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NOVA LEI Nº 14.133/2021 – LICITAÇÕES E CONTRATOS ADMINISTRATIVOS
O escritório Crippa Rey Advogados, sempre atentos às inovações legislativas e regulamentares, vem apresentar informativo quanto a Nova Lei de Licitações e Contratos Administrativos nº 14.133/2021[1], sancionada pelo Presidente da República no último dia 1º de abril de 2021.
Em março do corrente, o Escritório publicou em seu site o informativo trazendo detalhes do Projeto de Lei nº. 4.253/2020[2].
A nova lei substituirá a Lei Geral das Licitações nº 8.666/1993 e Lei do Pregão nº 10.520/2002, bem como o Regime Diferenciado de Contratações/RDC nº 12.462/2011.
A nova Lei entrará em vigor a partir de sua publicação, entretanto, terá a transição de 2 (dois) anos, período em que poderão ser realizadas licitações, contratações nos termos das leis acima referidas.
A Lei prevê a permissão para seguro garantia, a criação do Portal Nacional de Contratações Públicas e, além disso, traz maior transparência aos processos licitatórios e oportunidades para as contratações com o setor público.
A nova lei traz 5 (cinco) modalidades de licitação:
Com exceção da última modalidade, as demais já estavam dispostas nas legislações que estão sendo alteradas, sendo que deixaram de existir as modalidades de convite (que foi transformado em diálogo competitivo), tomadas de preços e RDC.
A modalidade de diálogo competitivo é oriunda do direito europeu e, tem como objetivo a melhor, mais vantajosa relação de qualidade e preço, que envolve critérios qualitativos, ambientais e sociais.
O Portal Nacional de Contratações Públicas irá reunir as informações de licitações e contratações públicas de toda a esfera de governo, isto é, nacional, estadual e municipal.
As licitações ocorrerão nas mesmas formas da antiga Lei do Pregão, acima mencionada:
A nova Lei de Licitações e Contratos Públicos também traz capítulo específico (Capítulo II-B), tratando de crimes em licitações e contratos administrativos, prevendo pena de 4 (quatro) a 8 (oito) anos de reclusão, acrescido de multa.
Ainda, importante destacar que há alterações quanto as dispensas das licitações, a nova dispõe prevê que o processo de contratação direta, isto é, casos de inexigibilidade e de dispensa de licitação.
Os casos de inexigibilidade de licitação estão previstos no art. 74 da Lei:
Da mesma forma, elenca-se abaixo os casos em que haverá dispensa de licitação, conforme art. 75 da Lei:
Diante disso, possível notar que a nova Lei de Licitações e Contratos Públicos apresenta-se de forma mais moderna e transparente, trazendo sensação de maior segurança jurídico nos negócios que serão entabulados com a Administração Pública.
Sendo o que tínhamos para esclarecer e informar no momento, permanecemos atentos às movimentações legislativas quanto ao tema que trará grande significância ao nosso ordenamento jurídico, bem como aos negócios e economia do País e do Mundo, tanto nesse momento de crise enfrentada por muitas empresas em decorrência da Pandemia Mundial, bem como posteriormente ao referido período.
Colocamo-nos, como de costume, à inteira disposição para maiores consultas acerca do tema, complementando informações, debatendo o assunto ou prestando outros esclarecimentos.
Porto Alegre, 09 de abril de 2021.
Equipe de Direito Administrativo
[1] http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2019-2022/2021/lei/L14133.htm
[2] http://www.crippareyadvogados.com.br/publicacao/projeto-de-lei-n-4253+2020:-entenda-as-alteracoes-na-lei-de-licitacoes
A POSSIBILIDADE DE PENHORA DO FUNDO DE PREVIDÊNCIA PRIVADA
O Escritório Crippa Rey Advogados SS, vem muito respeitosamente à presença de Vossas Senhorias, sempre atento às inovações legislativas e regulamentares, apresentar o INFORMATIVO sobre a possibilidade de penhora do fundo de previdência privada, conforme se esclarece abaixo:
O Código de Processo Civil determina que, o patrimônio (bens presentes ou futuros) do devedor poderá ser utilizado para o cumprimento de obrigações inadimplidas, salvo as restrições impostas pela lei[1]. Salienta-se que o ordenamento jurídico brasileiro adota disposições levando em consideração a proteção ao direito do credor de ver adimplida a sua dívida, assim como o princípio da menor onerosidade ao devedor.
Entretanto, não são todos os bens passíveis à penhora, estando vedado pelo Código de Processo Civil a execução daqueles considerados inalienáveis ou impenhoráveis, ou seja, os indicados no artigo 833 do referido Código, assim como em leis extravagantes[2].
Sabe-se que o artigo 833, inciso IV, da Lei Processual, considera impenhorável os proventos de aposentadoria advindos do seguro da Previdência Social e pagos pelo Instituto Nacional do Seguro Social. Contudo, há a possibilidade de complementar àquele benefício ou isoladamente garantir um valor para o atingimento de algum objetivo, através dos fundos de previdência privada.
Como o objetivo deste instituto é o mesmo da aposentadoria paga pelo INSS e é uma escolha feita pelo titular do fundo, o Superior Tribunal de Justiça entende que a impenhorabilidade desses valores deve ser analisada de forma casuística.
Quer-se dizer com isso que é ônus do titular do valor e eventual devedor em processo judicial que tenha essa quantia penhorada, demonstrar através de provas documentais que o valor é utilizado para a subsistência dele e de sua família.
A partir do momento que demonstrada a essencialidade do valor bloqueado, é possível a caracterização da quantia como verba alimentar e, consequentemente, impenhorável.
O Superior Tribunal de Justiça consolidou entendimento determinando que a análise acerca do reconhecimento da impenhorabilidade dos valores penhorados de fundo de previdência privada deve ser realizada caso a caso, com base nos documentos trazidos pela parte. Vejamos abaixo:
AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. EXECUÇÃO DE TÍTULO EXECUTIVO EXTRAJUDICIAL. ART. 1.022 DO CPC/2015. AUSÊNCIA DE CONTRADIÇÃO. SALDO EM FUNDO DE PREVIDÊNCIA PRIVADA. BLOQUEIO DE VALORES APLICADOS EM PREVIDÊNCIA PRIVADA. ALEGAÇÃO DE IMPENHORABILIDADE. NATUREZA ALIMENTAR. AFERIÇÃO. IMPOSSIBILIDADE.
MATÉRIA FÁTICO-PROBATÓRIA. SÚMULA 7/STJ. AGRAVO IMPROVIDO.
1. Consoante a jurisprudência consolidada nesta Corte Superior, cumpre ao magistrado aferir, por meio da análise do caso concreto, a viabilidade ou não da penhora dos valores depositados em fundo de previdência privada complementar (EREsp n. 1.121.719/SP, Relatora Ministra Nancy Andrighi, Segunda Seção, julgado em 12/2/2014, DJe 4/4/2014).
2. A revisão das conclusões estaduais demandaria, necessariamente, o revolvimento do acervo fático-probatório dos autos, providência vedada na via estreita do recurso especial, ante o óbice da Súmula n. 7 do STJ.
3. Agravo interno improvido.
(AgInt no AREsp 1579419/SP, Rel. Ministro MARCO AURÉLIO BELLIZZE, TERCEIRA TURMA, julgado em 30/03/2020, DJe 06/04/2020 – grifado)
Nesse mesmo sentido, é o entendimento do Egrégio Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, qual seja, de que a parte que teve a quantia da previdência privada bloqueada deverá demonstrar que os valores do fundo de previdência privada são utilizados para a sua subsistência e da família, dando a quantia um caráter alimentar, conforme segue abaixo:
APELAÇÃO CÍVEL. REMESSA NECESSÁRIA. EMBARGOS À EXECUÇÃO. EXECUÇÃO FISCAL. BLOQUEIO DE VALORES. PENHORA. CONTA SALÁRIO. VALOR INFERIOR A 40 SALÁRIOS MÍNIMOS. IMPENHORABILIDADE. VERBA DE NATUREZA ALIMENTAR. Segundo entendimento consolidado no Superior Tribunal de Justiça, a possibilidade de penhora sobre valores depositados em fundo de previdência privada complementar deve ser analisada casuisticamente, de modo que somente pode ser autorizada se comprovado que a parte devedora não utiliza o saldo para sua subsistência e de sua família, devido à natureza alimentar do investimento. Hipótese em que o valor que se pretende bloquear é inferior a 40 salários-mínimos, não podendo se afastar o caráter alimentar da quantia, tampouco se verificar, no caso dos autos, a existência de valores superiores ao patamar impenhorável, a existência de saldo, ou mesmo a própria existência de fundo de previdência complementar. Aplicação da nova orientação do Superior Tribunal de Justiça. Inteligência do REsp nº 1.230.060/PR. Precedentes jurisprudenciais. Remessa Necessária. Aplica-se ao caso o disposto no art. 496, II, do Código de Processo Civil, visto que julgados procedentes os embargos à execução. Custas processuais. Os entes públicos, suas autarquias e fundações são isentas das custas processuais, na forma do inc. I do art. 5º da Lei 14.634/2014. Aplicável a referida legislação à espécie, uma vez que a presente ação foi ajuizada em 21.03.2018. APELAÇÃO DESPROVIDA. SENTENÇA REFORMADA EM PARTE, EM REMESSA NECESSÁRIA. UNÂNIME.(Apelação e Reexame Necessário, Nº 70080332828, Vigésima Primeira Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Iris Helena Medeiros Nogueira, Julgado em: 20-02-2019 – grifado)
Concluiu-se então, que o reconhecimento da impenhorabilidade de quantia depositada em fundo de previdência privada dependerá da natureza deste, se alimentar, poderá ter caracterizada àquele instituto.
O Escritório Crippa Rey Advogados se coloca a inteira disposição para maiores consultas sobre o tema e resolução de dúvidas sobre a matéria.
Fernanda Dorneles Silva
OAB/RS 114.546
[1] Artigo 789. O devedor responde com todos os seus bens presentes e futuros para o cumprimento de suas obrigações, salvo as restrições estabelecidas em lei.
[2] BUENO, Cassio Scarpinella. Manual de direito processual civil: volume único. 5.ed. São Paulo: Saraiva Educação, 2019. fl.1059.
Nova Lei cria o crime de perseguição - “stalking”
Ante as diversas mudanças legislativas ocorridas no transcurso do tempo, vimos informar, acerca da publicação da Lei 14.132/2021[i], tipificando o crime de perseguição, também chamado de "stalking".
Aprovada no dia 09 de marco de 2021, a lei traz a inovação judicial sobre o crime, que já era existente na sociedade, porém não disciplinado em diploma legal. Assim sendo, foi inserido o artigo 147-A no Código Penal.
Art. 1º Esta Lei acrescenta o art. 147-A ao Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940 (Código Penal), para prever o crime de perseguição.
Art. 2º O Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940 (Código Penal), passa a vigorar acrescido do seguinte art. 147-A:
“Perseguição
Art. 147-A. Perseguir alguém, reiteradamente e por qualquer meio, ameaçando-lhe a integridade física ou psicológica, restringindo-lhe a capacidade de locomoção ou, de qualquer forma, invadindo ou perturbando sua esfera de liberdade ou privacidade.
Pena – reclusão, de 6 (seis) meses a 2 (dois) anos, e multa.
§ 1º A pena é aumentada de metade se o crime é cometido:
I – contra criança, adolescente ou idoso;
II – contra mulher por razões da condição de sexo feminino, nos termos do § 2º-A do art. 121 deste Código;
III – mediante concurso de 2 (duas) ou mais pessoas ou com o emprego de arma.
§ 2º As penas deste artigo são aplicáveis sem prejuízo das correspondentes à violência.
§ 3º Somente se procede mediante representação.”
Art. 3º Revoga-se o art. 65 do Decreto-Lei nº 3.688, de 3 de outubro de 1941 (Lei das Contravenções Penais).
Art. 4º Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.
Dessa forma, a partir do dia 31 de março de 2021, data de publicação da lei, é crime perseguir uma pessoa, seguidamente, independente do meio (físico ou virtual), ameaçando a integridade física ou psíquica do perseguido, restringindo a sua locomoção, ou apenas perturbando, ou invadindo a privacidade.
Assim, todos aqueles que ameaçarem a individualidade de uma pessoa perseguindo-a, interferindo na sua liberdade, ou violando a sua privacidade, de modo ameaçador, cometerão o crime de perseguição.
De acordo com o texto, tentativas persistentes de aproximação física, recolhimento de informação sobre terceiro, envio repetido de mensagens, bilhetes, e-mails e aparições nos locais frequentados pela vítima passam a ser punidos com pena de prisão que vai de seis meses a dois anos, além de multa.[ii]
Outro importante ponto, é que quando o crime for cometido contra crianças, mulheres, idosos (pessoas entendidas como mais vulneráveis), ou ainda quando a ameaça for realizada pelo uso de arma de fogo, o crime poderá ter a sua pena aumentada.
Ainda, mister salientar que, a pena relacionada a esse crime será aplicada independentemente das penas que envolvem os crimes de violência, conferindo ainda mais proteção às vítimas.
Sendo o que tínhamos para informar-lhes, permanecemos à disposição para esclarecimentos e maiores elucidações esta seara de crimes.
Ellen Martins
OAB/RS 100.719
[i] http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2019-2022/2021/Lei/L14132.htm
[ii] [ii] https://www.conjur.com.br/2021-abr-01/bolsonaro-sanciona-lei-tipifica-crime-stalking
A NÃO INCIDÊNCIA DO IMPOSTO DE RENDA SOBRE OS JUROS DE MORA INCIDENTES SOBRE VERBAS PREVIDENCIÁRIAS E SALARIAS RECEBIDAS EM ATRASO
O escritório Crippa Rey Advogados, sempre atento à debates inovadores, vem apresentar um breve informativo sobre o julgamento Tema nº 808 do Supremo Tribunal Federal – Leading Case: Recurso Extraordinário nº 855091, no âmbito de repercussão geral, onde ficou reconhecida a não incidência do Imposto de Renda sobre os juros de mora incidentes sobre as verbas salariais e previdenciárias recebidas em atraso.
O caso em tela originou-se pela Interposição de Recurso Extraordinário em face da decisão proferida pelo Tribunal Regional da 4ª Região, nos autos de Incidente de Arguição de Inconstitucionalidade, reconhecendo a inconstitucionalidade por não recepção pela Constituição Federal de 1988, do Art. 16, §único da Lei nº 4.506/1964[1], declarando, assim, a inconstitucionalidade, sem redução de texto, do § 1º do Art. 3º da Lei nº 7.713/88[2], art. 16, § único, da Lei 4.506/64 e art. 43, inciso II e parágrafo 1º do Código Tributário Nacional[3].
EMENTA
ARGUIÇÃO DE INCONSTITUCIONALIDADE. TRIBUTÁRIO. IMPOSTO DE RENDA SOBRE JUROS DE MORA. NÃO RECEPÇÃO DO ART. 16, § ÚNICO, DA LEI N. 4.506/64 PELA CF/88. INCONSTITUCIONALIDADE, SEM REDUÇÃO DE TEXTO, DO § 1º DO ART. 3º DA LEI Nº 7.713/88, DO ART. 16, § ÚNICO, DA LEI Nº. 4.506/64, E DO ART. 43, INCISO II E § 1º, DO CTN (LEI Nº 5.172/66), POR AFRONTA AO INCISO III DO ART. 153 DA CF/88.
1. O art. 16, § único, da Lei nº 4.506/64, ao tratar como 'rendimento de trabalho assalariado os juros de mora e quaisquer outras indenizações pelo atraso no pagamento das remunerações previstas neste artigo', contraria, frontalmente, o disposto no inciso III do art. 153 da CF/88, que é taxativo em só permitir a incidência do imposto de renda sobre 'renda e proventos de qualquer natureza'. Juros moratórios legais são detentores de nítida e exclusiva natureza indenizatória, e portanto não se enquadram no conceito de renda ou proventos. Hipótese de não-recepção pela Constituição Federal de 1988.
2. Inconstitucionalidade do art. 43, inciso II e § 1º, do CTN (Lei nº 5.172/66), sem redução de texto, originada pela interpretação que lhe é atribuída pelo Superior Tribunal de Justiça - STJ, com efeito vinculante, de forma a autorizar que sobre verba indenizatória, in casu os juros de mora legais, passe a incidir o imposto de renda.
3. Inconstitucionalidade sem redução de texto reconhecida também com relação ao § 1º do art. 3º da Lei nº 7.713/88 e ao art. 43, inciso II e § 1º, do CTN (Lei nº 5.172/66).
4. Os juros legais moratórios são, por natureza, verba indenizatória dos prejuízos causados ao credor pelo pagamento extemporâneo de seu crédito. A mora no pagamento de verba trabalhista, salarial e previdenciária, cuja natureza é notoriamente alimentar, impõe ao credor a privação de bens essenciais, podendo ocasionar até mesmo o seu endividamento a fim de cumprir os compromissos assumidos. A indenização, por meio dos juros moratórios, visa à compensação das perdas sofridas pelo credor em virtude da mora do devedor, não possuindo qualquer conotação de riqueza nova a autorizar sua tributação pelo imposto de renda.[4]
Mencionados dispositivos reconheciam a natureza salarial dos juros de mora incidentes nos valores pagos em atraso em atraso de verbas salariais e previdenciárias percebidas por pessoas físicas. O Tribunal entendeu que o art. 16 da Lei 4.506/64, ao tratar 'rendimento de trabalho assalariado os juros de mora e quaisquer outras indenizações pelo atraso no pagamento das remunerações previstas neste artigo', estaria contrariando o art. 153, III da Constituição Federal[5], tendo em vista que tais verbas não se enquadram no conceito de renda ou proventos:
O dispositivo constitucional retro mencionado, consoante destacado pela Relatora, é taxativo ao reconhecer a incidência do Imposto de Renda apenas sobre os rendimentos ou proventos da pessoa natural, sendo certo que, ao contrário do que dispunham os dispositivos infraconstitucionais, cuja inconstitucionalidade fora reconhecida, os juros de mora têm natureza exclusivamente indenizatória e, portanto, sobre eles não é possível incidir o IR.
Acerca do conceito de renda e proventos, válido mencionar que, para Paulo de Barros Carvalho, três são as teorias que abordam o conceito de “renda”, sendo certo que a teoria adotada pelo Brasil, teoria do acréscimo patrimonial, que dispõe tratar-se a renda[6]:
(...) “renda” é todo o ingresso líquido, em bens materiais, imateriais ou serviços avaliáveis em dinheiro, periódico, transitório ou acidental, de caráter oneroso ou gratuito, que importe em um incremento líquido de patrimônio de determinado indivíduo, em certo período de tempo.
Sendo assim, os valores provenientes de verbas de natureza indenizatória (hipótese que, segundo o julgamento em análise, se enquadram os juros), não podem ser consideradas como renda e, por consequência, não devem ser oferecidas à tributação, já que representam a recomposição de prejuízos subjetivos, não se caracterizando, portanto, acréscimos patrimoniais.
Ainda, com relação aos juros de mora, consoante exposto pela Relatora do Incidente recorrido, estes representam indenização dos prejuízos sofridos pelo credor, em decorrência do atraso no pagamento do seu crédito, estando tal verba conceituada no art. 404 do Código Civil Brasileiro, abaixo colacionado:
Art. 404. As perdas e danos, nas obrigações de pagamento em dinheiro, serão pagas com atualização monetária segundo índices oficiais regularmente estabelecidos, abrangendo juros, custas e honorários de advogado, sem prejuízo da pena convencional.
Parágrafo único. Provado que os juros da mora não cobrem o prejuízo, e não havendo pena convencional, pode o juiz conceder ao credor indenização suplementar.
Acerca dos juros de mora incidentes sobre as verbas trabalhistas, salariais e previdenciárias, assim manifestou-se a Desembargadora Relatora:
A mora no pagamento de verba trabalhista, salarial e previdenciária, cuja natureza é notoriamente alimentar, impõe ao credor a privação de bens essenciais, podendo ocasionar até mesmo o seu endividamento a fim de cumprir os compromissos assumidos. A indenização, por meio dos juros moratórios, visa à compensação das perdas sofridas pelo credor em virtude da mora do devedor. Essa verba, portanto, não possui qualquer conotação de riqueza nova, a autorizar sua tributação pelo imposto de renda.[7]
Destaca-se que, a respeito do Tema, a Corte Suprema já havia se manifestado, administrativamente, de forma convergente ao suscitado no acórdão recorrido, verificando, da mesma forma, a natureza indenizatória dos juros de mora:
1) Processo nº 323.526 - referendar, por unanimidade, o entendimento adotado pela Secretaria do Tribunal quanto à natureza indenizatória do pagamentos aos servidores do STF de juros de mora sobre a diferença da URV (11,98). O tema foi relatado pela Ministra Carmem Lúcia, que fundamentou seu voto na decisão da Corte no MS 25.641-9, julgado pelo Plenário do Tribunal em 22/11/2007.
(Presentes os Ministros Ellen Gracie, Celso de Mello, Gilmar Mendes, Cezar Peluso, Carlos Britto, Ricardo Lewandowski, Cármen Lúcia e Menezes Direito. Ausentes, justificadamente, os Ministros Marco Aurélio, Joaquim Barbosa e Eros Grau)
Assim, quando do julgamento do Recurso Extraordinário interposto pela União, a Corte entendeu que a incidência do Imposto de Renda tem como premissa o acréscimo do patrimônio, sendo certo que os juros de mora, por sua vez, não representam acréscimo patrimonial e sim, recomposição de prejuízo sofrido pelo credor em virtude do atraso no pagamento de seu crédito e, diante disso, não atendidos os requisitos mínimos de materialidade do Imposto de Renda, impostos pelo art. 153, II da CF88.
Para o relator do feito, Ministro Dias Toffoli, o artigo cuja inconstitucionalidade fora reconhecida não foi recepcionado pela Constituição Federal, de forma que não é possível atribuir natureza salarial aos juros de mora, já que tal verba existe para compensar, indenizar, um prejuízo sofrido:
“Nos termos do artigo 153, III, da Constituição compete à União instituir imposto sobre renda e proventos de qualquer natureza — IR", explica o ministro. "A doutrina especializada e a jurisprudência da Corte, no que tange à interpretação do dispositivo, têm firme orientação de que a materialidade do tributo está relacionada à existência de acréscimo patrimonial, aspecto ligado às ideias de renda e de proventos de qualquer natureza, bem como ao princípio da capacidade contributiva.”
O relator suscitou, ainda, o entendimento exarado pelo doutrinador Hugo de Brito Machado, que assim leciona:
“O Código Civil de 1916 estabelecia que as perdas e danos, nas obrigações de pagamento em dinheiro, consistem nos juros de mora e custas, sem prejuízo da pena convencional. E o Código Civil vigente estabelece: ‘Art. 404. As perdas e danos, nas obrigações de pagamento em dinheiro, serão pagas com atualização monetária segundo índices oficiais regularmente estabelecidos, abrangendo juros, custas e honorários de advogado, sem prejuízo da pena convencional. Parágrafo único. Provado que os juros da mora não cobrem o prejuízo, e não havendo pena convencional, pode o juiz conceder ao credor indenização suplementar.’ Como se vê, o legislador previu que o não recebimento nas datas correspondentes dos valores em dinheiro aos quais se tem direito Plenário Virtual - minuta de voto - 05/03/2021 00:00 12 implica prejuízo. E o fez com absoluto acerto, pois é natural que as pessoas planejem suas finanças pessoais considerando o que devem pagar e o que têm direito de receber em determinadas datas. Assim, se alguém deixa de receber o que lhe é devido, pode deixar de comprar à vista e ser obrigado a comprar a prazo, pagando um preço mais elevado, configurando desta forma evidente perda patrimonial. E pode também ser obrigado a pagar com atraso uma dívida, tendo de pagar multa e juros de mora, o que também configura perda patrimonial. Não se trata de lucro cessante, nem de simplesmente dano moral, que evidentemente também podem ocorrer. Trata-se de perda patrimonial efetiva, decorrente do não recebimento, nas datas correspondentes, dos valores aos quais tinha direito. Perda que o legislador presumiu e tratou como presunção absoluta, que não admite prova em contrário, e cuja indenização com os juros de mora independe de pedido do interessado. Ressalte-se que o legislador previu a possibilidade de serem as perdas efetivas de montante maior do que os juros de mora, e por isto mesmo determinou que, se isto acontecer e não houver pena convencional, o juiz pode conceder ao credor prejudicado indenização complementar” (Não incidência do imposto de renda sobre juros de mora. Revista Dialética de Direito Tributário.”
Desta feita, entendeu o Ministro Dias Toffoli ser necessário realizar a diferenciação entre as categorias de verbas indenizatórias, observando quais representam, de fato, acréscimo patrimonial, e quais representam mera recomposição de um prejuízo, tendo a Corte Suprema fixado a seguinte tese: "Não incide imposto de renda sobre os juros de mora devidos pelo atraso no pagamento de remuneração por exercício de emprego, cargo ou função".
Válido referir que o julgamento realizado, conforme anteriormente referido, afeta três dispositivos legais, sendo certo que, no tocante aos artigos 3º, §1º da Lei nº 7.713/88 (que dispõe sobre o conceito de rendimento bruto) e 43, II e §1º, do Código Tributário Nacional (que refere quais os rendimentos passiveis da incidência do IR), estes deverão ser interpretados em conformidade com o texto Constitucional, de maneira a excluir da hipótese de incidência do IR sobre os juros de mora.
Por fim, ressaltamos que o Tema nº 803 do Supremo Tribunal Federal – Leading Case: Recurso Extraordinário nº 855091, foi julgado no âmbito da repercussão geral, portanto, a decisão deverá ser seguida/aplicada pelas instâncias inferiores da Justiça (Juízes de 1º grau e Tribunais de Justiças de Estado e Tribunais Regionais Federais).
O Escritório Crippa Rey Advogados está à disposição para orientá-los, bem como para sanar quaisquer dúvidas existentes envolvendo o debate.
Porto Alegre, 31 de março de 2021.
Anne Riegel
OAB/RS 118.242
[1] Art. 16. Serão classificados como rendimentos do trabalho assalariado tôdas as espécies de remuneração por trabalho ou serviços prestados no exercício dos empregos, cargos ou funções referidos no artigo 5º do Decreto-lei número 5.844, de 27 de setembro de 1943, e no art. 16 da Lei número 4.357, de 16 de julho de 1964, tais como: Parágrafo único. Serão também classificados como rendimentos de trabalho assalariado os juros de mora e quaisquer outras indenizações pelo atraso no pagamento das remunerações previstas neste artigo.
[2] Art. 3º O imposto incidirá sobre o rendimento bruto, sem qualquer dedução, ressalvado o disposto nos arts. 9º a 14 desta Lei. (Vide Lei 8.023, de 12.4.90: § 1º Constituem rendimento bruto todo o produto do capital, do trabalho ou da combinação de ambos, os alimentos e pensões percebidos em dinheiro, e ainda os proventos de qualquer natureza, assim também entendidos os acréscimos patrimoniais não correspondentes aos rendimentos declarados.
[3] Art. 43. O imposto, de competência da União, sobre a renda e proventos de qualquer natureza tem como fato gerador a aquisição da disponibilidade econômica ou jurídica: II - de proventos de qualquer natureza, assim entendidos os acréscimos patrimoniais não compreendidos no inciso anterior. § 1o A incidência do imposto independe da denominação da receita ou do rendimento, da localização, condição jurídica ou nacionalidade da fonte, da origem e da forma de percepção. (Incluído pela Lcp nº 104, de 2001)
[4]TRF4 - Arguição de Inconstitucionalidade nº 5020732-11.2013.4.04.0000: Relatora Desembargadora Luciane Amaral Corrêa Münch: Data do Julgamento 24/10/2013: Segunda Turma: Data da Publicação: 30/10/2013
[5] Art. 153. Compete à União instituir impostos sobre: III - renda e proventos de qualquer natureza;
[6] CARVALHO, Paulo de Barros. Direito Tributário: Linguagem e Método. 4ª edição. São Paulo: Editora Noeses, 2011. P. 677
[7] TRF4 - Arguição de Inconstitucionalidade nº 5020732-11.2013.4.04.0000: Relatora Desembargadora Luciane Amaral Corrêa Münch: Data do Julgamento 24/10/2013: Segunda Turma: Data da Publicação: 30/10/2013
Aspectos da Lei 14.112/2020 sobre DIP Financing durante a Recuperação Judicial
Depois de 15 anos de vigência, a Lei n. 11.101/2005 que regula a Recuperação Judicial, a Extrajudicial e a Falência do empresário e da sociedade empresária, passou por uma recente e importante mudança, em diversos aspectos.
Publicamos em nosso site, no dia 15/02/2021, importante informativo sobre “As principais alterações da Lei 14.112/2020 no âmbito da Recuperação Judicial”, escrito pela Advogada e Coordenadora do Departamento de Recuperações Judiciais, Adriana Dusik Angelo.
Como bem destacado naquela oportunidade, o chamado DIP Financing, antes da reforma, previa somente garantias de natureza fiduciária, e com as alterações trazidas pela Lei 14.112/2020, é possível haver inclusive garantias subordinadas.
Nesta esteira, o presente informativo buscará enfatizar aspectos sobre o financiamento durante a recuperação judicial, destacando ainda, os pontos mais significativos quanto a este instrumento, como por exemplo, quando a autorização judicial se faz, ou não, necessária para perfectibilização dos negócios entre a empresa recuperanda e a instituição financeira.
O DIP Financing, foi extraído do princípio debtor-in-possession, que significa, segundo Geraldo Fonseca de Barros Neto: “financiamento do devedor mantido na atividade empresarial”.[1]
Daniel Carnio e Alexandre Nasser, explicam que nesta modalidade de financiamento a posse do bem se mantém com a recuperanda, e ainda os administradores permanecem com o controle dos bens ou direitos dados em garantia.
"Nesta modalidade de financiamento, a recuperanda mantém a posse e controle dos bens ou direitos dados em garantia, para que a empresa possa se manter operante. Com isso, é possível suprir a falta de fluxo de caixa para cobrir as despesas operacionais, de reestruturação e de preservação do valor dos ativos[2]".
A Lei 14.112/2020 inseriu no texto recuperacional a Seção IV-A, e seus artigos 69-A ao 69- F, os quais tratam especificamente do Financiamento do Devedor e do Grupo Devedor durante a Recuperação Judicial.
Vale salientar que houve um grande esforço do legislador para que houvesse um incentivo ao investidor para financiar empresas em recuperação.
Importante destacar que neste caso o financiador, de acordo com o Art. 69-E, poderá ser qualquer pessoa, inclusive credores, sujeitos ou não à recuperação, e ainda, poderão ser familiares, sócios e integrantes do grupo do devedor
A questão central contida nas disposições do novo texto legal, é, quando será preciso requerer a autorização judicial, a fim de concretizar o financiamento junto as instituições?
Segundo Fábio Ulhoa Coelho, para respondermos esta questão, é preciso verificar as disposições do art. 69-A, pois, somente nessas hipóteses, a autorização judicial será obrigatória.
Contudo, se o financiamento das atividades tiver como garantia a cessão fiduciária de recebíveis, o penhor de safra, a caução de títulos ou a oneração que recaia sobre estoque, ou até mesmo créditos e insumos de titularidade da devedora, não será preciso haver autorização judicial para esses casos.[3]
Neste sentido, deve-se observar que, após ser distribuído o pedido de recuperação judicial, o devedor não poderá alienar ou onerar os bens ou direitos de seu ativo não circulante, sem a prévia autorização judicial.[4]
Chama atenção, a disposição contida no art. 69-C, o qual contempla a figura da garantia subordinada sobre direito real, juiz poderá autorizar a constituição de uma nova garantia em bem já gravado, sem que haja a anuência do detentor da garantia original.
Apesar de ser aplicada somente aos direitos reais de garantia, a possibilidade trazida pelo art. 69-C, servirá como uma nova forma de favorecer o financiador, e incentivar o financiamento para empresas que buscam seu soerguimento.
Outra mudança trazida pela nova norma, foi a alteração na ordem de pagamento, ficando estabelecido que em casos em que houver convolação em falência, o crédito do financiador terá preferência.
Antes da reforma, o crédito do financiador estava em 5º lugar na ordem estipulada no art. 84 da LREF, com a reforma, créditos com essa natureza, irão ser pagos antes dos créditos extraconcursais, com exceção dos créditos relativos à administração da falência, e, ainda créditos de natureza trabalhistas[5].
Diante dos efeitos da pandemia no Brasil, que afetou diretamente o cenário econômico, o legislador buscou avançar nestes aspectos, a fim de minimizar os prejuízos causados às empresas em situação de crise, sobre tudo, tornar mais atrativo aos investidores, o financiamento de empresas em recuperação.
O Escritório Crippa Rey Advogados coloca-se ao dispor para sanar eventuais dúvidas existentes sobre o tema.
Carolina Rodrigues
Bacharela de Direito
[1] BARROS NETO, Geraldo Fonseca de. Reforma da Lei de Recuperação Judicial e Falência - Comentada e Comparada. Grupo GEN, 2021, pg. 124.
[2] COSTA, Daniel Carnio; MELO, Alexandre Nasser. Comentários à Lei de Recuperação de Empresas e Falência, Editora Juruá, Curitiba, 2021. Pág. 193.
[3] COELHO, Fábio Ulhoa. Cometários à Lei de Falências e de Recuperação de Empresas. Lei 14.112/2020, Nova Lei de Falências. 14ªed, Revista dos Tribunais.
[4] Art. 66. Após a distribuição do pedido de recuperação judicial, o devedor não poderá alienar ou onerar bens ou direitos de seu ativo não circulante, inclusive para os fins previstos no art. 67 desta Lei, salvo mediante autorização do juiz, depois de ouvido o Comitê de Credores, se houver, com exceção daqueles previamente autorizados no plano de recuperação judicial.
[5] Art. 84. Serão considerados créditos extraconcursais e serão pagos com precedência sobre os mencionados no art. 83 desta Lei, na ordem a seguir, aqueles relativos:
(...) I-A - às quantias referidas nos arts. 150 e 151 desta Lei
I-B - ao valor efetivamente entregue ao devedor em recuperação judicial pelo financiador, em conformidade com o disposto na Seção IV-A do Capítulo III desta Lei;
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