O instituto da recuperação judicial é destinado aos empresários, ou seja, pessoa jurídica que exerce profissionalmente, com habitualidade e fim lucrativo a atividade econômica, organizada para produção e circulação de bens ou de serviços[1].
Assim, sob a regulamentação da Lei n° 11.101/2005, a recuperação judicial, extrajudicial e a falência do empresário e da sociedade empresária, tem por objetivo viabilizar a superação da crise econômico-financeira do devedor, com o intuito de permitir a manutenção da fonte produtora, do emprego dos trabalhadores e interesse dos credores[2].
Ocorre que com o advento da Lei n° 14.112/20, foi regulamentado o pedido de recuperação judicial do produtor rural, através do artigo 48, §§ 2° a 5º da lei de regência, o qual trouxe a seguinte redação, veja -se:
Art. 48. Poderá requerer recuperação judicial o devedor que, no momento do pedido, exerça regularmente suas atividades há mais de 2 (dois) anos e que atenda aos seguintes requisitos, cumulativamente:
§ 2º No caso de exercício de atividade rural por pessoa jurídica, admite-se a comprovação do prazo estabelecido no caput deste artigo por meio da Escrituração Contábil Fiscal (ECF), ou por meio de obrigação legal de registros contábeis que venha a substituir a ECF, entregue tempestivamente. (Redação dada pela Lei nº 14.112, de 2020).
§ 3º Para a comprovação do prazo estabelecido no caput deste artigo, o cálculo do período de exercício de atividade rural por pessoa física é feito com base no Livro Caixa Digital do Produtor Rural (LCDPR), ou por meio de obrigação legal de registros contábeis que venha a substituir o LCDPR, e pela Declaração do Imposto sobre a Renda da Pessoa Física (DIRPF) e balanço patrimonial, todos entregues tempestivamente. (Incluído pela Lei nº 14.112, de 2020).
§ 4º Para efeito do disposto no § 3º deste artigo, no que diz respeito ao período em que não for exigível a entrega do LCDPR, admitir-se-á a entrega do livro-caixa utilizado para a elaboração da DIRPF.(Incluído pela Lei nº 14.112, de 2020)
§ 5º Para os fins de atendimento ao disposto nos §§ 2º e 3º deste artigo, as informações contábeis relativas a receitas, a bens, a despesas, a custos e a dívidas deverão estar organizadas de acordo com a legislação e com o padrão contábil da legislação correlata vigente, bem como guardar obediência ao regime de competência e de elaboração de balanço patrimonial por contador habilitado.(Incluído pela Lei nº 14.112, de 2020)
Nesta esteira com o advento da presente lei e as respectivas alterações foram flexibilizadas as oportunidades de o produtor rural fazer uso do instituto da recuperação judicial.
Importante destacar que embora o caput do artigo 48, da Lei de regência traga a necessidade de comprovar o exercício regular de suas atividades há mais de 2 (dois) anos, tal entendimento já foi pacificado pelo STJ (Tema Repetitivo 1145) nos casos que se referem a produtor rural, as turmas de direito privado, segundo o Ministro Luis Felipe Salomão, entendem que apesar da necessidade de registro na junta comercial anterior ao pedido de recuperação judicial seja exigência para o pedido, não há exigência legal que determine que esse registro tenha ocorrido dois anos antes do pedido, tendo em vista que mesmo sem ele, o produtor rural exerce atividade profissional organizada para produção de bens e serviços.
A atividade agropecuária pode ser desenvolvida em regime de economia familiar, sem nenhuma organização, bem como pode ser organizada por grandes produtores rurais, em regime de larga escala e mediante o emprego de diversos funcionários. Diante de tão diversas concepções facultou-se ao ruralista, que desenvolve atividade de profissional e habitual agrícola, pecuária ou extrativista vegetal, a faculdade de optar pelo tratamento como empresário[3].
Assim, é legitima a possibilidade do produtor rural pessoa física que exerce atividade rural comprovada por mais de 2 (dois) anos de exercício de atividade, ainda que com prazo de inscrição registral inferior requerer a recuperação judicial.
Dessa forma, tendo em vista que o Brasil é fundamentalmente um país rural, a atividade da empresa rural, seja pequena, média ou grande, é sem dúvida, o grande motor da economia do País[4], no entanto, embora o agronegócio venha crescendo no Brasil, é importante ressaltar que o empresário rural vive em constantes adversidades que abrangem fatores externos quanto internos, e que por vezes permitem a ele não cumprir as obrigações adquiridas, um exemplo claro são as condições climáticas que podem desencadear problemas na safra.
Conforme informação prestada pelo Canal Rural, a combinação de eventos negativos tanto no cenário local quanto no global, como falta ou excesso de chuvas em certas regiões brasileiras e a guerra na Ucrânia, empurrou parte do agronegócio para uma situação preocupa os credores do setor[i].
Em razão disso, o escritório Crippa Rey Advocacia Empresarial, está atento as possibilidades, desenvolvendo estratégias efetivas para crises na atividade rural, a recuperação judicial do produtor rural veio para somar e possibilitar o produtor dar continuidade às suas atividades, com condições benéficas para repactuar suas dívidas e reduzir o seu endividamento, valendo-se de concessões de deságios e alongamento de prazos de pagamento, possibilitando a continuidade da atividade.
Porto Alegra, 03 de novembro de 2022
Guilherme Papke Costa
OAB/RS 127.843
[1] AMPINHO, Sérgio. Falência e Recuperação Judicial. Ed. Saraiva, 8ª edição, 2017. p.37/38.
[2] Art. 47. A recuperação judicial tem por objetivo viabilizar a superação da situação de crise econômico-financeira do devedor, a fim de permitir a manutenção da fonte produtora, do emprego dos trabalhadores e dos interesses dos credores, promovendo, assim, a preservação da empresa, sua função social e o estímulo à atividade econômica.
[3] Sacramone, Marcelo Barbosa. Comentários à lei de recuperação judicial de empresas e falência – 2. ed -São Paulo: Saraiva Educação, 2021. p.720.
[i] https://www.canalrural.com.br/noticias/agricultura/pedidos-recuperacao-judicial-produtores-rurais/#:~:text=Pedidos%20de%20recupera%C3%A7%C3%A3o%20judicial%20est%C3%A3o%20aumentando%20entre%20produtores,-Contexto%20de%20estiagem&text=A%20combina%C3%A7%C3%A3o%20de%20eventos%20negativos,que%20preocupa%20credores%20do%20setor. Acesso em 01/11/2022.
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