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REFLEXOS TRIBUTÁRIOS ADVINDOS DA LEI Nº 14.112/2020 (Nova Lei de Recuperação Judicial e Falências)
Com a entrada em vigor da Lei nº 14.112/2020[1] que atualiza a legislação referente à recuperação judicial (Lei nº 11.101/2005), à recuperação extrajudicial e à falência do empresário e da sociedade empresária, as dúvidas quanto aos reflexos tributários cresceram ainda mais.
Assim, visando dirimir controvérsias e sanar dúvidas, o Escritório Crippa Rey Advogados Associados, sempre atento às atualizações legislativas, traz esclarecimentos relevantes no que tange aos aspectos tributários da Lei nº 14.112/2020.
É sabido que a legislação que regula a recuperação judicial afasta a participação da Fazenda Pública do processo, isto é, do concurso de credores, gerando, com isso, preocupação diante da insegurança jurídica e, ainda, prejuízos às empresas e empresários recuperandos que, infelizmente, ficam ameaçados, diariamente, com atos constritivos (bloqueios/penhoras) em seu patrimônio.
A Constituição Federal dispõe quanto ao dever fundamental de pagar tributos, razão pela qual, o crédito tributário é compulsório, tendo em vista o interesse público sobre ele, ou seja, tem como finalidade a manutenção do Estado, não podendo o Fisco deixar de cobrá-lo e, por esta razão, possui garantias, privilégios e autonomia frente aos créditos de demais credores.
Por não estarem incluídos na recuperação judicial, aos créditos tributários também não se aplica a previsão contida no artigo 6º, inciso II, da Lei nº 14.112/2020, de suspensão das execuções e obrigações (determinações de penhoras, bloqueios, leilões, etc.). Entretanto, o §7º-B do referido dispositivo legal, prevê que a competência do juízo da recuperação judicial para determinar a substituição dos atos de constrição que recaiam sobre bens de capital essenciais à manutenção da atividade empresarial até o encerramento da recuperação judicial.
Além disso, a jurisprudência vem sendo formada, através do Tema 987[2] do STJ, no sentido de suspender as execuções fiscais para preservação da empresa e do empresário recuperando.
Apesar disso, a Nova Lei, em seu artigo 7º-A, §4º, inciso V, trouxe a possibilidade de suspensão das execuções fiscais até o encerramento da falência, porém, poderá haver o redirecionamento da execução aos corresponsáveis, o que vai totalmente de encontro aos artigos 128 a 135 do CTN c/c art. 50 CC/02 que preveem as hipóteses de redirecionamento do débito. Portanto, certamente haverá muitas discussões sobre o assunto, posto o conflito entre as normas e, havendo previsão específica na legislação tributária, esta sempre prevalecerá.
Com efeito, mister destacar os principais impactos tributário trazidos pela Lei nº 14.112/2020:
Inicialmente, destaca-se que a Lei nº 11.101/2005 exigia a apresentação de Certidão Negativa de Débitos – CND para o deferimento do processamento da Recuperação Judicial. Entretanto, a jurisprudência tem flexibilizado tal exigência, em razão da dissonância existente entre o princípio basilar da recuperação judicial – preservação da empresa – e coação apresentada às empresas para realizarem parcelamentos com o Fisco, mesmo inexistindo condições econômicas-financeiras para o cumprimento do acordo.
Com a Lei nº 14.112/2020, a exigência se manteve, isto é, a apresentação de CND ou CPEN – Certidão Positiva com Efeitos de Negativa, para o processamento da recuperação judicial está mantida, o que causa preocupação às empresas e empresários, bem como para operadores do direito, visto que há clara insegurança jurídica, na medida em que não há certeza quanto a manutenção da jurisprudência em manter a flexibilização na exigência da apresentação de CND u CPEN.
Quanto a possibilidade de parcelamento dos débitos tributários federais, o artigo nº 10-A da Nova Lei apresenta a possibilidade de realização de parcelamento em até 120 (cento e vinte) meses.
Poderão ser parcelados débitos de natureza tributária e não-tributária, constituídos ou não, inscritos ou não em dívida ativa, existentes até a data do protocolo da petição inicial da recuperação judicial.
Parcelamento de 120 meses
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Ou
Parcelamento com utilização de Prejuízo Fiscal ou Créditos próprios relativos aos tributos administrados pela Secretaria Especial da Receita Federal do Brasil
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Apesar dessas modalidades de parcelamento, a sociedade empresária ou empresário em recuperação judicial, poderá optar por liquidar os referidos débitos com a Fazenda Nacional por meio de outra modalidade de parcelamento instituído por lei federal, como por exemplo, quando houver algum programa mais benéfico.
Ainda, vale salientar que o valor do crédito próprio relativos ao tributo administrado pela Secretaria Especial da Receita Federal do Brasil, decorrente de prejuízo fiscal e de base de cálculo negativa da CSLL, será determinado por meio da aplicação das seguintes alíquotas:
a) 25% (vinte e cinco por cento) sobre o montante do prejuízo fiscal;
b) 20% (vinte por cento) sobre a base de cálculo negativa da CSLL, no caso das pessoas jurídicas de seguros privados, das pessoas jurídicas de capitalização e das pessoas jurídicas referidas nos incisos I, II, III, IV, V, VI, VII e X do § 1º do art. 1º da Lei Complementar nº 105, de 10 de janeiro de 2001;
c) 17% (dezessete por cento) sobre a base de cálculo negativa da CSLL, no caso das pessoas jurídicas referidas no inciso IX do § 1º do art. 1º da Lei Complementar nº 105, de 10 de janeiro de 2001;
d) 9% (nove por cento) sobre a base de cálculo negativa da CSLL, no caso das demais pessoas jurídicas.
Os débitos que estiverem sob discussão administrativa ou judicial, poderão ser excluídos do parcelamento e, caso sejam incluídos, deverá ser comprovada a desistência expressamente e de forma irrevogável da impugnação ou do recurso interposto, ou da ação judicial e, cumulativamente, que renunciou às alegações de direito sobre as quais se fundam a ação judicial e o recurso administrativo.
Ainda, para a adesão e composição com a Fazenda Pública, deverá ser deve ser mantida a regularidade fiscal, ou seja, o tributo vincendo não poderá ser pago em atraso e, ainda, as obrigações com o FGTS também deverão se manter regulares.
Por fim, importante ficar atento na composição com a Fazenda Pública, visto que, havendo o descumprimento do parcelamento, poderá o Fisco requerer a decretação da falência da sociedade empresária ou empresário, nos termos do artigo 10-A, §4º-A, inciso IV, da Nova Lei.
A Lei nº 14.112/2020, acrescentou ao artigo 86 da Lei nº 11.101/2005 o inciso IV, prevendo que às Fazendas Públicas procederão à restituição em dinheiro, relativamente a tributos passíveis de retenção na fonte, de descontos de terceiros ou de sub-rogação e a valores recebidos pelos agentes arrecadadores e não recolhidos aos cofres públicos.
Diante disso, notório que, se antes do advento da Nova Lei a Fazenda Pública já detinha autonomia sobre às empresas e empresários e com as alterações acima apresentadas, percebe-se que hoje tal soberania está ainda maior, visto que, além de poder decretar a falência do empresário ou sociedade empresária em recuperação judicial, tem, em suas mãos a plena liberdade sobre os recuperandos.
Com efeito, repisa-se que, apesar de o Superior Tribunal de Justiça[4] no passado ter entendido que a Fazenda Pública não poderá requerer a decretação da falência, a nova previsão legal poderá alterar o entendimento jurisprudencial até hoje praticado nos Tribunais do País. Inclusive, acreditamos que este será o debate entre empresas/empresários e o Fisco, especialmente em razão de que a fazenda Pública detém inúmeras proteções do crédito tributário.
Ademais, imperioso ressaltar que o artigo 151 do Código Tributário Nacional (CTN) prevê que o parcelamento é hipótese de suspensão do crédito tributário e, assim, havendo o parcelamento do débito fiscal, deverão ser suspensas as execuções fiscais em curso contra a empresa ou empresário recuperando.
Em síntese, as inovações trazidas pela Lei nº 14.112/2020 no âmbito tributário estão relacionadas a:
1. Manutenção da exigência de apresentação de CND/CPEN, para o processamento da recuperação judicial;
2. Parcelamento de débitos tributários, nos termos estipulados na Nova Lei e, ainda, de acordo com a Lei nº. 13.988/2020 que dispõe sobre transação tributária com a União;
3. Possibilidade de a Fazenda Pública requerer a decretação de falência do empresário ou sociedade empresária em processo de recuperação judicial, em caso de contumácia;
O Escritório Crippa Rey Advogados está à disposição para orientá-los, bem como para sanar quaisquer dúvidas existentes envolvendo o tema em debate.
Por fim, destaca-se que para maiores informações acerca de aspectos importantes sobre as alterações trazidas pela Lei nº 14.112/2020, acesse também nosso informativo “AS PRINCIPAIS ALTERAÇÕES DA LEI 14.112/2020 NO ÂMBITO DA RECUPERAÇÃO JUDICIAL DE EMPRESAS” no endereço: http://www.crippareyadvocgados.com.br/publicacao/as-principais-alteracoes-da-lei-14122+2020-no-ambito-da-recuperacao-judicial-de-empresas.
Porto Alegre, 05 de março de 2021.
Equipes Tributária e de Recuperação Judicial e Falências
Adriana Dusik Angelo
OAB/RS 88.210
Rubia Gress
OAB/RS 96.146
[1] http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2019-2022/2020/lei/L14112.htm#:~:text=LEI%20N%C2%BA%2014.112%2C%20DE%2024%20DE%20DEZEMBRO%20DE%202020&text=Altera%20as%20Leis%20nos,empres%C3%A1rio%20e%20da%20sociedade%20empres%C3%A1ria.
[2] Tema/Repetitivo 987 - Possibilidade da prática de atos constritivos, em face de empresa em recuperação judicial, em sede de execução fiscal de dívida tributária e não tributária.
Há determinação de suspensão nacional de todos os processos pendentes, individuais ou coletivos (Art. 1.037, II, CPC). (acórdão publicado no DJe de 27/02/2018).
[3] Lei nº 8.981/95 –
Art. 42. A partir de 1º de janeiro de 1995, para efeito de determinar o lucro real, o lucro líquido ajustado pelas adições e exclusões previstas ou autorizadas pela legislação do Imposto de Renda, poderá ser reduzido em, no máximo, trinta por cento.
Art. 58. Para efeito de determinação da base de cálculo da contribuição social sobre o lucro, o lucro líquido ajustado poderá ser reduzido por compensação da base de cálculo negativa, apurada em períodos-base anteriores em, no máximo, trinta por cento.
[4] REsp164.389/MG, REsp287.824/MG, REsp363.206/MG, REsp138.868/MG, REsp1.103.405/MG
SUCESSÃO DE EMPRESAS E AS SUAS ESPECIFICIDADES NA ESFERA TRABALHISTA
O escritório Crippa Rey Advogados, sempre atento ao direito empresarial e as relações de emprego, vem apresentar um breve artigo sobre os aspectos da sucessão de empresas na esfera trabalhista.
Inicialmente, cabe esclarecer que conceitualmente a sucessão empresarial esta prevista no artigo 1.146 do Código Civil, sendo basicamente o ato em que uma pessoa jurídica adquire ou assume outra pessoa jurídica, passando a ser responsável por todo o ônus e o bônus desta.
Esta sucessão pode ocorrer de diversas formas, tais como:
- Fusão;
- Transformação;
- Incorporação;
- Cisão;
- Trespasse;
- Mudança de quadro societário; etc.
Quando ocorre a sucessão empresarial haverá conjuntamente uma sucessão de empregadores, afetando as relações de emprego da empresa sucedida, que passarão a ser de responsabilidade da empresa sucessora.
A Reforma Trabalhista dispôs no artigo 448-A da CLT que a sucessão empresarial, prevista nos artigos 10 e 448 da CLT, se caracteriza pela transferência da unidade econômica-jurídica de uma empresa sucedida para a empresa sucessora, sem afetar os contratos de trabalhos dos empregados. Ou seja, o fato de ocorrer a troca de empregadores não afetará os contratos de trabalho dos empregados da empresa sucedida, vejamos o texto dos referidos:
Art. 10 - Qualquer alteração na estrutura jurídica da empresa não afetará os direitos adquiridos por seus empregados.
Art. 448 - A mudança na propriedade ou na estrutura jurídica da empresa não afetará os contratos de trabalho dos respectivos empregados.
Esta alteração legislativa veio ao encontro da já consagrada Orientação Jurisprudencial º 261 da SDI-1 do TST que segundo o Ilustre Desembargador Relator Marcelo Goncalves de Oliveira, integrante a 10ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região, a sucessão é “baseada na noção de que a aquisição do estabelecimento empresarial teria o efeito de transferir não só os ativos, mas também todo o passivo trabalhista.”, conforme fundamentado no acórdão dos autos nº 0020969-59.2017.5.04.0404[1].
Observa-se, que para a configuração da sucessão empresarial é preciso a presença de dois requisitos, quais são:
Ainda, conforme fundamentado pelo nobre Desembargador Marcelo Goncalves de Oliveira no julgamento supramencionado “Três princípios fundamentam a sucessão empresarial no âmbito trabalhista: continuidade, despersonalização do empregador e intangibilidade contratual objetiva.”
Ocorrendo a sucessão empresarial entre as empresas, a sucessora passa a dar continuidade à exploração das atividades da empresa sucedida. Consequentemente, o empregador sucessor responderá por todas as obrigações decorrentes das relações laborais passadas, presentes e futuras, além dos débitos trabalhistas e ações trabalhistas, inclusive do período em que o empregado trabalhava para a empresa sucedida, assumindo, assim, os bônus e os ônus da empresa obtida.
No mesmo sentido prevê o artigo 448-A da CLT nos seguintes termos:
“Caracterizada a sucessão empresarial ou de empregadores prevista nos arts. 10 e 448 desta Consolidação, as obrigações trabalhistas, inclusive as contraídas à época em que os empregados trabalhavam para a empresa sucedida, são de responsabilidade do sucessor.”
Todavia, o próprio artigo 448-A da CLT no parágrafo único prevê uma exceção com relação a regra da sucessão empresarial, nos casos em que ocorrer fraude na sucessão, nesses casos a responsabilidade entre o sucessor e o sucedido será considerada como solidária, respondendo as duas empresas de forma conjunta, vejamos o que dispõem o parágrafo nesse sentido:
“A empresa sucedida responderá solidariamente com a sucessora quando ficar comprovada fraude na transferência.”
Evidencia-se que nos contratos de sucessão que apresentar cláusula de excludente de responsabilidade do sucessor não irá produzir efeitos em eventuais reclamatórias trabalhista, uma vez que a própria legislação prevê o sentido contrário, caso demonstrada a sucessão fraudulenta.
Por fim, quando estiver se tratando de sócio retirante da sociedade empresária, ou seja, o sócio que se retira da sociedade mediante notificação prévia aos demais sócios com prazo mínimo de 60 dias. Quanto, a sua responsabilidade será de forma subsidiária em decorrência das obrigações do contrato de trabalho no período em que figurou como sócio, de acordo com uma ordem de preferência a ser observada da seguinte forma:
1. Empresa devedora;
2. Sócios Atuais;
3. Sócios Retirantes.
O sócio retirante somente será responsável mediante cobrança da empresa devedora, bem como dos sócios atuais, durante o lapso temporal de dois anos a contar da averbação da modificação contratual para fins de responsabilidade. Caso, ocorra eventual situação de fraude na retirada do sócio, a responsabilidade entre as partes será solidária, sem a observação de qualquer tipo de ordem de preferência.
Portanto, quando ocorrer a sucessão empresarial, os contratos de trabalho da empresa sucedida automaticamente passam a ser de responsabilidade exclusiva do sucessor que irá responder por todas as obrigações decorrentes das relações empregatícias. Já com relação ao sócio retirante a sua responsabilidade será subsidiária pelo período de dois anos. E em ambos os casos somente será configurada a responsabilidade solidaria quanto ocorrer a fraude entre os sócios.
O Escritório Crippa Rey advogados fica a disposição para demais esclarecimentos, através da sua equipe trabalhista e coloca-se ao dispor para sanar eventuais dúvidas existentes sobre o tema.
Porto Alegre, 01 de março de 2021.
Dra. Bibiana Marra
OAB/RS 119.656
[1] https://www.trt4.jus.br/pesquisas/rest/download/acordao/pje/cmNwhO_trFbWSIyN4UlFIw
Cobrança da Diferença de Alíquotas do ICMS – DIFAL – TEMA 1.093 DO STF
O escritório Crippa Rey Advogados, sempre atento aos julgamentos e decisões importantes, vem informar que na última quarta-feira, dia 24 de fevereiro de 2021, o plenário do Supremo Tribunal Federal julgou inconstitucional a cobrança do diferencial de alíquota (DIFAL) alusiva ao ICMS
O Tribunal, por maioria, apreciando o tema 1.093 da repercussão geral, deu provimento ao recurso extraordinário. Com placar apertado, o Plenário do STF, por seis votos a cinco, declarou a inconstitucionalidade de cláusulas do convênio 93/2015 do Conselho Nacional de Política Fazendária (Confaz) que regulamentaram o diferencial de alíquota de ICMS em operações interestaduais, envolvendo mercadoria destinada a consumidor final não contribuinte. A maioria dos ministros entende que há necessidade de uma lei complementar federal (por estar veiculando normas gerais em matéria tributária) para regulamentar o tema – o que ainda não existe.[1]
No centro da discussão estava a Emenda Constitucional 87, aprovada em 2015 com o objetivo de acabar com a guerra fiscal no setor de e-commerce. A emenda transfere ICMS do comércio eletrônico da origem para o destino, permitindo que os estados de destino cobrem o diferencial da alíquota.
Para aliviar a guerra fiscal entre os Estados, a própria Constituição estabeleceu regras específicas em operações Interestaduais:
Por fim, o Tribunal, por maioria, modulou os efeitos da declaração de inconstitucionalidade das cláusulas primeira, segunda, terceira, sexta e nona do convênio questionado para que a decisão produza efeitos, quanto à cláusula nona, desde a data da concessão da medida cautelar nos autos da ADI nº 5.464/DF e, quanto às cláusulas primeira, segunda, terceira e sexta, a partir do exercício financeiro seguinte à conclusão deste julgamento (2022), aplicando-se a mesma solução em relação às respectivas leis dos estados e do Distrito Federal, para as quais a decisão produzirá efeitos a partir do exercício financeiro seguinte à conclusão deste julgamento (2022).
Entretanto, para evitar efeitos econômicos rigorosos aos Estados, o STF decidiu modular os efeitos da sua decisão, nos termos abaixo, excetuo os casos dos contribuintes que têm ações judiciais em andamento, para os quais a decisão do STF tem efeitos desde já e, ainda, “retroativos”:
O julgamento, que havia sido interrompido em novembro de 2020 por pedido de vista do ministro Nunes Marques, foi concluído com modulação para produzir efeitos a partir de 2022. Por fim, esclarece-se que o Acórdão está pendente de publicação.
O Escritório Crippa Rey Advogados coloca-se ao dispor para sanar eventuais dúvidas existentes sobre o tema.
Porto Alegre, 01 de março de 2021.
Benoni Bernardes Brizolla
Estagiári0
É possível absolvição após a acusação de crime tributário?
Cientes do impacto causado quando do recebimento de uma denúncia criminal, vimos aclarar vossas senhorias, sobre a possibilidade do pedido de absolvição sumária criminal.
Além da pesada carga tributária vigente em nosso país, alguns empresários acabam sendo investigados e, por conseguinte, denunciados criminalmente, sendo penalizados, por muitas vezes, sem qualquer culpa.
Por esse motivo esclarecemos, é possível absolvição após a acusação de crime tributário?
Para respondermos essa pergunta iniciamos respondendo outra, afinal o que é crime tributário? Os ditos crimes tributários estão previstos na Lei 8137 de 1990. Tal ordenamento disciplina a chamada evasão fiscal, que “corresponde à conduta ilícita fiscal, após a ocorrência do fato gerador, que infringe a norma tributária, com vistas a ocultar ou reduzir o recolhimento da obrigação tributária.”[i]
Em linhas gerais, a lei de crimes tributários visa coibir a prática dos crimes de sonegação fiscal, fraude, conluio, a não emissão de notas e alteração de documentos fiscais. Como por exemplo:
Prestar informações falsas ou mesmo omiti-las às autoridades fazendárias;
Extraviar, falsificar ou alterar documentos fiscais, bem como inserir neles elementos inexatos para burlar a fiscalização;
Negar ou deixar de fornecer notas fiscais, bem como emiti-las com valores inexatos ou falsificá-las;
Deixar de recolher tributos e contribuições sociais no prazo legal, caracterizando apropriação indébita;
Exigir, pagar ou receber qualquer porcentagem sobre deduções de eventuais impostos ou incentivos fiscais;
Exigir, solicitar ou receber vantagens indevidas sobre tributos e contribuições sociais.
Importante salientar que, o mero inadimplemento fiscal não gera a ocorrência de crime, ou seja, o atraso no pagamento de impostos, por si só, não é capaz de ser considerado crime. Para a constatação da conduta passível de criminalização são necessários o cumprimento de alguns requisitos, a fim de que seja configurada fraude, sonegação, conluio, ou demais ações que prejudiquem, ou frustrem a arrecadação dos impostos devidos.
Esclarecidos tais pontos, caso haja investigação criminal geradora de ação penal, por um dos crimes existentes na lei de crimes tributários, devem ser observadas quais as possibilidades de encerramento da persecução - processo- penal.
No momento do recebimento da denúncia o acusado deve analisar calmamente as condutas indicadas, verificando se os atos descritos de fato ocorreram, se foram intencionais, se os valores indicados eram/são realmente devidos, qual a espécie do tributo e qual o motivo da irregularidade.
Analisados tais pontos, devemos passar para a fase da busca de teses defensivas. Para melhor exemplificar faremos o recorte analítico da tese de inexigibilidade de conduta diversa, como excludente de culpabilidade.
Para tanto, aclaramos que, para que uma ação (ato) possa ser criminalizada ela tem que ser culpável, ou seja, reprovável legalmente, prevista em lei.
A culpabilidade é a reprovabilidade pessoal pela realização de uma ação ou omissão típica e ilícita. Assim, não há culpabilidade sem tipicidade e ilicitude, embora possa existir ação típica e ilícita inculpável. Devem ser levados em consideração, além de todos os elementos objetivos e subjetivos da conduta típica e ilícita realizada, também, suas circunstâncias e aspectos relativos à autoria[ii].
A culpabilidade é composta por três elementos, a imputabilidade (quando o fato é previsto em lei), a potencial consciência da ilicitude (quando o a gente sabia o que fazia) e a exigibilidade de conduta diversa (quando não deveria ser feita a conduta).
Caso inexistam um dos elementos, o fato não pode ser considerado culpável, sendo o caso de excludente de culpabilidade, findando a acusação criminal. Existem inúmeras previsões legais para a exclusão da culpabilidade, como a inimputabilidade por doença mental ou desenvolvimento mental incompleto, art. 26, caput, CP, o erro de proibição, art. 21, caput, CP, a coação moral irresistível (art. 22, 1ª parte), dentre outras.
Assim, quando era exigível que a pessoa (física ou jurídica) agisse de outra forma, mas não fez, temos a exigibilidade de conduta diversa. Exige-se que não se pratique uma ação, portanto, sendo uma conduta delitiva, criminosa.
Mas quando é inexigível que uma conduta seja praticada? Pois bem, essa é a tesa que vimos aclarar, uma vez que, por diversos momentos é inexigível que o agente se porte de outra forma, sendo a causa de exclusão da culpabilidade.
É o caso da crise que vem assolando o nosso país, agravada com a pandemia mundial de COVID-19. Não é incomum que ocorram atrasos de adimplemento fiscal, com a finalidade de manutenção da higidez das empresas, que, com muito custo, lutam para manterem-se abertas.
Por esse motivo trazemos ao debate a questão da inexigibilidade de conduta diversa, pela ocorrência de abalos à estrutura da empresa, devido a graves crises financeiras. Na medida que é desmedida a exigência que, ao atravessar sérios problemas os administradores das sociedades empresárias venham a comprometer a empresa, bem como a sua própria vida, para manter em dia as suas obrigações tributárias.
A inexigibilidade de conduta diversa é tese adequada, e amplamente aceita, para ser defendida quando o agente tiver agido devido a impossibilidade de atuar de outra forma.
A inexigibilidade de conduta diversa deve ser invocada como tese defensiva sempre que se vislumbre a real impossibilidade de o agente, no caso concreto, agir de forma diferente. Nesse contexto os fatores sociais, políticos e até mesmo culturais poderão ser determinantes para amparar a tese.[iii]
Assim, caso existam justos motivos para a ação considerada criminosa, sim há possibilidade de absolvição pela inexigibilidade de conduta diversa. Esse é o entendimento aplicado pelas cortes, quando da comprovada existência de condições anormais, severas, suportadas por empresas, como foi o caso da reforma da sentença APELAÇÃO CRIMINAL Nº 5010322-95.2017.4.04.7001/PR, vejamos:
"Além da redução do quadro de empregados durante o período de crise tanto da matriz quanto da filial, a prova documental contemporânea aos fatos demonstra a existência de execuções fiscais de expressivo montante, assunção de empréstimo de valor igualmente elevado acordo com o BRDE para pagamento de dívida de mais de doze milhões de reais e aproximadamente quarenta reclamatórias trabalhistas"
“A situação evidenciada, assim, demonstra ser crível a existência de condições anormais suportadas pela sociedade empresarial e que lhe retiraram a possibilidade de honrar todos os débitos, impondo-se o reconhecimento da excludente de culpabilidade da inexigibilidade de conduta diversa."
Esse também foi o entendimento, em sentença de absolvição sumária proferida em nossa comarca, vejamos trecho do dispositivo:
[...]
Resta, portanto, demonstrado, pelos documentos apresentados, que, no período indicado na denúncia, a empresa administrada pelo acusado encontrava-se em sérias dificuldades financeiras, com redução do faturamento, prejuízo no período e grande endividamento com credores em geral, com o fisco e com os trabalhadores. Por outro lado o pedido de recuperação judicial demonstra a vontade do administrador de recuperar a empresa dentro dos parâmetros legalmente permitidos. Ademais, como já mencionado, a empresa manteve escrituração contábil e fiscal regular, tendo apresentado as declarações de tributos nos termos da lei.
[...]
Ante o exposto, julgo improcedente a denúncia proposta pelo Ministério Público Federal para absolver o réu XXXXX, com base no art. 386, VI, do Código Processual Penal. (omissão do nome do cliente proposital).
Desse modo, inequívoco dizer que, quando existam causas que denotem clara impossibilidade de agir de modo diverso, com documentação que comprovem as condutas, é sim possível a obtenção de absolvição criminal, com base na inexigibilidade de conduta diversa.
Sendo o que tínhamos para declarar até o momento, ficamos à disposição para melhor esclarecermos os pontos abordados brevemente no presente informativo.
Ellen Souza Martins
OAB/RS 100.719
[i] http://www.iaf.org.br/crimes-contra-a-ordem-tributaria/
[ii] CASTRO, Marcela Baudel de. A culpabilidade no Direito Penal brasileiro. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 18, n. 3521, 20 fev. 2013. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/23766. Acesso em: 23 fev. 2021.
[iii] https://canalcienciascriminais.jusbrasil.com.br/artigos/692503008/a-inexigibilidade-de-conduta-diversa-como-tese-defensiva#:~:text=Como%20dito%20anteriormente%2C%20o%20nosso,de%20causas%20excludentes%20de%20culpabilidade.&text=Desse%20modo%2C%20a%20inexigibilidade%20de,capaz%20de%20excluir%20a%20culpabilidade.
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