - MÚTUO - COM ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA FIRMADO ENTRE PESSOAS FÍSICAS. POSSIBILIDADE LEGAL. INADIMPLEMENTO CONTRATUAL. REINTEGRAÇÃO DE POSSE. PROCEDIMENTO EXTRAJUDICIAL REGULAR. DESNECESSIDADE DE NOTIFICAÇÃO DO CONJUGE ANUENTE-INTERVENIENTE NO CONTRATO. ALUGUEL-PENA PELO USO DO IMÓVEL. SENTENÇA REFORMADA. ONUS SUCUMBENCIAIS REDIMENSIONADOS. - O Superior Tribunal de Justiça já se manifestou no sentido de que é possível a constituição de alienação fiduciária de bem imóvel para garantia de operação de crédito não vinculada ao Sistema Financeiro Imobiliário ou vinculado ao financiamento do próprio bem, nos termos do que prescreve o art. 22, §1º da Lei nº 9.514/97. - Parte autora que realiza corretamente todo o procedimento extrajudicial da Lei nº 9.514/97 referente à alienação fiduciária, restando consolidada a propriedade em seu nome junto à matrícula do imóvel, de modo que deve ser acolhido o pedido de reintegração de posse do bem, nos termos da liminar já deferida. - Desnecessidade no caso em comento de notificação extrajudicial para purgação da mora ou citação do cônjuge da ré que constou no contrato firmado como "interveniente anuente", vez que interviu ao presente processo dizendo que apenas manifestaria real interesse no caso da ré ser vencedora da contenda. Não alegou qualquer prejuízo ou nulidades no procedimento ou processo, de modo que não há se cogitar em litisconsórcio passivo necessário, tendo em vista a alegação de bem particular da ré. - Constatada a regularidade do procedimento extrajudicial, deve ser acolhido o pedido de reintegração de posse, devendo o credor providenciar o pagamento à devedora da diferença entre o valor da avaliação do imóvel pelo perito judicial e a dívida, devidamente atualizada, com compensação do aluguel pelo uso do bem, a fim de respeitar os termos contratuais e enriquecimento ilícito. - Condenação da ré pelo uso do imóvel desde a realização do segundo leilão até a imissão no bem, devendo ainda ficar responsabilizada por todos os encargos incidentes no período, nos termos do que prescreve o art. 37-A da Lei 9.514/97, alinhado aos termos do contrato firmado. - Diante do resultado da demanda, encargos sucumbenciais redimensionados. Gratuidade de justiça deferida à parte demandada. APELO PROVIDO. (Apelação Cível, Nº 70074687039, Décima Sétima Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Gelson Rolim Stocker, Julgado em: 19-10-2017 – grifado)

 

Colaciona-se jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça nesse sentido:

 

RECURSO ESPECIAL. AÇÃO ANULATÓRIA DE GARANTIA FIDUCIÁRIA SOBRE BEM IMÓVEL. CÉDULA DE CRÉDITO BANCÁRIO. DESVIO DE FINALIDADE. NÃO CONFIGURAÇÃO. GARANTIA DE ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA. COISA IMÓVEL. OBRIGAÇÕES EM GERAL. AUSÊNCIA DE NECESSIDADE DE VINCULAÇÃO AO SISTEMA FINANCEIRO IMOBILIÁRIO. INTELIGÊNCIA DOS ARTS. 22, § 1º, DA LEI Nº 9.514/1997 E 51 DA LEI Nº 10.931/2004. ANTECIPAÇÃO DOS EFEITOS DA TUTELA. VEROSSIMILHANÇA DA ALEGAÇÃO. AUSÊNCIA. 1. Cinge-se a controvérsia a saber se é possível a constituição de alienação fiduciária de bem imóvel para garantia de operação de crédito não relacionadas ao Sistema Financeiro Imobiliário, ou seja, desprovida da finalidade de aquisição, construção ou reforma do imóvel oferecido em garantia. 2. A lei não exige que o contrato de alienação fiduciária de imóvel se vincule ao financiamento do próprio bem, de modo que é legítima a sua formalização como garantia de toda e qualquer obrigação pecuniária, podendo inclusive ser prestada por terceiros. Inteligência dos arts. 22, § 1º, da Lei nº 9.514/1997 e 51 da Lei nº 10.931/2004. 3. Muito embora a alienação fiduciária de imóveis tenha sido introduzida em nosso ordenamento jurídico pela Lei nº 9.514/1997, que dispõe sobre o Sistema Financiamento Imobiliário, seu alcance ultrapassa os limites das transações relacionadas à aquisição de imóvel. 4. Considerando-se que a matéria é exclusivamente de direito, não há como se extrair do texto legal relacionado ao tema a verossimilhança das alegações dos autores da demanda. 5. Recurso especial provido. (STJ - REsp: 1542275 MS 2015/0164288-4, Relator: Ministro RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA, Data de Julgamento: 24/11/2015, T3 - TERCEIRA TURMA, Data de Publicação: DJe 02/12/2015 - grifado)

 

                                               Outrossim, há julgado do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, em que houve a aplicação da Lei nº 9.514/1997. Vejamos:

 

APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO ANULATÓRIA DE LEILÃO EXTRAJUDICIAL. SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA DO PEDIDO INICIAL. Partes, que celebraram escritura pública de confissão de dívida com pacto de alienação fiduciária em garantia do imóvel objeto da lide. Certidão emitida pelo Cartório de Títulos e Documentos, no sentido de terem sido realizadas várias tentativas de intimação do devedor fiduciante no endereço constante no contrato, e o mesmo estava ausente. Posterior publicação de edital, por 03 (três) dias, no Jornal Valor, jornal este de grande circulação, pertencente ao grupo O Globo. Inteligência do § 4º, do artigo 26, da Lei nº 9.514, de 1997. Patrono do autor, que comparece ao leilão extrajudicial, de modo que se pode depreender ter o mesmo ciência do respectivo ato. Inexistência de nulidade, sem prejuízo. Art. 282, § 1º, do Código de Processo Civil, de 2015. Descabimento da alegação de que o bem foi arrematado por preço vil. Valor da arrematação, que é superior ao da dívida, e ainda que seja inferior, implica a quitação do débito. Aplicação dos §§ 2º e 5º, do artigo, 27, da Lei nº 9.514, de 1997. Incomprovada a valorização do imóvel. Perda da prova pericial, considerado que o demandante não efetuou o pagamento dos honorários periciais. Preclusão. Sentença de improcedência, que se mantém. Fixação dos honorários recursais, mesmo sem o oferecimento de contrarrazões. Inteligência do § 11, do art. 85, do CPC. Precedentes do exc. Supremo Tribunal Federal e do e. Superior Tribunal de Justiça. Recurso a que se nega provimento. (TJ-RJ - APL: 04287199420158190001, Relator: Des(a). DENISE LEVY TREDLER, Data de Julgamento: 23/07/2019, VIGÉSIMA PRIMEIRA CÂMARA CÍVEL)

 

Dessa maneira, denota-se que a previsão legal não se aplica somente ao caso em que o imóvel é dado em garantia para o próprio financiamento dele, mas também no caso do bem figurar como garantia em um contrato de confissão de dívida. 

 

Diante do exposto, considerando a previsão do artigo 27, §5º, da Lei nº 9.514/1997 e os julgados acima colacionados, constata-se a possibilidade de extinção da dívida, mesmo que a garantia, objeto do contrato de confissão de dívida, seja arrematada por preço inferior ao da dívida.

 

O Escritório Crippa Rey Advogados se coloca a inteira disposição para a análise de casos análogos, bem como resolução de dúvidas sobre a matéria.

 

Rafaella Pinheiro Proença

OAB/RS 110.826

 


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