MEDIDAS COERCITIVAS ATÍPICAS PREVISTA PELO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL DE 2015

08/03/2021

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Sabe-se que é assegurado ao credor o direito de cobrar o seu crédito do devedor, tendo como possibilidade de ingresso, ante o preenchimento de alguns requisitos, três ações. A Lei Processual Civil prevê a propositura de ação de execução fundada em título executivo extrajudicial, como por exemplo, o cheque, a duplicata, instrumento particular assinado pelo devedor e duas testemunhas, entre outros constantes no artigo 784 do Código de Processo Civil.

 

Além desta, é viável ao credor o ingresso de ação monitória, através de prova escrita sem eficácia de título executiva e a ação de cobrança, utilizada no caso em que as provas documentais são insuficientes ou quando não preenchidos os pressupostos das mencionadas anteriormente.

 

Independentemente de qual meio será utilizado, o credor, para auxiliar na busca pelo seu direito, qual seja, a satisfação do seu crédito, tem como aliado a realização de algumas medidas de pesquisas e penhora de bens. Entre as medidas coercitivas típicas de expropriação temos o bloqueio de valores nas contas (por meio do sistema Sisbajud/Bacenjud), a pesquisa de veículos (pelo Renajud), a inclusão de indisponibilidade em bens imóveis (através do CNIB), a inclusão do nome do devedor em órgãos de restrição ao crédito (SPC/SERASA), entre outros.

 

Contudo, em alguns casos há uma grande dificuldade em encontrar bens dos devedores, uma vez que acabam se desfazendo do seu patrimônio, como por exemplo, colocando imóveis em nome de terceiros, retirando valores das contas bancárias. Assim, muitas vezes, as medidas típicas de execução são inexitosas, porquanto não são encontrados bens ou valores em nome daqueles.

 

Diante dessa dificuldade, o Código de Processo Civil de 2015, previu no Capítulo I, “Dos Poderes, dos deveres e da responsabilidade do Juiz”, do Título IV, a possibilidade dos Magistrados determinarem todas as medidas necessárias (coercitivas, indutivas, mandamentais ou sub-rogatórias), objetivando o cumprimento de uma ordem judicial, que no caso se trata de pagar quantia.[1]

 

Essas medidas são chamadas de “medidas coercitivas atípicas” e tem a finalidade de assegurar o direito do credor de ter o adimplemento do seu crédito. Temos como exemplo destas, utilizadas pelos Juízes, a suspensão da CNH, o bloqueio de cartões de crédito e a apreensão do passaporte do devedor.

 

Ocorre que, a aplicação destas medidas executórias implica na restrição de direitos e garantias fundamentais dos indivíduos devedores e, por este motivo, devem ser utilizadas sob o abrigo dos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade. Quer-se dizer com isso que o credor, para utilizá-las, deve comprovar que elas serão eficazes para o adimplemento do débito e não estão sendo usadas puramente de forma coercitiva.

Conforme se verifica das jurisprudências colacionadas abaixo, o Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul já vem aplicando este instituto jurídico, consoante caso abaixo:

 

AGRAVO DE INSTRUMENTO. DIREITO PRIVADO NÃO ESPECIFICADO. EXECUÇÃO DE TÍTULO EXTRAJUDICIAL. CASO CONCRETO. MATÉRIA DE FATO. PRETENSÃO DE SATISFAÇÃO DE CRÉDITO BUSCADO PELO EXEQUENTE EM FACE DOS EXECUTADOS. INCLUSÃO NO CNIB E SUSPENSÃO DA CNH DOS DEVEDORES. APLICAÇÃO DO ART. 139, IV DO CPC. MEDIDA COERCITIVA ATÍPICA QUE ATENDE AS CIRCUNSTÂNCIAS FÁTICAS DO CASO VERTENTE. MANUNTENÇÃO DA DECISÃO RECORRIDA É MEDIDA ADEQUADA E NECESSÁRIA NO CASO EM TELA. PRECEDENTES JURISPRUDENCIAIS. AGRAVO DE INSTRUMENTO DESPROVIDO. (Agravo de Instrumento, Nº 70084396928, Décima Quinta Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Vicente Barrôco de Vasconcellos, Julgado em: 23-09-2020 – grifado)

 

No caso abaixo, obteve-se a apreensão do passaporte do devedor, sob o fundamento de que ele tentava se eximir da sua obrigação ocultando seus bens e valores, sendo incompatível essa situação comparada com a profissão exercida.

 

Como se vê, restou cumprido os “requisitos” mencionados em julgado pela Ministra Nancy Andrigi, quais sejam, (i) a prévia intimação do devedor para pagar o débito ou apresentar bens passíveis de penhora; (ii) o contraditório prévio; (iii) decisão fundamentada; e (iv) esgotamento das medidas coercitivas típicas. Vejamos abaixo:

 

AGRAVO INTERNO (ART. 1.021, CPC/2015). AGRAVO DE INSTRUMENTO. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. [...] PROCESSUAL CIVIL. CUMPRIMENTO DE SENTENÇA/EXECUÇÃO. MEDIDAS COERCITIVAS ATÍPICAS. APREENSÃO DE PASSAPORTE. ART. 139, IV, CPC/2015. GARANTIAS CONSTITUCIONAIS. PROPORCIONALIDADE. EXCEPCIONALIDADE DA MEDIDA. ADMISSIBILIDADE NO CASO CONCRETO. Caso dos autos em que se mostra viável a aplicação e adoção das medidas coercitivas atípicas do art. 139, IV, do CPC/2015, ainda que reconhecido serem absolutamente excepcionais as situações em que se justifique a adoção de medidas extremas como a aqui adotada, de apreensão de passaporte. Isso porque a justiça não pode prestigiar quem aparentemente oculta bens e renda para se furtar a obrigações legalmente reconhecidas através de decisões transitadas em julgado. No caso concreto, o executado exerce nobre profissão, tendo vendido vultoso imóvel localizado em área nobre desta capital, e atualmente não possui bens registrados em seu nome, nem qualquer numerário em bancos, o que é incompatível com a situação de quem exerce sua profissão. Não tendo havido explicações convincentes a respeito, a presunção inafastável é no sentido do ocultamento de bens e colocação dos mesmos em nome de terceiros. Por outro lado, se realmente é essa sua situação financeira – apenas para argumentar – a apreensão de seu passaporte não lhe trará nenhum prejuízo, pois ele não teria numerário para adquirir passagens para viagem ao exterior, além de estarmos em período de pandemia, com fronteiras fechadas. Precedentes jurisprudenciais do TJRS e do STJ. No REsp 1782418 / RJ, de relatoria da Min. Nancy Andrighi, j. em 23/04/2019, foram fixadas as condições para que se possa determinar medidas extremas, como essa: 1. Prévia intimação do executado para pagar o débito ou apresentar bens destinados a saldá-lo, seguindo-se, como corolário, os atos de expropriação típicos; 2. O contraditório prévio; 3. Decisão devidamente fundamentada, a partir das circunstâncias específicas do caso; 4. Necessidade de esgotamento prévio dos meios típicos de satisfação do crédito exequendo, tendentes ao desapossamento do devedor. No caso presente, todas essas condições estão presentes. Logo, a apreensão do passaporte é justificada, em razão da recalcitrância do devedor em honrar suas obrigações. AGRAVO INTERNO PARCIALMENTE PROVIDO. (Agravo Interno, Nº 70083830513, Nona Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Tasso Caubi Soares Delabary, Redator: Eugênio Facchini Neto, Julgado em: 05-06-2020)

 

Concluiu-se, então, para que seja possível a aplicação das medidas executórias atípicas, deve-se levar em consideração as nuances do caso concreto, sempre fundamentadas no princípio da razoabilidade e da proporcionalidade, na medida em que restringe direitos e garantias constitucionalmente assegurados.

 

O Escritório Crippa Rey Advogados se coloca a inteira disposição para maiores consultas sobre o tema e resolução de dúvidas e casos sobre a matéria.

 

Fernanda Dorneles Silva

OAB/RS 114.546

 

[1] Art. 139. O juiz dirigirá o processo conforme as disposições deste Código, incumbindo-lhe:

[...]

IV - determinar todas as medidas indutivas, coercitivas, mandamentais ou sub-rogatórias necessárias para assegurar o cumprimento de ordem judicial, inclusive nas ações que tenham por objeto prestação pecuniária;


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