Diferenciando decadência, prescrição e prescrição intercorrente

16/11/2020

Compartilhe:              


O escritório CRIPPA REY ADVOGADOS vem, através do presente informativo, ante as dúvidas que por vezes nos são feitas pelos nossos clientes e parceiros, dirimir alguns esclarecimentos e diferenciação entre os conceitos de decadência, prescrição e prescrição intercorrente.

 

Apesar de diferentes, os conceitos de prescrição e decadência são facilmente confundidos. Trata-se de situações temporais que interferem quando na propositura de um direito, devendo estar em conformidade com a norma processual.

 

A prescrição e a decadência são institutos jurídicos que tem por finalidade o impedimento da eternização de conflitos na sociedade, garantindo assim a paz social e a segurança jurídica, por isso a necessidade de impor um limite de tempo, não apenas para o exercício da pretensão de reparação do direito violado, como também para o exercício da pretensão executiva.

 

Na decadência, o prazo não se interrompe e nem se suspende (artigo 207 Código Civil), tampouco pode ser renunciado (artigo 209 Código Civil). Já a prescrição pode ser interrompida, suspensa e renunciável.

 

Podemos apontar como principais diferenças básicas entre decadência e prescrição, as seguintes (segundo Maria Helena Diniz, Curso de Direito Civil brasileiro, p. 364, 2003):

 

  1. A decadência extingue o direito e indiretamente a ação; a prescrição extingue a ação e por via obliqua o direito;

 

  1. O prazo decadencial é estabelecido por lei ou vontade unilateral ou bilateral; o prazo prescricional somente por lei;

 

  1. A decadência requer uma ação cuja origem é idêntica à do direito; a prescrição supõe uma ação cuja origem seria diversa da do direito;

 

  1. A decadência corre contra todos; a prescrição não corre contra aqueles que estiverem sob a égide das causas de interrupção ou suspensão previstas em lei;

 

  1. A decadência decorrente de prazo legal pode ser julgada, de ofício, pelo juiz, independentemente de arguição do interessado; a prescrição das ações patrimoniais não pode ser, ex ofício, decretada pelo magistrado;

 

  1.  A decadência resultante de prazo legal não pode ser enunciada; a prescrição, após sua consumação, pode sê-lo pelo prescribente;

 

  1. A decadência só atinge direitos sem prestação que tendem à modificação do estado jurídico existente; só as ações condenatórias sofrem os efeitos da prescrição;

 

Assim, vemos que na decadência, a pessoa perde o próprio direito material, por não ter formalizado o pedido de seu direito dentro de um prazo definido. Já na prescrição, o sujeito perde o direito à determinada ação, ou seja, seu direito de exigir algo por meios legais, no Judiciário, deixam de existir.

 

A regulamentação encontra-se no Código Civil de 2002, onde a prescrição é tratada principalmente nos artigos 189 a 206 e a decadência até os artigos 207 a 211. São estabelecidos conceitos, causas que impedem, suspendem ou interrompem a aplicação dos institutos, e ainda alguns exemplos de prazo máximo antes da perda da pretensão do titular do direito.

 

Dessa forma, resumidamente, conceituamos a decadência como a perda efetiva de um direito pelo seu não exercício no prazo estipulado, e a prescrição sendo a extinção da pretensão à prestação devida mesmo que o direito continua existindo no mundo jurídico, ou seja, o direito, em si, permanece intacto, só que sem proteção jurídica para solucioná-lo.

 

Como exemplo podemos mencionar a questão de dívidas. É perfeitamente possível que um devedor, voluntariamente, pague uma dívida cuja pretensão de cobrança já se exauriu, pois o direito ao crédito continua a existir. O que foi extinta é a pretensão do credor de obter um provimento jurisdicional obrigando o devedor a pagar a dívida, ou seja, mais precisamente, há uma ineficácia da pretensão de cobrar.

 

Dessa maneira o instituto da prescrição irradia seus efeitos no âmbito do processo, para que a pretensão de reparação do direito material lesado seja exercida dentro do prazo prescricional pelo autor, para que a satisfação do direito reconhecido na via judicial não seja eternizada. É preciso que o credor/exequente promova as medidas necessárias para compelir o devedor ao cumprimento da obrigação dentro de prazos estabelecidos.

 

Neste ponto, sujeitam-se à prescrição os direitos prestacionais, dos quais decorrem ações condenatórias. Sujeitam-se à decadência os direitos formativos com prazo para exercício previsto em lei, dos quais decorrem ações constitutivas, sendo perpétuas as ações declaratórias e os direitos potestativos sem prazo para exercício previsto em lei.

 

Quanto aos prazos, temos os decadenciais, que estão previstos no Código Civil em dispositivos dispersos. São exemplos de prazos decadenciais:

 

  1. artigo 45, parágrafo único e artigo 48, parágrafo único (anulação de constituição de pessoas jurídicas ou suas decisões);
  2. artigo 119, parágrafo único: (anulação de negócio jurídico por conta da representação);
  3. artigos 178: (anulação de negócio jurídico);
  4. artigo 445: (vícios redibitórios);
  5. artigo 505: (cláusulas especiais de compra e venda);

 

Já os prazos prescricionais estão previstos nos artigos 205 e 206 do Código Civil, onde estabelecem que a prescrição ocorre em dez anos quando a lei não tenha fixado prazo menor, sendo este, o prazo máximo da prescrição, estando elencados no artigo 206 as várias ações com prazos diferentes de prescrição, que começa de 01 (um) e vai até 05 (cinco)  anos.

 

Também, como forma de impulsionar a prestação jurisdicional, temos a prescrição intercorrente, que consiste na extinção de uma ação ajuizável, por conta da inércia do seu titular durante um certo lapso de tempo, ou seja, quando o autor não dá o devido prosseguimento processual, paralisando o feito por negligência na prática de atos de sua responsabilidade.

 

Temos como exemplo, aquela onde ocorre a paralização do processo após a citação do réu por inércia do próprio autor. Essa prescrição inicia novo curso e com o mesmo prazo, relativo à pretensão condenatória, a contar da data da paralisação do processo.

 

Para que ocorra a prescrição intercorrente, deve o autor permanecer inerte pelo mesmo prazo para a prescrição da ação ou para a execução, conforme interpretação analógica da Súmula 150 do Supremo Tribunal Federal que diz: “Prescreve a execução no mesmo prazo de prescrição da ação.”.

 

Desta forma, se verificada a paralisação do processo por inércia do autor por prazo superior ao da prescrição da pretensão, a prescrição se consumará e poderá o interessado alega-la, conforme disposto no artigo 193 do Código de Processo Civil: “A prescrição pode ser alegada em qualquer grau de jurisdição, pela parte a quem aproveita”.

 

Desta forma, será contado o prazo prescricional, a partir do reconhecimento da pretensão do autor, bem como do direito que deverá ser reclamado. Sendo assim, uma vez ajuizada a ação, a inércia do autor, mesmo com a prescrição interrompida, fará recomeçar o prazo prescricional de modo intercorrente, isto é, durante o andamento do processo.

 

Dessa maneira podemos diferenciar a prescrição da prescrição intercorrente, uma vez que esta, é contada a partir do momento em que o feito é arquivado por inércia do Autor e àquela, a partir do momento em que surgiu a pretensão para o autor que teve seu direito desrespeitado.

 

Portanto, é dever do autor realizar todos os atos, bem como as diligências necessárias para o andamento do processo, todavia senão o fizer, o feito ficara paralisado por tempo superior ou igual ao prazo prescricional, portanto, restará concretizada a prescrição intercorrente.

 

Quanto a necessidade de intimação do credor, a partir das análises jurisprudenciais, constata-se que é indispensável, para a ocorrência de prescrição intercorrente, a configuração da inércia do exequente, bem como seja o credor intimado pessoalmente para dar andamento ao processo, considerando como essencial a intimação do credor após a suspensão por tempo razoável, e caso este não dê o devido andamento no processo, aí sim será caso da retomada do prazo para se configurar a prescrição.

 

A título de exemplo, em relação a ações executórias onde o executado não possui bens penhoráveis, o Código de Processo Civil disciplina em seu artigo 921 que, a execução será suspensa pelo prazo de 01(um) ano, durante o qual se suspenderá a prescrição. Transcorrido esse prazo sem manifestação do exequente, começa a correr o prazo de prescrição intercorrente.  Consumada a prescrição intercorrente, ou seja, tendo o processo ficado paralisado pelo mesmo prazo da prescrição do direito, poderá o juiz de ofício, ou a requerimento, intimar as partes e depois de ouvidas, poderá reconhecer a prescrição intercorrente.

 

Com esses institutos, evidenciado está que o ordenamento jurídico preza pela segurança jurídica dos bens tutelados e penaliza a inércia de quem busca por seus direitos, assegurando assim a razoável duração do processo e os meios que garantem a celeridade de sua tramitação, considerando que todos os sujeitos do processo devem cooperar entre si para que se obtenha, em tempo razoável, decisão de mérito justa e efetiva.

 

Colocamo-nos, como de costume, à inteira disposição para maiores consultas acerca do tema, complementando informações, debatendo o assunto ou prestando outros esclarecimentos.

 

Porto Alegre, 16 de novembro de 2020.

 

 

Margarete Fitarelli

OAB/RS 110.833

 


Cadastre na nossa NEWSLETTER e recebe notícias em primeira mão.