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O STF DECIDE QUE AS TAXAS DE CARTÕES DE CRÉDITO E DÉBITO INTEGRAM A BASE DE CÁLCULO DE PIS E COFINS (Tema 1024 – Em repercussão Geral)
O escritório Crippa Rey Advogados, atentos às inovações legislativas e regulamentares, vem apresentar informativo do julgamento do Tema 1024 ocorrido em setembro deste ano, referente o Recurso Extraordinário (RE) da Suprema Corte, em Repercussão Geral, acerca da exclusão das taxas de cartões de débito e crédito da base de cálculo do PIS e da COFINS.
O Relator do referido recurso, o Ministro Marco Aurélio, fora vencido e restara prevalecido o entendimento de que é constitucional a inclusão na base de cálculo das contribuições do PIS e da COFINS do valor retido pelas administradoras de operações financeiras de crédito e débito por constituírem custo operacional, ensejando como faturamento da empresa.
No entanto, uma sentença da Seção Judiciária de São Paulo apreciou caso análogo, gerando confusão, de que tal posicionamento fosse contrário àquele sedimentado, com repercussão geral, pelo Supremo. Porém, são discussões diferentes. Explicamos.
A referida sentença “polêmica” e favorável aos contribuintes, foi proferida pela 14ª Vara Federal de São Paulo, nos autos do Mandado de Segurança de nº 5024180-42.2019.4.03.6100. [1]A Magistrada Tatiana Pattaro Pereira, decidiu no sentido de que as referidas taxas devam ser enquadradas como insumos, tendo em vista a sua essencialidade. Lembrando que insumos são créditos gerados pelas contribuições da PIS e COFINS, que por sua vez, no caso em tela, reduzem o valor a ser recolhido no momento da apuração do valor retido da referida operação financeira. [2]
Assim, o debate no Supremo Federal versava sobre inclusão em base de cálculo, enquanto, a referida sentença acima aborda a questão dos insumos.
Nesse sentido colacionamos parte da sentença:
“STJ definiu insumo como sendo toda despesa essencial ou, ao menos, relevante ao desenvolvimento da atividade econômica, para efeito de apropriação de créditos relativos aos PIS e à COFINS decorrentes da não cumulatividade dessas contribuições”… Portanto, nos termos do quanto decidido pelo E. STJ, e considerando a atividade econômica desenvolvida pela impetrante de acordo com seu objeto social (comercialização de produtos para pessoas físicas e jurídicas através de e-commerce, comércio atacadista e varejista de mercadorias de diversas variedades), entendo que as despesas com taxas de cartão de crédito incorridas pela impetrante devem ser consideradas como insumos, pois são essenciais, ou ao menos relevantes, para a atividade da Impetrante”. [3]
Lembrando que a questão dos insumos no PIS/COFINS também foi debate de muitos anos no CARF, e o STJ veio a “sedimentar” a matéria (sem no entanto, efetivamente solucionar), em 2018.[4]
Importante ressalvar que o posicionamento apresentado pela Magistrada de São Paulo é excepcionalidade, não sendo decisão definitiva, mas, traz importante avanço quanto aos custos operacionais de taxas de cartões de crédito e débito.
Sendo o que tínhamos para informar no momento, o Escritório Crippa Rey Advogados fica à disposição para maiores esclarecimentos.
[1]Disponível em – https://portal.stf.jus.br/noticias/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=451643&ori=1 – Acesso em 15 de outubro de 2020.
[2]Disponível em – https://portal.stf.jus.br/noticias/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=451643&ori=1- Acesso em 15 de Outubro de 2020.
[3] Disponível em – https://portal.stf.jus.br/noticias/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=451643&ori=1- Acesso em 15 de Outubro de 2020
[4] A Primeira Seção definiu que "o conceito de insumo deve ser aferido à luz dos critérios de essencialidade ou relevância, ou seja, considerando-se a imprescindibilidade ou a importância de determinado item - bem ou serviço - para o desenvolvimento da atividade econômica desempenhada pelo Contribuinte" (REsp 1.221.170/PR, repetitivo, Rel. Ministro Napoleão Nunes Maia Filho, Primeira Seção, DJe 24/4/2018).
A RAZOABILIDADE E PROPORCIONALIDADE NO PROCESSO DA JUSTIÇA DO TRABALHO COM BASE EM JULGAMENTO RECENTE DO TRIBUNAL SUPERIOR DO TRABALHO
Em recente julgamento no Tribunal Superior do Trabalho, de 09 de setembro de 2020, autos n.º 1000691-46.2015.5.02.0242, trouxe a baila novamente a discussão quanto a razoabilidade e proporcionalidade no processo trabalhista.
Um processo na justiça do trabalho, em geral, tem diversos estigmas. Com a massificação de ações protocoladas na Justiça Trabalhista, é comum que algumas decisões peculiares, de difícil compreensão aos que não são familiarizados com o Direito possam acontecer, seja para empregadores ou empregados.
O processo trabalhista diz respeito a litígios derivados das relações de trabalho, e como toda relação humana, é complicadíssima. À parte das regras objetivas que podem acabar sendo objeto de discussão, como verbas rescisórias, há a possibilidade de discutir-se questões que vão além do patrimônio devido ao empregado, onde ele pode requerer indenização em virtude de algum dano físico ou psicológico que lhe tenha ocorrido, o que chamamos de dano extrapatrimonial. E nessas situações o empregador pode se sentir apreensivo quanto o resultado do julgamento. E é quanto a isso que vamos esclarecer alguns pontos.
Um processo judicial, independente da sua área, é regido por algumas normas jurídicas estabelecidas pela lei ou pela jurisprudência. E um princípio aplicável aos julgamentos é o da “razoabilidade e proporcionalidade”. Significa dizer que o juiz trabalhista, ao deparar-se com situação em que se convença da existência do dano extrapatrimonial ao empregado, deve julgar a empresa empregadora pautando-se pela sua possibilidade financeira e a extensão do dano.
A doutrina brasileira costuma observar ambos os aspectos de forma conjunta, mas há diferenças entre eles. A proporcionalidade compreende uma estrutura racional bem definida, através da observância de três regras que devem estruturar o argumento. São elas a adequação, a necessidade e a proporcionalidade em sentido estrito. A “adequação” se refere a uma decisão que deve enfrentar diretamente o problema em análise. A “necessidade” se infere da escolha entre duas ou mais possibilidades que sejam adequadas, escolhendo-se aquela que tenha menos efeitos em outros direitos correlatos ao caso. E a “proporcionalidade de sentido estrito” se dá na gradação, na medida de aplicação de determinada norma, como o valor de uma multa, por exemplo. Já a razoabilidade é um conceito mais abstrato, se refere a um dever de equivalência entre a medida adotada e o critério estabelecido como pressuposto para sua adoção.[1]
Vejamos o exemplo deste recente caso julgado pelo Tribunal Superior do Trabalho (TST), onde um empregado que trabalhava como auxiliar de manipulação de remédios desenvolveu um grave linfoma. A empresa farmacêutica fornecia devidamente os equipamentos de proteção, contudo, o empregado desenvolveu a doença por um suposto ponto falho nas suas luvas. Em virtude disso, a empresa foi condenada a indenizá-lo na quantia de R$ 150.000,00 (cento e cinquenta mil reais). Acontece que o empregado recebeu tratamento e curou-se, sem sequelas ou qualquer incapacidade laborativa. Quando o caso chegou em recurso ao TST, o julgamento baseou-se na razoabilidade e proporcionalidade para reduzir o valor indenizatório para R$ 30.000,00 (trinta mil reais). Nas palavras do próprio Ministro relator:
“Sobre o valor a ser atribuído à indenização por dano imaterial, cabe ao órgão judicante, pautar-se pela razoabilidade e proporcionalidade na estipulação, evitando-se: de um lado, um valor exagerado e exorbitante; de outro, um valor tão baixo que seja irrisório e desprezível.(…) Na hipótese em exame, entendo que o valor de R$ 150.000,00 (cento e cinquenta mil reais) arbitrado a título de dano moral revela-se exorbitante. Isso porque, embora a doença que acometeu o Autor seja inquestionavelmente grave, é também incontroverso que o Reclamante recebia “EPI’s adequados”, que “a evolução do tratamento resultou em cura” e que não há incapacidade para o trabalho (fls. 924/926). Assim, ao meu juízo, considerando-se o dano experimentado pelo Reclamante, o grau de culpa e as circunstâncias do caso, a quantia arbitrada mostra-se desarrazoada.” [2]
Daí a essencialidade da boa assistência jurídica às empresas, para que se demonstre a realidade dos fatos em processos trabalhistas, que fatalmente ocorrerão pela própria complexidade das relações de trabalho, e manter o julgamento adequado às normas fundamentais de nosso sistema jurídico.
[1] O juiz de direito Fabio Henrique Falcone Garcia do estado de São Paulo resume a discussão acerca da diferença entre razoabilidade e proporcionalidade no artigo disponível em: https://bdjur.stj.jus.br/jspui/handle/2011/112201
[2] O processo foi julgado pela 4ª Turma do TST, com Relatoria do Ministro Alexandre de Luiz Ramos, com número 1000691-46.2015.5.02.0242.
A IMPENHORABILIDADE DO BEM DE FAMÍLIA E A RELATIVIZAÇÃO DESTE INSTITUTO PELO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
O Escritório Crippa Rey Advogados SS, vem muito respeitosamente à presença de Vossas Senhorias, sempre atento às inovações legislativas e regulamentares, apresentar o ARTIGO sobre a impenhorabilidade do bem de família e a relativização deste instituto jurídico, conforme se esclarece abaixo:
O Código de Processo Civil determina que, o patrimônio (bens presentes ou futuros) do devedor poderá ser utilizado para o cumprimento de obrigações inadimplidas, salvo as restrições impostas pela lei[1]. Salienta-se que o ordenamento jurídico brasileiro adota disposições, levando-se em consideração a proteção ao direito do credor de ver adimplida a sua dívida, assim como o princípio da menor onerosidade ao devedor.
Entretanto, não são todos os bens passíveis à penhora, estando vedado pelo Código de Processo Civil a execução daqueles considerados inalienáveis ou impenhoráveis, ou seja, os indicados no artigo 833 do referido Código, assim como em leis extravagantes[2]. Nesse momento, abordar-se-á uma dessas exceções prevista tanto na Lei Processual Civil[3], como na Lei nº 8.009/90[4], qual seja, a impenhorabilidade do bem de família.
O bem de família é aquele imóvel urbano ou rural, no qual há formação de uma residência, com a finalidade de moradia pela entidade familiar, seja ela constituída através do casamento, união estável, entidade monoparental, etc. Quer-se dizer com isso que o bem de família é um direito – que não se confunde com a propriedade em si – e é amplamente protegido, sendo uma ferramenta de proteção ao direito fundamental da moradia previsto pela Constituição Federal.
O artigo 1º da Lei nº 8.009/90, determina que o imóvel residencial é impenhorável, não podendo ser objeto para a satisfação de qualquer tipo de dívida, seja ela fiscal, previdenciária, civil ou de qualquer outra natureza. Tal impenhorabilidade abarca a construção do imóvel, as plantações, benfeitorias e equipamentos. Já o Código de Processo Civil define que são impenhoráveis todos aqueles móveis pertencentes à residência do devedor, excluindo-se os de valor vultuoso.
Assim, compreende-se que não é só o imóvel considerado bem de família que é impenhorável, mas também tudo que nele se encontra e pertence.
Contudo, a Terceira e a Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça já decidiram sobre a possibilidade da penhora do bem de família dado em garantia fiduciária. Com isso, tivemos a relativização desse instituto, na medida em que foi entendido pelos Ministros que o bem de família dado em garantia fiduciária, voluntariamente, afasta essa proteção.
Ante esse entendimento, pode-se afastar a impenhorabilidade desse instituto quando confrontado com o princípio da boa-fé, prevalecendo a vontade livre das partes. Isso porque, quando há composição de um negócio jurídico, com alienação fiduciária, o devedor fiduciante transmite a sua propriedade ao credor fiduciário por ato de disposição de vontade.
A Corte Superior tem entendido, em alguns casos, pela validade da cláusula contratual da alienação fiduciária, prevista em contrato. Assim, importante registrar que esse instituto é analisado de forma casuística, isto é, levando-se em consideração as particularidades do caso concreto.
Analisando alguns julgados do Superior Tribunal de Justiça, verifica-se que a proteção dada ao bem de família não pode ensejar na sua inalienabilidade, ou seja, é possível que o proprietário do bem o utilize para garantir eventual dívida, alienando-o fiduciariamente. Todavia, estando o devedor fiduciante ciente dos termos contratuais e da garantia ofertada, não há como afastar a validade do acordo de vontades quando da efetivação do negócio jurídico.
Importante salientar que a concretização da propriedade fiduciária em benefício do credor, com a alteração consolidada da propriedade no registro imobiliário, deve obedecer aos requisitos legais da Lei nº 9.514/97, para que tenha efeitos no mundo jurídico, como por exemplo, a notificação do devedor para purgar a mora através do competente Cartório de Registro de Imóveis competente, em que situado o imóvel.
Por fim, registra-se que o princípio da boa-fé contratual deve estar presente em todas as pactuações e a sua evidente violação importa na relativização do instituto da impenhorabilidade do bem de família.
RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE CONSIGNAÇÃO EM PAGAMENTO E NULIDADE DA CONSOLIDAÇÃO DA PROPRIEDADE. IMÓVEL INDICADO COMO GARANTIA DE CONTRATO DE MÚTUO COM CLÁUSULA DE ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA. PROTEÇÃO DO BEM DE FAMÍLIA. DESCABIMENTO. NOTIFICAÇÃO EXTRAJUDICIAL REQUERIDA POR PESSOA JURÍDICA DIVERSA DO CREDOR FIDUCIÁRIO. IRREGULARIDADE INSANÁVEL. NULIDADE RECONHECIDA. AUSÊNCIA DE CONSTITUIÇÃO EM MORA DO DEVEDOR. 1. A proteção legal conferida ao bem de família pela Lei n. 8.009/90 não pode ser afastada por renúncia do devedor ao privilégio, pois é princípio de ordem pública, prevalente sobre a vontade manifestada (AgRg nos EREsp 888.654/ES, Rel. Ministro João Otávio de Noronha, Segunda Seção, julgado em 14.03.2011, DJe 18.03.2011). 2. Nada obstante, à luz da jurisprudência dominante das Turmas de Direito Privado: (a) a proteção conferida ao bem de família pela Lei n. 8.009/90 não importa em sua inalienabilidade, revelando-se possível a disposição do imóvel pelo proprietário, inclusive no âmbito de alienação fiduciária; e (b) a utilização abusiva de tal direito, com evidente violação do princípio da boa-fé objetiva, não deve ser tolerada, afastando-se o benefício conferido ao titular que exerce o direito em desconformidade com o ordenamento jurídico. […] 10. Recurso especial parcialmente provido. (REsp 1595832/SC, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA TURMA, julgado em 29/10/2019, DJe 04/02/2020 – grifado)
A Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça, conforme jurisprudência abaixo colacionada, entendeu ser válida a cláusula contratual que trata sobre a penhorabilidade do bem de família, com o objetivo de impedir o comportamento contraditório. Explica-se: a contradição está caracterizada quando o devedor dá em garantia fiduciária um bem que, sabidamente, é considerado de família.
Diante disso e com base no princípio da boa-fé contratual, a Corte Superior passou a reconhecer a possibilidade de penhora do bem família, analisando cada caso concreto e as suas peculiaridades.
AGRAVO INTERNO NOS EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL – AÇÃO DECLARATÓRIA DE NULIDADE DE CLÁUSULA CONTRATUAL – DECISÃO MONOCRÁTICA QUE NEGOU PROVIMENTO AO RECLAMO INSURGÊNCIA DA PARTE AUTORA. 1. Nos termos da orientação firmada nos autos do REsp. 1.559.348/DF, com o propósito de vedar a ocorrência de comportamento contraditório, prestigiando o princípio da boa-fé contratual, este Superior Tribunal de Justiça passou a reconhecer a possibilidade de penhora incidente sobre bem de família oferecido por pessoa física como garantia em contrato de mútuo em benefício de pessoa jurídica. 2. Agravo interno desprovido. (AgInt nos EDcl no AREsp 1507594/MG, Rel. Ministro MARCO BUZZI, QUARTA TURMA, julgado em 30/03/2020, DJe 01/04/2020)
Concluiu-se então, que o bem de família é considerado um direito, assegurado constitucionalmente e sendo um instrumento utilizado para proteger o direito fundamental à moradia. O objetivo deste instituto é proteger a entidade familiar como um todo, independentemente, da forma como constituída.
Nesse sentido, conforme exposto, apesar do imóvel considerado bem de família ser impenhorável, há entendimento diverso, no sentido de que essa inalienabilidade poderá ser relativizada, quando este bem é dado em garantia fiduciária, estando o devedor ciente da sua condição e das cláusulas contratuais.
O Escritório Crippa Rey Advogados se coloca a inteira disposição para maiores consultas sobre o tema e resolução de dúvidas sobre a matéria.
[1] Artigo 789. O devedor responde com todos os seus bens presentes e futuros para o cumprimento de suas obrigações, salvo as restrições estabelecidas em lei.
[2] BUENO, Cassio Scarpinella. Manual de direito processual civil: volume único. 5.ed. São Paulo: Saraiva Educação, 2019. fl.1059.
[3] Artigo 832. Não estão sujeitos à execução os bens que a lei considera impenhoráveis ou inalienáveis.
Art. 833. São impenhoráveis:
[…]
II – os móveis, os pertences e as utilidades domésticas que guarnecem a residência do executado, salvo os de elevado valor ou os que ultrapassem as necessidades comuns correspondentes a um médio padrão de vida;
[4] Art. 1º da Lei nº 8009/90. O imóvel residencial próprio do casal, ou da entidade familiar, é impenhorável e não responderá por qualquer tipo de dívida civil, comercial, fiscal, previdenciária ou de outra natureza, contraída pelos cônjuges ou pelos pais ou filhos que sejam seus proprietários e nele residam, salvo nas hipóteses previstas nesta lei.
A CONCESSÃO DE DESÁGIO AOS CRÉDITOS TRABALHISTAS NA RECUPERAÇÃO JUDICIAL
Recentemente, o Ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, ao analisar Pedido de Tutela Provisória, proferiu decisão reconhecendo a possibilidade de concessão de deságio para o pagamento dos créditos trabalhistas na recuperação judicial.[1]
O artigo 54 da Lei 11.101/2005, o qual regula a recuperação judicial, extrajudicial e a falência do empresário e da sociedade empresária, determina que o plano de recuperação judicial não poderá prever o pagamento dos créditos trabalhistas em prazo superior a 1 (um) anos:
Art. 54. O plano de recuperação judicial não poderá prever prazo superior a 1 (um) ano para pagamento dos créditos derivados da legislação do trabalho ou decorrentes de acidentes de trabalho vencidos até a data do pedido de recuperação judicial.
Tal determinação decorre da natureza alimentar do crédito trabalhista e da presunção de hipossuficiência do trabalhado. Neste sentido:
São regras que existem em atenção à natureza eminentemente alimentar do crédito trabalhista e da conhecida hipossuficiência do trabalhador, agente que usualmente não consegue negociar garantias e, seu contrato de trabalho, tampouco embutir em sua remuneração uma taxa de risco, tal como fazem as instituições financeiras e os grandes fornecedores, por exemplo[2].
Embora a LRF tenha imposto prazo legal para que a empresa em recuperação judicial efetue o pagamento dos credores trabalhistas, o legislador não trouxe nenhum entrave que obstaculizasse o pagamento dos créditos arrolados nesta classe com deságio.
A Lei de Recuperação Judicial e Falência traz, em seu artigo 50, os meios de recuperação judicial, todavia trata-se de rol exemplificativo, podendo a empresa propor diversas formas de soerguimento, desde que não se mostre contrárias à legislação vigente:
Art. 50. Constituem meios de recuperação judicial, observada a legislação pertinente a cada caso, dentre outros:
I ° concessão de prazos e condições especiais para pagamento das obrigações vencidas ou vincendas;
II ° cisão, incorporação, fusão ou transformação de sociedade, constituição de subsidiária integral, ou cessão de cotas ou ações, respeitados os direitos dos sócios, nos termos da legislação vigente;
III ° alteração do controle societário;
IV ° substituição total ou parcial dos administradores do devedor ou modificação de seus órgãos administrativos;
V ° concessão aos credores de direito de eleição em separado de administradores e de poder de veto em relação às matérias que o plano especificar;
VI ° aumento de capital social;
VII ° trespasse ou arrendamento de estabelecimento, inclusive à sociedade constituída pelos próprios empregados;
VIII ° redução salarial, compensação de horários e redução da jornada, mediante acordo ou convenção coletiva;
IX ° dação em pagamento ou novação de dívidas do passivo, com ou sem constituição de garantia própria ou de terceiro;
X ° constituição de sociedade de credores;
XI ° venda parcial dos bens;
XII ° equalização de encargos financeiros relativos a débitos de qualquer natureza, tendo como termo inicial a data da distribuição do pedido de recuperação judicial, aplicando-se inclusive aos contratos de crédito rural, sem prejuízo do disposto em legislação específica;
XIII ° usufruto da empresa;
XIV ° administração compartilhada;
XV ° emissão de valores mobiliários;
XVI ° constituição de sociedade de propósito específico para adjudicar, em pagamento dos créditos, os ativos do devedor.
Note-se que o dispositivo legal prevê a possibilidade da empresa em recuperação judicial oferecer a concessão de prazos e condições especiais para o pagamento das obrigações vencidas e vincendas. Dentre estas condições especiais está a concessão de deságios às dívidas.
O Ministro Vilas Bôas, ao analisar o Pedido de Tutela Provisória, autorizou o deságio de 60% (sessenta por cento) dos créditos trabalhistas como meio de recuperação judicial:
“Como se vê do dispositivo transcrito, não existe, a princípio, óbice para o pagamento do crédito trabalhista com deságio, tampouco se exige a presença do Sindicato dos Trabalhadores para validade da votação implementada pela Assembleia Geral de Credores. Ademais, no caso dos autos, o requisito exigido no artigo 54 da LRF para o pagamento dos créditos trabalhista no prazo de 1 (um) ano foi atendido, (…)”
Há de se destacar que o objetivo principal da Lei 11.101/2005, insculpido no artigo 47, é viabilizar à empresa em recuperação judicial a superação da situação de crise econômico-financeira, permitindo a manutenção da fonte produtora, do emprego dos trabalhadores e dos interesses dos credores, propiciando a preservação da empresa, a função social e o estímulo à atividade econômica.
Sendo assim, empresa e credores devem ser responsáveis pelo processo de recuperação, envidando seus melhores esforços para alinhar termos e condições benéficos a todos aqueles envolvidos, pois, a superação da crise é, ou deveria ser, o propósito de ambos.
Por fim, consoante à possibilidade, cumpre salientar que, apesar da questão merecer uma análise mais aprofundada, a manifestação da Corte no sentido da legalidade de pagamento do crédito trabalhista com deságio abre precedentes para sua perfectibilização, flexibilizando o crédito trabalhista e ampliando as possibilidades da empresa no seu processo de Recuperação Judicial.
[1]https://ww2.stj.jus.br/processo/dj/documento/mediado/?tipo_documento=documento&componente=MON&sequencial=111574521&tipo_documento=documento&num_registro=202001398052&data=20200624&tipo=0&formato=PDF
[2] SCAZILLI, João Pedro; SPINELLI, Luis Felipe; TELLECHEA, Rodrigo. Recuperação de Empresas e Falência: Teoria e prática na Lei 11.101/2005. 3º Ed., São Paulo: Editora Almedina, p. 135.
A NOVA DISCUSSÃO ENVOLVENDO A INCONSTITUCIONALIDADE DO PIS E DA COFINS DA BASE DE CÁLCULO DO ICMS
O escritório Crippa Rey Advogados, sempre atentos às inovações legislativas e regulamentares, vem apresentar informativo quanto a nova discussão envolvendo a exclusão do PIS e da COFINS do cálculo do ICMS e as consequências econômicas que a exclusão porá trazer às empresas e empresários.
A nova discussão foi julgada pela Justiça Federal de São Paulo[1] em execução fiscal movida pela Fazenda Estadual, tendo sido reconhecido o direito de o contribuinte excluir o PIS e a COFINS da base de cálculo do ICMS e, determinado a Fazenda Estadual a realização de novo cálculo expresso na Certidão de Dívida Ativa (CDA) da empresa executada, excluindo o PIS e a COFINS da base de cálculo do ICMS.
O Magistrado que julgou a ação entendeu que “o PIS ou Cofins são calculados com base na receita do contribuinte, o que não guarda em nenhum de seus fatores correlação com o valor da operação de mercadorias ou serviços” e, complementou a sua decisão afirmando que “entendimento contrário implicaria no absurdo de a base de cálculo do imposto estadual ser agregada por contribuições sociais, em uma autêntica bitributação, ou em uma abominável tributação sobre tributos”.
O entendimento do Julgador está em consonância com o entendimento do Supremo Tribunal Federal no julgamento do Recurso Extraordinário nº. 574.706 – Tema nº. 69[2] do âmbito de repercussão geral – onde restou fixado o entendimento de que o ICMS não compõe a base de cálculos para a incidência do PIS e da COFINS.
A decisão da Suprema Corte referente ao Tema nº. 69 certamente está ganhando força posto que envolve discussões como a inconstitucionalidade do PIS e da COFINS sobre suas próprias bases (Tema 1067/STF), a inconstitucionalidade do PIS e da COFINS na base de cálculo da CPRB (Tema 1048/STF), ICMS na base de cálculo do IRPJ/CSLL (Tema 957/STF).
Após a decisão da Suprema Corte, há diversas ações que versam sobre os temas acima mencionados, sendo decididas em favor dos contribuintes, o que demonstra que o Supremo Tribunal está evoluindo seu entendimento quanto a matéria e, possivelmente, haverá novas vitórias pelos contribuintes envolvendo a discussão em comento.
Nesse interim, importante ressaltar que o artigo 8º da Lei Complementar 87/96 prevê que integra a base de cálculo do ICMS o valor da operação, portanto, o preço da operação deve ser tributado e não o valor de outro tributo pertencente a outro Ente Federativo.
Em outras palavras, o artigo 155, inciso XI da Constituição Federal prevê que os valores cobrados a título de IPI não incidirão sobre a base de cálculo ICMS, o que evidencia que o legislador não teve o propósito de tributar outros tributos por meio do ICMS, demonstrando-se a inconstitucionalidades das exações.
A tributação sobre as receitas, sem nenhuma dúvida, majoram de forma desproporcional a carga tributária das pessoas jurídicas, razão pela qual, a Suprema Corte entendeu e fixou seu entendimento de que o valor do ICMS a ser excluído da base de cálculo do PIS e da COFINS é o destacado na nota fiscal, posto que não constituem receita nem faturamento e, portanto, o ICMS não pode integrar a base de cálculo da contribuição previdenciária sobre a receita bruta.
Além disso, quando do advento da Constituição Federal, o PIS e a COFINS não existiam, tendo sido incluídas após 10 (dez) anos de vigência da Carta Maior, por meio da Emenda Constitucional nº. 20/1998, que inseriu a alínea “b”, do inciso I, do artigo 195, CF/88, prevendo que o PIS e a COFINS incidirão sobre o faturamento.
Certo é que tendo a Suprema Corte decidido quanto a inconstitucionalidade da inclusão do ICMS na base de cálculo do PIS e da COFINS, o contrário merece o mesmo entendimento, isto é, haverá necessariamente o reconhecimento da constitucionalidade da exclusão do PIS e da COFINS da base de cálculo do ICMS, já que não representam o valor da operação, do artigo 8º da Lei Kandir.
Dessa forma, sendo o fato gerador a circulação de mercadoria e a base de cálculo o valor da operação, os valores de PIS e COFINS não possuem qualquer relação com valor a ser apurado de ICMS, motivo pelo qual não devem incidir na base de cálculo deste imposto.
Assim, a incidência do PIS e da COFINS na base de cálculo do ICMS, ofende a disposição contida no artigo 155, inciso II, da CF, o princípio da isonomia tributária previsto no caput do artigo 5º, da CF, o princípio da legalidade, conforme artigo 5º, inciso II da CF, o princípio da capacidade contributiva, nos termos do artigo, 145, parágrafo 1º, da CF, e o princípio da vedação ao confisco, conforme enunciado do artigo 150, inciso IV, da CF.
Sendo o que tínhamos para informar no momento, permanecemos atentos às movimentações legislativas quanto ao tema, especialmente do impacto que a reforma tributária proposta apresentada pelo Governo Federal quanto as alterações para o PIS e a COFINS, trará ao nosso ordenamento jurídico, bem como aos negócios e economia do País e do Mundo.
Colocamo-nos, como de costume, à inteira disposição para maiores consultas acerca do tema, complementando informações, debatendo o assunto ou prestando outros esclarecimentos.
[1] Processo n. 1503207-56.2019.8.26.0554 – 2ª Vara da Fazenda Pública de Santo André-SP.
[2] http://www.stf.jus.br/portal/jurisprudenciaRepercussao/verAndamentoProcesso.asp?incidente=2585258&numeroProcesso=574706&classeProcesso=RE&numeroTema=69
DIREITO, EMPREENDEDORISMO E TECNOLOGIA: A APLICAÇÃO DO "DIREITO DAS STARTUPS" PARA FOMENTAR E PROTEGER NEGÓCIOS INOVADORES
O Escritório Crippa Rey Advogados SS vem, muito respeitosamente à presença de Vossas Senhorias, sempre atento às inovações no âmbito do Direito Empresarial, apresentar INFORMATIVO a todos os clientes, colegas e empreendedores, concernente à aplicabilidade de ferramentas legais tradicionais no tocante a empresas que apresentam novos modelos de negócios inovadores. Conhecida como “Startup Law” e ainda em fase de desenvolvimento no Brasil, tal área do Direito relaciona todas as demais áreas do Direito Tradicional e do apanhado legislativo e regulamentar que tangencia os empreendimentos formados a partir de ideias e tecnologias digitais de ponta, visando fomentar e proteger negócios inovadores. Áreas como o Direito Empresarial, Direito Societário, Contratos e Propriedade Intelectual, Direito Tributário e Investimentos, por exemplo, são as principais linhas trabalhadas pelos advogados para atingir resultados práticos e apoiar esse tipo de empresa, buscando redesenhar as ferramentas tradicionais de forma a modernizar e atender as novas demandas tecnológicas.
Por definição[1], Startups são empresas que criam modelos de negócio altamente escaláveis, a baixos custos e a partir de ideias e tecnologias inovadoras. Startups não são somente empresas que atuam na internet ou em meios digitais, como comumente se pensa. Ao contrário, são instituições desenhadas para criar novos produtos ou serviços em condições de extrema incerteza – sejam elas incertezas econômicas, mercadológicas, tecnológicas ou até mesmo jurídicas. A partir de tal definição, é possível caracterizar esse tipo de negócio como sendo um negócio novo, no sentido de que começou a existir há pouco tempo (em média 3 anos); como sendo inovador, no sentido de que muda ou está tentando mudar o comportamento de agentes no mercado[2]; e que apresenta modelo de negócio repetível a uma taxa de crescimento escalável, dada a taxa de crescimento anual (x%) no mercado em que atua, ou seja, o negócio tem potencial para alcançar o maior número de pessoas e clientes independentemente do local onde estão situados, sendo escalável em uma ordem de por exemplo “100x%”[3].
No tocante ao arcabouço jurídico brasileiro aplicável às Startups, a maioria dos profissionais da área desconhecem um conceito legal ou regulatório específico que possa definir, delimitar ou caracterizar esse tipo de negócio no Direito Brasileiro[4]. No geral, a maioria dos empresários tem dúvidas sobre qual tipo societário escolher e quais tipos de acordos e contratos devem realizar, haja vista que não existe uma só fórmula correta quando tratamos de empresas e startups. Assim, a escolha da modelagem societária, bem como a redação de atos constitutivos e acordos devem ser criteriosas, devendo ser consideradas diversas variáveis tais como o perfil dos sócios, a perspectiva de aporte de investimento em participação societária, a forma de gestão, a distribuição de resultados e a opção pelo regime fiscal[5].
Pode-se dizer que algumas características qualitativas são elementares ao modelo das Startups, conforme o exposto[6]:
Visto isso, todas essas características evidenciam a dificuldade que os empreendedores tem de adaptar seus negócios a realidade burocrática do modelo tradicional oferecido pelo atual sistema jurídico brasileiro, que é incompatível com o ambiente inovador em que esse tipo de empresa está instalado. Portanto, deve ser encontrado um equilíbrio entre a visão tradicional do Direito e o conceito de disrupção que tal modelo busca oferecer. Visando a escolha do tipo societário ideal, é essencial compreender que tipo de necessidade a empresa tem, qual é seu modelo de negócio, especificidades e objetivos a serem alcançados e desenvolvidos, e quais são as viabilidades legais que encontramos em nosso sistema jurídico que auxilie na formalização da escolha da modelagem contratual e societária. A título exemplificativo, as cláusulas de Drag Along e Tag Along, objetos de estudo em artigo anterior[7],tem sido muito utilizadas atualmente em contratos de investimentos em Startups, bem como em Acordo de Quotistas com o objetivo de proteger os acionistas/sócios das companhias e regular as operações de compra e venda de controle de empresas.
Buscando elucidar a presente questão, iremos publicar nas próximas semanas artigos específicos tratando da modelagem societária e dos tipos de contratos mais utilizados por startups para fomentar e proteger negócios inovadores.
Assim, sendo o que tínhamos para esclarecer no presente momento, informamos que estamos sempre atentos às inovações no âmbito do empreendedorismo e do Direito Empresarial, e colocamo-nos, como de costume, à inteira disposição para maiores consultas acerca do tema, complementando informações, debatendo o assunto ou prestando outras explicações.
[1] MEIRA, Silvio Lemos. Novos negócios inovadores de crescimento empreendedor no Brasil. Rio de Janeiro: Casa da Palavra, 2013.
[2] Segundo prevê o art. 2º, inciso IV, da Lei de Fomento a Inovação (Lei 10.973/2004) a inovação é definida como a “introdução de novidade ou aperfeiçoamento no ambiente produtivo e social que resulte em novos produtos, serviços ou processos ou que compreenda a agregação de novas funcionalidades ou características a produto, serviço ou processo já existente que possa resultar em melhorias e em efetivo ganho de qualidade ou desempenho”.
[3] Coord: JÚDICE, Lucas Pimenta; NYBO, Erik Fontenele. Direito das Startups. Curitiba: Juruá, 2016.
[4] FALCÃO, João Pontual de Arruda. Startup Law Brasil: o Direito Brasileiro rege mas desconhece as Startups. Dissertação de Mestrado em Direito da Regulação. Rio de Janeiro: Escola de Direito da Fundação Getúlio Vargas, 2017.
[5] Fonte: https://bernardodeazevedo.com/wp-content/uploads/2020/02/Direito-Startups.pdf
[6] FALCÃO, João Pontual de Arruda. Startup Law Brasil: o Direito Brasileiro rege mas desconhece as Startups. Dissertação de Mestrado em Direito da Regulação. Rio de Janeiro: Escola de Direito da Fundação Getúlio Vargas, 2017.
[7] Acesso no link: http://crippareyadvogados.com.br/o-uso-das-clausulas-de-drag-along-e-tag-along-em-operacoes-de-compra-e-venda-do-controle-de-empresas/
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